Football Leaks: “Tenho a certeza que este ataque teve enormes repercussões na PLMJ”
João Medeiros era na altura sócio da PLMJ. Caixa de correio foi toda divulgada no final de 2018. "Foram dias muito difíceis na minha vida" e "muitos pedidos de desculpas a clientes", diz o advogado.
O advogado João Medeiros, cujos mais de 95 mil mails foram divulgados no blogue Mercado do Benfica, admite que “esta questão está ligada ao Benfica”. O sócio, à data da PLMJ, é advogado da SAD do Benfica — juntamente com Rui Patrício de Paulo Saragoça da Matta –e admite que a divulgação de toda a informação contida nos seus mails lhe criou “um grande sobressalto” e assumiu que “foram dias muito difíceis na minha vida”. E assume ainda que este “ataque informático teve enormes repercussões na PLMJ e tudo isto foi encarado com enorme preocupação”.
Disse ainda que “foram muitos pedidos de desculpa que tive de dar aos clientes, muitas justificações e que, inclusive, foi chamado aos respetivos Conselhos de Administração para justificar o sucedido. E sublinha que “obviamente, a desconfiança ficou instalado durante algum tempo”. Desconfiança não só dos clientes mas também dos próprios colegas da PLMJ, onde na altura era sócio e de onde saiu, nove meses depois, para a Vda. “Claro que tive noção que, especialmente os meus colegas que fazem a chamada advocacia de negócios acharam que não fosse eu ‘meter-me’ com clientes do mundo do futebol, nada disto teria acontecido”. Assumindo que muitos adotaram uma postura de “a advocacia desta natureza é menos nobre”.
O advogado disse ainda que os mails hackeados por Rui Pinto chegaram a ser usados pelo Ministério Público, numa resposta a contestação no caso dos CMEC –processo em que João Medeiros defende António Mexia e João Manso Neto — quando questionado pela juíza das repercussões da divulgação da informação contida em cerca de 95 mil mails. Mails esses divulgados “logo no dia seguinte à não pronúncia da SAD do Benfica, no processo e-toupeira”. Ou seja, a não pronúncia data de 21 de dezembro e foi a 22 de dezembro de 2018 que começou a divulgação.
Horas antes, Luís Pais Antunes — na qualidade de managing partner da PLMJ — desvalorizou o ataque informático de Rui Pinto, sofrido pelo escritório no final de 2018. Em declarações em sede de julgamento no âmbito do processo contra o criador do Football Leaks, o advogado admitiu que a 21 de dezembro de 2018 “adquiriram a convicção que havia um acesso aos nossos sistema de informação”. Porém, insistiu que este tipo de ataque é “comum a muitas organizações”. “Não é um facto pontual, seja nos escritórios de advogados, mesmo outros, e noutras organizações”, explicou o presidente do Conselho de Administração do escritório que é assistente no processo. “Sempre houve violações de correspondência ou sistemas informáticos hackeados, a nível diário”.
A terceira sessão de julgamento do hacker Rui Pinto –que responde por um total de 90 crimes visando entidades como o Sporting, a Doyen, a PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol e a PGR — foi marcada pelos testemunhos de Luis Pais Antunes, managing partner da PLMJ , da parte da manhã. Da parte da tarde seguiu-se João Medeiros.
João Medeiros contou ainda que, na noite de 31 de dezembro de 2018, recebeu por volta da meia-noite um telefonema de “alguém a falar inglês e a rir-se, a desejar um bom ano de 2019”. Questionado pela juíza, o advogado revelou que o indicativo desse número era de “um país de Leste”. Horas antes, todos os mails do advogado da SAD do Benfica acabavam de ser divulgados, na íntegra, e de “forma acrítica”, no referido blogue.
“Pelo histórico, o primeiro acesso foram mais na área de criminal/contencioso e foi mais nessa área que a intrusão se verificou”, acrescenta, referindo-se à equipa, à data, liderada por João Medeiros. Nove meses passados, este advogado acabou por sair do escritório e integrar a Vieira de Almeida, onde é hoje sócio. “Houve uma duração na permanência na caixa de correio em causa de outubro a dezembro de 2018”, referiu Luís Pais Antunes.
O managing partner da PLMJ admitiu ainda que a sociedade de advogados tinha “níveis de segurança elevados, e depois reforçamos ainda mais a segurança mas também tenho a certeza que haverá sempre alguém com margem para contornar as dificuldades”. Preocupado em passar a mensagem de que os níveis de segurança atuais são elevados e insistindo na tónica que este tipo de ataque “pode acontecer também a outros escritórios de advogados”, admite que, na altura, “houve clientes que se mostraram compreensivos e calmos outros mais preocupados”. Na altura da divulgação dos mails divulgados no blogue Mercado Benfica, apenas os mails de João Medeiros foram divulgados. Rui Patrício, da Morais Leitão e Paulo Saragoça da Matta — também advogados do Benfica — não foram alvo de pirataria.
O ataque informático ao maior escritório português resultou na divulgação ilícita de documentos confidenciais sobre vários processos judiciais, como o caso E-Toupeira, a Operação Marquês e o processo BES.
À data, os documentos e centenas de emails foram disponibilizados para download através do blogue Mercado de Benfica, que até aqui se tinha dedicado à divulgação de correspondência interna do clube da Luz.
Nessa informação divulgada estava conteúdo confidencial relativa a Manuel Pinho, António Mexia, Ricardo Salgado, Henrique Granadeiro, a holding estatal Parvalorem e ao antigo espião Jorge Silva Carvalho. Já que o alvo foi João Medeiros, que representa a Benfica SAD no processo E-Toupeira.
A segunda sessão deste julgamento- realizada na terça-feira — ficou marcada pelo pedido do MP de exibição dos conteúdos originais dos dispositivos informáticos apreendidos a Rui Pinto, num requerimento formalizado na segunda sessão do julgamento.
Perante esta pretensão, a presidente do coletivo de juízes, Margarida Alves, concedeu um prazo de cinco dias para os assistentes no processo se pronunciarem.
A procuradora do MP, Marta Viegas, justificou a apresentação do requerimento por entender ser “imprescindível” em “futuras sessões” do julgamento a exibição dos “originais dos objetos apreendidos”. “Nunca foram trabalhados, nem seria possível. Tudo o que foi feito, foi baseado em cópias para não adulterar o original”, argumentou.
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