As criptomoedas e como parar o vento com as mãos

  • Marisa Silva Monteiro
  • 20 Abril 2021

No meio financeiro é claramente perceptível que querer parar o movimento das moedas digitais é querer parar o vento com mãos, com cada vez mais entidades a aceitar o pagamento em bitcoins.

A economia pandémica acelerou a transformação digital a um ritmo que ninguém antecipou. O lock down à escala global e o apetite dos investidores por aplicações financeiras a partir de casa e à distância de um clique desencadearam um súbito e significativo aumento dos investimentos bolsistas e também em activos alternativos, como as criptomoedas.

Fenómenos como a valorização em flecha das acções da GameStop são exemplo desta pressão do mercado por novidades e por causas subjacentes aos investimentos que sejam a um tempo disruptivas relativamente ao modelo económico vigente e promitentes de ganhos financeiros dignos de nota.

A valorização da bitcoin para níveis somente imaginados parece confirmar esta visão, mas o cidadão comum seguramente nem sabe o que é a bitcoin, não sabe que a bitcoin não é uma moeda em sentido próprio, que não é dinheiro com curso legal. E o mesmo se diga das outras criptomoedas.

A bitcoin e as restantes criptomoedas são criptoactivos, isto é, são representações digitais de activos baseadas em tecnologia blockchain (tecnologia digital de registo contabilístico de transacções e rastreamento de activos dentro de uma rede de negócios).

As criptomoedas não são emitidas por um banco central, nem por uma instituição de crédito ou por qualquer instituição de moeda electrónica e, portanto, só podem ser utilizadas como forma de pagamento junto das entidades que as aceitem como tal, e que são ainda poucas em todo o mundo, apesar de o número estar a aumentar.

As criptomoedas “nascem” através de “ofertas iniciais”, a denominadas ICO (initial coin offerings) que são ofertas de distribuição inicial de criptoactivos. Nestas operações, o emitente (pessoa singular ou colectiva) emite os criptoactivos (as criptomoedas) e o preço de aquisição destas moedas virtuais é pago em moeda verdadeira, em moeda com curso legal ou por troca com outros criptoactivos.

Como qualquer activo, o risco das criptomoedas é, desde logo, a hipótese de subitamente não se conseguirem vender, isto é, não se se conseguirem trocar por dinheiro real. E tal pode acontecer por razões que não se antecipam nem controlam, bastando, por exemplo, que figuras mediáticas (como Elon Musk) retirem o investimento em bitcoins ou basta aparecer um outro activo (digital ou não) que recolha interesse, tendência de investimento, procura e valorização (especulação) maior. Directamente associado a este risco, está o de perda total do investimento, o risco de o investidor em criptomoeda querer trocá-la por dinheiro e não encontrar quem queira comprar. A fraude é também um risco relacionado com as criptomoedas, quer pelo desconhecimento das suas características pelo público em geral quer pela complexidade que elas envolvem. Acresce a circunstância de as criptomoedas serem um activo que não está (para já) regulamentado na União Europeia, pelo que as entidades que as comercializam não estão sujeitas à supervisão dos reguladores bancário e financeiro, o que muito fragiliza a posição dos investidores não profissionais.

No meio financeiro é claramente perceptível que querer parar o movimento das moedas digitais é querer parar o vento com mãos, com cada vez mais entidades a aceitar o pagamento em bitcoins (tal como a Tesla ou a seguradora AXA para o mercado suíço), pelo que a palavra de ordem é informação. Os investidores devem informar-se o mais possível antes de tomar uma decisão de investimento em bitcoins ou outra criptomoeda e devem procurar fontes credíveis e não comentários em redes sociais ou “aulas” online de curiosos não autorizados a exercer intermediação financeira e não supervisionados pelas autoridades do sector.

Nota: O autor escreve ao abrigo do antigo acordo ortográfico.

  • Marisa Silva Monteiro
  • Advogada e of counsel da JPAB - José Pedro Aguiar-Branco Advogados

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