7 acusações da Autoridade da Concorrência contra os bancos

Regulador aplicou uma coima milionária a 14 bancos devido a práticas anticoncorrenciais no mercado de crédito. São várias as acusações da AdC.

São várias as acusações que a Autoridade da Concorrência (AdC) faz no caso do cartel da banca que durou mais de uma década. O regulador considera que os bancos trocaram informação estratégica e confidencial entre si, o que restringiu a concorrência no mercado. Por exemplo, os bancos partilharam dados sobre spreads no crédito à habitação ou PME e interpretação da legislação para se alinharam nas políticas de comissões.

A AdC notou ainda que estas práticas concertadas estavam institucionalizadas e enraizadas dentro dos bancos. As hierarquias estavam a par. Por outro lado, com estas infrações, os bancos colocaram entraves à entrada de outros operadores.

Como consequência deste caso, que prejudicou famílias e empresas, a AdC aplicou uma coima de 225 milhões de euros a 14 bancos que contestam as acusações do regulador. O caso segue agora nos tribunais.

Bancos trocaram grelhas de spreads

As informações que os bancos trocavam entre si eram sensíveis, estratégicas e de natureza não pública ou de difícil acesso ou sistematização. Diziam sobretudo respeito a produtos de crédito para compra de casa, crédito ao consumo ou crédito a PME, e incluíam dados sobre condições comerciais (como preços/taxas de spread) e sobre valores de produção de cada banco.

Entre a informação partilhada entre os bancos estavam, por exemplo, grelhas com informação sobre os spreads no crédito à habitação. O regulador cita casos concretos em que as alterações das grelhas de spread eram comunicadas a vários concorrentes em simultâneo, com dois a três dias de antecedência face à verificação da alteração e, por vezes, eram comunicadas no próprio dia pelo banco que procedia à alteração.

“Não se poderá aceitar que um conjunto de bancos troque entre si informação sobre spreads, em particular sobre intenções de alteração dos respetivos valores num futuro próximo, desse modo alterando artificialmente as normais condições de concorrência no mercado e claramente reduzindo o risco e a incerteza de cada banco sobre o comportamento estratégico dos seus concorrentes diretos“, diz a AdC.

Também partilharam informação sobre custos de transferência de crédito

Além de informação sobre spreads e “poderes de crédito”, os bancos trocaram “informação sensível sobre outras condições comerciais associadas ao crédito à habitação, designadamente custos associados à transferência de crédito à habitação“.

Em concreto, a AdC cita uma troca de informação entre BPI, BCP, BES, Santander, Montepio, CGD e Barclays que permitiu aos bancos “perceber o posicionamento de cada banco elencado quanto a limites de custos suportados no âmbito de transferência de crédito à habitação entre bancos, mais se identificando, de modo comparado, custos suportados, como por exemplo, referentes a comissões de dossier, avaliação, amortização antecipada, emolumentos, entre outros.”

Alinhamento nas comissões

A AdC descobriu que os bancos também trocaram entre si informação respeitante à interpretação de legislação aplicável à sua atividade, designadamente em matéria de comissões no crédito à habitação. “O teor dos emails analisados sugere claramente um propósito de alinhamento comercial face às dúvidas suscitadas pela aplicação daquela legislação sobre comissões”, refere o regulador. “Trocaram informação sobre a interpretação de diversa legislação ou normas setoriais aplicáveis com a finalidade de alinharem comportamentos que teriam, naturalmente, impacto na oferta dos produtos em análise na presente decisão“, considera o regulador.

Aliás, o elemento probatório mais antigo que remonta a 2002 diz respeito à troca de uma folha de cálculo elaborada pela CGD, com uma análise das comissões praticadas pelos BCP, Santander, BPI, BES e Montepio, “em que são expressamente referidas como fonte de informação as direções de marketing das outras instituições de crédito”.

As práticas faziam parte do dia-a-dia dos trabalhadores

Trocar informação secreta com outros bancos era uma prática normal, fazia parte do quotidiano de quem trabalhava nos departamentos de marketing ou nos departamentos comerciais dos bancos. “Parte das tarefas dos colaboradores afetos aos departamentos envolvidos na troca de informação (normalmente marketing ou gestão de produto) compreendia necessariamente a articulação com os concorrentes para a obtenção de informação sobre as suas ofertas e condições comerciais”, refere a AdC. “Estava em causa uma prática perfeitamente enraizada no funcionamento do dia-a-dia“, nota ainda.

Havia uma rede de contactos estável e institucionalizada, o que permitia assegurar que o fluxo de informação não fosse interrompido mesmo quando algum trabalhador deixasse o banco. A AdC salienta que havia o “cuidado” de os bancos manterem sempre atualizados os pontos de contacto nos vários concorrentes, o que assegurava a continuidade das trocas de informação.

Chefias sabiam

As hierarquias estavam a par da partilha da informação, incluindo diretores e administradores em alguns casos. Provam-nos vários emails que constam da investigação, mas não só. A troca de informação com os concorrentes persistiu e manteve-se mesmo quando havia alteração de colaboradores, “o que demonstra que se tratava de uma atividade institucionalizada dentro dos respetivos departamentos, e não de uma troca informal entre amigos”, considera a AdC

Mais: tendo em conta as características da troca de informação, nomeadamente o seu detalhe e intensidade, também “não é crível que esta prática pudesse ter ocorrido ao longo de dez anos sem que as direções e administrações dos colaboradores que dela participavam tivessem conhecimento ou, pelo menos, devessem ter tomado conhecimento no exercício das respetivas funções de direção ou administração”.

Restringiu a concorrência entre bancos

Com a partilha de informação sensível e estratégica entre si, os bancos restringiram a concorrência no mercado de crédito. Sabendo o que os outros bancos iam fazer em matéria de preçário, por exemplo, uma instituição ficava “apta a definir a sua política comercial individual, adaptando-a e ajustando-a ao comportamento – apurado através da troca de informações – dos seus concorrentes”.

A AdC diz que esta adaptação e ajustamento eram “suscetíveis” de ocorrer devido ao acesso de informação detalhada não pública dos concorrentes, “diretamente solicitada e disponibilizada” pelos bancos.

Colocou entraves à entrada de novos bancos

Segundo a AdC, uma vez que as infrações afetaram todo o território português, constituindo “uma parte substancial do mercado interno”, as práticas ilegais dos bancos afetaram a estrutura do mercado, na medida em que reforçaram os entraves à entrada de novos operadores, “isto é, daqueles cujos serviços possam potencialmente respeitar a oferta de produtos e serviços bancários em Portugal”.

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