Bruxelas está a falhar no investimento sustentável, diz Tribunal de Contas Europeu
Uma auditoria do TCE revelou que o orçamento da UE não segue boas práticas do financiamento sustentável, sendo que apenas o programa InvestEU avalia investimentos em termos sociais e ambientais.
A União Europeia não está a fazer o suficiente para canalizar fundos e promover investimentos sustentáveis, conclui um relatório especial do Tribunal de Contas Europeu (TCE) divulgado esta segunda-feira. Apesar de a transição para uma economia neutra em carbono “exigir investimentos privados e públicos significativos”, a Comissão Europeia tem pecado na falta de medidas de acompanhamento para dar resposta aos custos ambientais e sociais das atividades económicas insustentáveis, refere o documento.
Enquanto isso, muitas das atividades económicas na UE continuam a ter uma elevada intensidade carbónica. A Comissão Europeia quer reduzir em 55% as emissões de gases com efeito de estufa até 2030, mas para isso será necessário um investimento anual extra de cerca de 350 mil milhões de euros só no sistema energético. Já tornar a Europa no primeiro continente neutro em carbono em 2050 exigirá um bilião de euros por ano entre 2021 e 2050.
Desse montante, a UE só pode dispensar um apoio financeiro de 200 mil milhões de euros por ano entre 2021-2027. “Revela a dimensão do défice de investimento e demonstra que os fundos públicos, por si só, não serão suficientes para alcançar os objetivos acima referidos”, diz o TCE. O setor privado tem, por isso, de ser chamado a intervir, mas ao mesmo tempo tem de ter garantias de cash flow e retorno do investimento, dizem os auditores.
O TCE reconhece que Bruxelas se tem concentrado em aumentar a transparência no mercado, mas ainda assim apela a uma maior coerência nas ações da UE. “Tem de aplicar critérios coerentes para determinar a sustentabilidade dos investimentos apoiados através do orçamento da UE e orientar melhor os esforços para gerar oportunidades de investimento sustentável”, frisa o relatório da auditoria, que irá contribuir para a execução da estratégia de financiamento da transição para uma economia sustentável, publicada pela Comissão no início de julho.
Em comunicado, Eva Lindström, membro do Tribunal de Contas Europeu responsável pelo documento, diz que “as ações da UE em matéria de financiamento sustentável só serão plenamente eficazes se forem tomadas medidas adicionais para refletir os custos ambientais e sociais das atividades insustentáveis”. E acusou: “As empresas insustentáveis continuam a ser demasiado lucrativas”. Além disso, é necessária mais transparência sobre o que é ou não considerado sustentável, como é o caso da energia nuclear, por exemplo.
“Para o mercado é importante que este processo não seja demasiado lento e que não haja demasiadas exceções na Taxonomia”, como seja o financiamento de novos gasodutos (não adaptados a gases renováveis como o hidrogénio), por exemplo, disse Lindström, esclarecendo que a Comissão Europeia não acolheu da melhor forma a auditoria do TCE nesta altura.
Sobre o Plano de Ação para o financiamento sustentável, adotado pela Comissão em 2018, o TCE diz que dá apenas uma resposta parcial a estas questões e sublinha a importância de concluir a Taxonomia da UE, o sistema de classificação comum para as atividades sustentáveis com base em critérios científicos. O documento recomenda também medidas adicionais já em 2022 para assegurar que o preço das emissões de gases com efeito de estufa reflete melhor o seu custo ambiental.
O relatório do TCE salienta ainda o papel que o Banco Europeu de Investimento (BEI) desempenha no financiamento sustentável. No entanto, no que diz respeito ao apoio financeiro da UE gerido pelo BEI, o TCE constatou que “o apoio prestado pelo Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos (FEIE) não se concentrou nas áreas em que o investimento sustentável é mais necessário, em especial na Europa Central e Oriental. Além disso, apenas se despendeu uma parte muito pequena com a adaptação às alterações climáticas”.
O relatório recomenda que a Comissão, em cooperação com os Estados‑membros, deve gerar uma carteira de projetos sustentáveis.
Por último, o TCE considera também que o orçamento da UE não segue plenamente as boas práticas em matéria de financiamento sustentável, sendo que apenas no programa InvestEU existem requisitos para avaliar os investimentos por referência a normas sociais e ambientais comparáveis às utilizadas pelo BEI.
“Corre-se o risco de poderem ser utilizados critérios insuficientemente rigorosos para determinar a sustentabilidade ambiental e social das mesmas atividades financiadas por diferentes programas da UE, incluindo o Fundo de Recuperação”, diz o TCE em comunicado.
O relatório conclui que a A UE tem o mercado líder em obrigações “verdes”, mas o seu valor permanece baixo: em 2020, a Europa era responsável por 156 mil milhões de dólares de dívida “verde”, o equivalente a 48% do total das emissões globais. No final desse ano, as entidades dos 27 Estados-Membros da UE detinham um total de 21 biliões de dólares de obrigações por reembolsar, das quais as obrigações “verdes” representavam 422 mil milhões de dólares, ou seja, apenas 2%. “Apesar do aumento das emissões, as obrigações “verdes” continuam a ser um produto financeiro marginal na UE”, remata.
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