Há “Ubers” com salários bloqueados há semanas por falta de documentos

Alguns parceiros da Uber estão há semanas sem obterem rendimentos, apesar de continuarem a transportar passageiros. Não conseguem transferir os ganhos por dificuldades em atualizar documentação.

“Há grandes operadores que não estão a receber. Eu estou num desses operadores que aguentou três semanas a pagar-nos a nós sem estar a receber da Uber.” O desabafo surge num vídeo posto a circular no WhatsApp. Nele, um presumível motorista da Uber UBER 0,00% garante que, por esse motivo, o patrão decidiu suspender a atividade até que consiga receber os montantes devidos.

O caso não é único. Nas redes sociais, ou em grupos restritos, têm surgido esporadicamente parceiros ou motoristas que dizem estar há semanas sem conseguirem levantar os seus rendimentos. Um proprietário de uma empresa com frota ao serviço da plataforma, que pediu para não ser identificado, garante ao ECO ter 1.700 euros por receber “há três semanas”. Motivo pelo qual pondera abandonar o negócio para se dedicar à sua outra atividade no setor dos transportes.

Alguns parceiros, preocupados e sem saberem o que fazer, disparam acusações mais graves à empresa, para as quais ajuda o desespero de quem tem de pôr pão na mesa. Mas a Uber Portugal, gestora da plataforma, recusa estar a reter dinheiro indevidamente. E aponta para uma diretiva europeia para explicar a situação, mostrando-se, ela própria, impedida de transferir fundos para parceiros que não tenham toda a documentação em conformidade com a legislação.

O email que não chegou, a chamada não atendida

“Há uma diretiva da União Europeia que tem como objetivo regular serviços de pagamento, melhorando a segurança na utilização de sistemas de pagamento e reforçar a proteção dos consumidores”, afirma fonte oficial da Uber, que diz ter de “verificar a identidade dos parceiros”. “Estamos há vários meses a pedir aos parceiros que atualizem a sua informação de pagamento. Ou seja, temos vindo a explicar e a informar que os pagamentos para a conta de parceiro poderão ficar suspensos caso não verifiquem os seus dados de identidade e de pagamento”, continua.

Após diversas tentativas de contacto com o suporte da plataforma, um dos parceiros que reporta problemas com os pagamentos deslocou-se ao balcão presencial da empresa em Lisboa. Ali, foi informado que a Uber lhe telefonou várias vezes, sem sucesso, para dar conta da necessidade de atualizar documentação. Inicialmente, foi explicado que o erro estaria no “cartão de cidadão de um dos sócios”, por não estar “bem visível”.

"Estamos há vários meses a pedir aos parceiros que atualizem a sua informação de pagamento. Ou seja, temos vindo a explicar e a informar que os pagamentos para a conta de parceiro poderão ficar suspensos caso não verifiquem os seus dados de identidade e de pagamento.”

Uber

Corrigido esse eventual problema, a documentação encontra-se a aguardar “uma segunda validação”. Situação que, segundo o parceiro, se prolonga há já algum tempo. Entretanto, continua sem conseguir transferir os rendimentos. “Normalmente, se tiver um elemento caducado, a minha conta fica inativa. Neste caso, há um documento que não está correto, mas deixam-me trabalhar”, queixa-se, referindo-se ao sistema da Uber que inativa as contas dos motoristas quando se verifica um documento caducado ou em falta.

Fonte oficial da Uber promete que “assim que” os parceiros atualizem a documentação, “o pagamento é procedido”. A pedido do ECO, cedeu ainda um exemplar de um dos emails que garante ter enviado aos parceiros. Na mensagem, surge a indicação: “Verifique os seus dados até ao dia 31 de agosto para continuar a receber os seus pagamentos”. O texto é também claro a indicar que os pagamentos “poderão ficar suspensos” caso o parceiro “não verifique os seus dados de identidade e de pagamento”. “Evite a suspensão dos pagamentos para a sua conta e continue a usar a aplicação como sempre”, refere a mensagem. “Ligámos a todos os parceiros para além dos emails”, assegura o mesmo porta-voz.

Sinais díspares e confusão instalada

Fica assim claro que certos parceiros não estão a conseguir retirar os rendimentos já gerados com a aplicação, presumivelmente por complexidades legais relacionadas com documentação. Mas, em alguns casos, depois de contactarem o suporte via chat, um operador admite que a “questão foi identificada e a situação já se encontra em fase de resolução”. Noutro caso, um operador admite ter “conhecimento de que existe um constrangimento com os pagamentos” e diz mesmo que a empresa está a “trabalhar ativamente na solução desta questão”. Uma captura de ecrã de um pagamento com a data de 15 de setembro mostra o estado “erro na transferência”.

Tudo somado, estes fatores contribuem e alimentam a desconfiança de alguns parceiros, que insistem que alguma coisa na Uber não está bem, ainda mais neste contexto de pandemia. Ainda assim, nas informações consultadas pelo ECO, há também uma mensagem que indica ser necessário verificar “a identidade de cada pessoa que detém 25% ou mais da empresa associada” à conta, em linha com o que é justificado pela Uber.

Depois há também situações em que a justificação é menos óbvia. Um parceiro, que também terá tido dificuldades na atualização dos documentos, conseguiu, por fim, resolver o problema, somente para ver uma nova mensagem surgir na área de pagamentos pontuais da aplicação, conhecida por FlexPay: “Os seus rendimentos foram bastante elevados esta semana e isso é ótimo. Mas também significa que não podemos transferir um montante assim tão elevado numa única semana. Receberá os rendimentos restantes juntamente com o seu pagamento semanal normal.”

Também para isto a empresa tem uma justificação. “Temos uma função que é o FlexPay. Esta função permite que os parceiros possam levantar parte do seu rendimento semanal em qualquer altura da semana, não tendo que esperar pelo normal pagamento semanal todas as segundas-feiras. Em alguns casos, o valor que os parceiros gostariam de levantar através da função FlexPay é superior ao que é permitido, no entanto, 100% do valor de rendimentos remanescente é pago no início da semana seguinte”. O valor do caso reportado ao ECO será na ordem dos quatro dígitos, mas a Uber recusou revelar o montante máximo que permite levantar nessas condições, apontando apenas ser “uma quantia elevada”.

Fonte oficial da Uber também se mostrou incapaz de revelar quantos parceiros estão impedidos de transferirem os rendimentos concretamente por questões de documentação. “Não se pode falar de dimensão ou ordem de grandeza, porque estes processos estão permanentemente a correr e, adicionalmente, temos auditorias internas para fazer uma dupla verificação de documentação de parceiros para este efeito. Nos casos em que estas auditorias detetem problemas, os pagamentos serão suspensos até que a situação seja regularizada”, sinalizou.

Mas também, ao que o ECO apurou, estas situações estão longe de ser um problema generalizado. Outro parceiro com frota ao serviço da plataforma garantiu que tem vindo a receber as transferências semanais com normalidade, apesar de conhecer um caso de um colega na situação acima reportada. Instado a opinar sobre o que estará na origem dessas dificuldades, este parceiro não hesitou em levantar a hipótese de eventuais problemas com documentação.

Fonte oficial da Uber sugere, assim, que quem se encontre nestas situações se dirija “ao apoio físico em Lisboa e no Porto”. E, aos mais desconfiados, deixa a garantia: “Não estamos a ficar com os pagamentos ou valores de ninguém. Estamos a pedir que atualizem dados legais que nos são exigidos enquanto plataforma.”

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