Patrões podem testar trabalhadores, mas têm de pagar
A CIP quer que a lei obrigue os trabalhadores não vacinados a fazerem teste à Covid-19 e a pagarem por ele. Advogados dizem, porém, que testes pedidos pelos empregadores devem ser pagos pelos mesmos.
Os patrões querem que seja criada legislação que deixe claro que os trabalhadores não vacinados contra a Covid-19 são obrigados a serem testados periodicamente e defendem que devem ser estes a suportar os custos dessas análises. Da parte do Governo, a ministra do Trabalho já esclareceu que o enquadramento legislativo atual permite a testagem, mas nada disse sobre quem deve suportar os encargos em questão. Os advogados ouvidos pelo ECO indicam, contudo, que, sendo exigência dos empregadores, não restam dúvidas de que os testes terão mesmo de ser pagos pelas empresas.
“Há direitos individuais, mas a saúde pública tem de ser acautelada. Temos, neste momento, algumas empresas com tensão, porque os trabalhadores não querem estar ao lado de colegas que se sabe que não foram vacinados“, contou recentemente o líder da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) à RTP.
António Saraiva defendeu que, havendo liberdade de recusar a vacinação, os trabalhadores que o façam devem ser testados periodicamente e, como a imunização é gratuita, os encargos associados a essas análises devem ficar à sua conta. “Sendo a vacina gratuita, os testes devem ser a cargo daqueles que, não querendo ser vacinados, terão de se sujeitos a testagens obrigatórias”, sublinhou o “patrão dos patrões”.
Já a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, quando questionada sobre esse tema, explicou que “hoje em dia há enquadramento na lei que prevê que os serviços de segurança e saúde no trabalho podem, em função dos níveis de risco e das características de cada local de trabalho, definir a exigência de testes aos trabalhadores“. A responsável não esclareceu, contudo, quem deve suportar os custos dessa testagem.
Os advogados ouvidos pelo ECO não têm, contudo, dúvidas. Como está a lei, e sendo o teste uma exigência do empregador, cabe à empresa suportar os encargos.
“Em face do especial momento vivido, e sempre que as especiais circunstâncias do local de trabalho ou mesmo da atividade, entendo que é possível à entidade empregadora proceder à testagem“, começa por explicar Joana de Sá, da PRA Advogados, avisando que é preciso assegurar a proteção dos dados dos trabalhadores. A especialista em lei laboral acrescenta, em declarações ao ECO, que entende que, neste caso, “o encargo da testagem” cabe exclusivamente ao empregador.
A mesma interpretação tem Tiago Marcelino Marques, da Raposo Subtil e Associados. Ao ECO, o advogado frisa que o Código do Trabalho diz que o empregador não pode exigir ao trabalhador ou candidato a emprego testes ou exames médicos, exceto quando existam “particulares exigências inerentes à atividade da empresa que o justifiquem” ou “quando esteja em risco a segurança do trabalhador ou de terceiros“. É neste último ponto que se encaixa a testagem à Covid-19, diz Tiago Marcelino Marques, sendo obrigatório o empregador explicitar, por escrito, as razões para a realização das análises. “Evidentemente, estes testes correm por conta da entidade patronal“, defende o especialista em lei laboral.
Já o Bastonário da Ordem dos Advogados, Luís Menezes Leitão, tem uma leitura diferente da legislação em vigor. “Tirando o caso dos lares e hospitais, o empregador só o poderá fazer em situações muito particulares, como na verificação de um surto na empresa“, defende, em declarações ao ECO, baseando-se também no Código do Trabalho. Apesar de discordar da possibilidade de testagem mais alargada, concorda com os demais advogados num ponto: Em caso de teste pedido pelo empregador, terá de ser este “naturalmente a custear os testes“.
Na mesma linha, Dantas Rodrigues, da DR&A, diz entender que, uma vez que a vacinação não é obrigatória, o empregador nem pode exigir que o trabalhador esteja imunizado contra a Covid-19, nem pode testá-lo, como requisito de acesso às instalações, excetuando “atividades cujos riscos poderão justificar outro entendimento”. Ainda assim, o advogado salienta que o ordenamento jurídico português já permite a “recolha de informação de saúde em contexto de medicina no trabalho“, o que poderá levar as empresas a tomar uma série de medidas de vigilância de saúde.
Desde o final de julho que o teletrabalho deixou de ser obrigatório — ainda que continue a ser recomendado, em todo o país –, o que tem levado muitos trabalhadores a regressar aos escritórios. Daí que a questão da testagem contra a Covid-19 ganhe agora força, num momento em que também a vacinação tem conquistado terreno. Segundo o último relatório, Portugal tem já, pelo menos, 80% da população residente com a vacinação completa.
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