Como imagina um dia perfeito de trabalho? Dicas para criar valor numa entrevista

O "canudo" deixou de ser a única coisa importante na hora da entrevista de trabalho. Inteligência emocional, empatia e autocrítica ajudam a diferenciar os candidatos frente aos entrevistadores.

A inteligência emocional tornou-se a expressão-chave nos departamentos de recursos humanos. Com a globalização, ela é mais importante do que nunca: as equipas são cada vez mais interculturais e globais aumentando, assim, a complexidade da interação das emoções e a forma como estas são expressas. Porém, como devemos aliar as soft-skills às hard-skills? Que competências esperam ver os empregadores nos seus trabalhadores na hora da entrevista? Que perguntas um líder próximo deve preparar para distinguir e reter talento na sua empresa?

Em contexto de entrevista, tanto o profissional tem de se adaptar ao tipo de líder com quem está, como o líder tem de se adaptar ao profissional que entrevista. “A postura do profissional deve ser a de uma dança“, explica Raquel Oliveira, psicóloga centrada na área da gestão de relações em equipas, em entrevista à Pessoas.

Por sua vez, a capacidade de ser diferente é o que vai criar valor no período de entrevista pois, quando se está em fase de recrutamento, os empregadores acabam por entrevistar dezenas de candidatos. Logo, as pessoas que conseguirem fazer a diferença — seja porque estudaram a organização e mostram identificar-se com os valores, seja pela forma como mostram que conseguem trazer valor à organização pelos projetos já realizados (e que, de outra forma, não seria conseguido) — são aquelas que ficarão na cabeça do recrutador.

Como Paulo Leitão, recruitment consultant na Experis, refere à Pessoas, “todos nós fazemos tarefas mas, dentro dos mesmos procedimentos, todos conseguimos fazê-las de forma ligeiramente diferente e colocar valor (…). É sempre uma questão de mostrar que conseguimos ir um bocadinho mais além”.

Uma das coisas que pode irritar os empregadores são pessoas que vão para uma entrevista sem perceberem o conceito da empresa e da função. Por isso, deve aplicar-se nesse sentido. André Vieira, channel sales manager da Xerox, aponta três competências imprescindíveis na hora de uma entrevista: a capacidade que o entrevistado demonstra de investigar sobre o tema, de apresentação do mesmo e a empatia com que o faz. Para o especialista, importa que a pessoa se mostre apaixonada por aquilo a que se está a candidatar, afirmando que não considera uma entrevista de trabalho como sendo apenas uma escolha sua. “É uma escolha mútua. A pessoa também tem de ficar encantada pelo projeto e querer trabalhar ali. Numa entrevista nós estamos tanto a tentar convencer a pessoa a ficar connosco como ela está a tentar mostrar que é a pessoa certa”.

Hoje em dia já não é importante só o canudo: há profissões que estão a acabar para outras aparecerem. Estas novas profissões não têm formação associada, passa por alguém ter interesse naquela área. (…) As profissões estão a mudar e não existe formação para novas profissões, porque não sabemos quais é que são. Mas temos de ir buscar recursos a algum lado, então vamos buscar aquilo que é individual, único e especial em cada um. Vamos pegar nisso para trabalhar nas competências que estão associadas a estas novas profissões”, conta a psicóloga Raquel Oliveira.

O que procuram os líderes próximos?

André Vieira assume que procura inteligência, “seja ela formal ou emocional“. O channel sales manager na Xerox conta que consegue perceber a “inteligência formal” pelo CV e pela forma como a pessoa prepara a sua entrevista, além do teste de personalidade que aplica. Já as soft skills “vêm ao de cima” durante a conversa, na forma como interage. Neste caso, o que o responsável tenta encontrar é sobretudo alguém que saiba trabalhar em equipa pois, na prática, a intenção é ter “uma equipa que saiba trabalhar em conjunto, em que a soma das partes seja muito superior ao que cada um traz”. Além disso, tenta ainda descobrir “diversidade acima de tudo“, visto que “cada pessoa tem de ser um game changer e que vai colocar o seu cunho pessoal na equipa”.

Desta forma, as perguntas que coloca em entrevista passam por saber como lidam os entrevistados com o stress, o que fazem fora do trabalho, qual foi o seu maior desafio (não tendo de ser necessariamente profissional), como gostariam de ser geridos, como é que um chefe deles os descreveria e qual é a empresa favorita deles (pois acha interessante perceber o que é que cada um valoriza).

Para Marta Caeiro, diretora de marketing e comunicação da Viacom Portugal, é imprescindível que, na hora da entrevista, o candidato dê pequenos sinais de interesse pela função que irá desempenhar e pela empresa. Marta conta à Pessoas que o que distingue o entrevistado é a capacidade de este “passar de uma forma clara e empática as suas competências técnicas e emocionais“. Desta forma, a diretora de comunicação considera que o pensamento criativo e crítico, a comunicação eficaz, a colaboração e coordenação, o multitasking e a flexibilidade são fatores fulcrais para trabalhar na sua equipa, não dispensando “perceber se a pessoa é um team player” pois, também para Marta, isso é fundamental.

Relativizando as perguntas no momento da entrevista, Marta Caeiro preocupa-se mais “com o diálogo que conseguimos estabelecer com a pessoa, o que conseguimos absorver dela, das suas competências, do seu perfil, do seu potencial. É muito importante conseguir perceber o que é autêntico da pessoa“. Neste sentido, prefere pedir aos candidatos que imaginem que são os escolhidos para a vaga e, de seguida, questiona: “Como imaginas um dia perfeito de trabalho? O que aconteceu nesse dia? E um dia horrível de trabalho? O que pode ter acontecido?

Por sua vez, Paulo Leitão afirma que “um dos grandes problemas é tentar aplicar uma solução ‘chapa 5’ àquilo que é uma entrevista. Temos de ter noção de que, para determinadas funções, precisamos de dadas competências e isso tem de ser ajustado“. O consultor de recrutamento diz, porém, que há duas competências que têm sempre de lá estar independentemente da função: a colaboração (pois como refere “nenhum homem é uma ilha, temos de conseguir colaborar”) e, por isso, pede sempre um exemplo de trabalho de equipa pelo qual o entrevistado já passou; e a organização e rigor porque, tal como indica, “temos de conseguir ser autodidatas (…), percebendo, ao mesmo tempo, como nos devemos organizar para que tudo aquilo que temos para fazer seja exequível”. Neste caso, podemos percecionar a importância das soft skills no processo de contratação.

Na visão de Lúcio Marcelino, cofundador da Deploy (consultora de SAP), a “sinceridade, capacidade de comunicação e a confiança que a pessoa demonstra perante as questões colocadas são demonstrativas de personalidade e caráter”. Em adição, o líder frisa que, para trabalhar na sua equipa, é indispensável ter flexibilidade, adaptabilidade e, como referido pelos outros entrevistados, ter espírito de equipa e ser bom comunicador. Neste sentido, além de considerar essencial avaliar as competências técnicas do programador que se candidata à função, Lúcio propõe “questões que podem avaliar a capacidade de trabalhar em equipas multidisciplinares na vertente de relacionamento humano. Um bom ambiente profissional capacita melhores resultados“, conclui.

Inteligência emocional numa era digital

Segundo Paulo Leitão, cada vez temos mais licenciados, pessoas altamente qualificadas mas, ao mesmo tempo, temos empresas a dizer que não encontram as competências que precisam efetivamente nestas novas gerações. Para o recruitment consultant temos de começar a ter uma perspetiva mais crítica” pois, “estamos a pedir a pessoas para terem um conjunto de competências que ninguém, de certa forma, lhes disse. Talvez porque a perspetiva universitária foi saber de cor a matéria e conseguir debitá-la e quando chegam, efetivamente, ao trabalho o que importa não é propriamente aquilo que conseguimos decorar da informação, mas sim o que conseguimos fazer com ela. Transformar esta informação em conhecimento será, por isso, o grande desafio“.

Como exemplifica Paulo, é importante perceber que é diferente uma pessoa dizer que fez Erasmus porque queria experienciar uma nova cultura ou para aprender uma língua, porque queria aprender uma nova forma de ver o mundo ou porque queria algo diferente.

Segundo o próprio, dentro daquilo a que chamamos modelos de competência, existem oito competências fundamentais: liderar e decidir, interagir e apresentar, analisar e interpretar, criar e conceptualizar, adaptar e tolerar, empreender e realizar, apoiar e cooperar e organizar e executar. Neste sentido, para uma função mais relacionada com tecnologia, se calhar, procura-se alguém com competências mais analíticas, para uma função mais administrativa procuram-se competências mais ao nível da organização e gestão de prioridades, por exemplo.

Portanto, como nos explica a psicóloga Raquel Oliveira, “as soft-skills hão de estar associadas potencialmente a competências que podemos desenvolver que, associadas ao conhecimento, à dedicação e aos modelos e figuras de referência, vão ser desenvolvidas melhor ou pior”. Assim, o desafio do líder é ver não só as competências de alguém, mas sim o potencial de desenvolvimento. Na generalidade o que um líder procura é compromisso e capacidade de adaptação (lidar bem com o stress)”, avança.

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