O sócio fundador da CRS Advogados, Nuno Pereira da Cruz, defende que a “guerrilha permanente” entre os partidos políticos só leva a um país que é incapaz de avançar.
Nuno Pereira da Cruz, sócio fundador da CRS Advogados, esteve à conversa com a Advocatus e fez um balanço “muito positivo” dos primeiros anos da firma e confessou que o foco do escritório são as PME’s.
Segundo o advogado, Portugal tem excelentes advogados e defende que a “guerrilha permanente” entre os partidos políticos só leva a um país que é incapaz de avançar. Acredita que a pandemia está a gerar novos mercados e uma nova economia, ainda que setores como o turismo, eventos, restauração e lazer continuem a lutar com grandes dificuldades.
Seis após ter fundado a CRS que balanço faz?
Um balanço muito positivo. E a todos os níveis. Contudo, sabemos que ainda só estamos no início. Que o caminho que queremos percorrer é longo, duro e com vários obstáculos. Mas nós somos focados, resilientes e consistentes. Não nos assustamos com as intempéries nem nos deslumbramos com os êxitos e reconhecimentos que vamos alcançando individual e coletivamente. Sabemos muito bem o que queremos alcançar e temos a prova de que estamos no caminho certo. Essa prova são as pessoas que trabalham connosco. Esse é aliás o nosso maior feito até à data de hoje. Termos tido a capacidade de escolher as pessoas certas, de integrá-las e fazê-las acreditar no que estamos a construir juntos. Temos muito orgulho no caminho percorrido e de como o temos feito.
Os objetivos traçados estão a ser cumpridos?
O principal sim! Divertirmo-nos. Os outros em parte também, mas não nos agarramos a objetivos de curto prazo. Claro que o facto de em 6 anos termos passado de 3 a 10 advogados de forma orgânica, termos ainda 4 advogados estagiários, com o objetivo de ficarem na sociedade, e uma equipa de suporte de 4 pessoas é muito bom. Como foi uma grande satisfação vermos a abertura do nosso escritório no Porto em dezembro de 2020 e no Algarve em setembro de 2021, em plena crise pandémica. E agora esta mudança de sede em Lisboa para Amoreiras, onde vamos ficar com este piso inteiro de 480 metros quadrados, possibilitando concretizar tantas outras ideias que queremos pôr em prática. Tudo isto são objetivos cumpridos com um propósito. Tal como todos os prémios e recomendações que temos obtido ou as parcerias internacionais que estabelecemos nos últimos anos. No entanto, não nos damos por satisfeitos e sabemos que temos ainda muito que melhorar e progredir. Não nos basta sermos bons.
Como se definem no mercado da advocacia?
Como uma sociedade de advogados jovem, dinâmica e ambiciosa e que no futuro se quer tornar numa grande sociedade, reconhecida no mercado e respeitada pelos seus pares. É este propósito que define o nosso posicionamento e a nossa forma de trabalhar. Mas sem pressa. Pois sabemos que temos o tempo a nosso favor e que a concorrência é muita e muito boa. Portugal tem excelentes advogados, quer em prática individual quer a trabalhar em sociedades. Nós queremos que cada cliente se aperceba das vantagens diretas em nos ter contratado, que sinta a mais-valia de ter um advogado ao seu lado a assessorá-lo e a defender os seus direitos. Para isso construímos uma relação muito próxima, direta e desburocratizada com os nossos clientes. Falamos a sua linguagem e entendemos a sua urgência. Queremos combinar a especialização e a disponibilidade das grandes sociedades, com a ligação íntima do advogado em prática individual. O nosso foco são as PME’s.
Não podemos ter em 2021 os tribunais a trabalhar como na década de 60. Simplesmente não é possível.
Como está a ser coordenar o escritório em plena pandemia?
Confesso que sem grandes dificuldades. Reagimos logo muito cedo implementado, ainda em finais de fevereiro de 2020, uma série de medidas a adotar pelos colaboradores do escritório e pelos clientes. Aproveitámos e antecipámos também várias ideias que já estavam pensadas relativamente à forma de trabalhar e de interagir com os clientes, suportadas numa forte vertente tecnológica e de inovação. Assumimos que esta pandemia era uma realidade que vinha para ficar e infelizmente ficou. Tem os seus ciclos mais ou menos apertados mas com a qual temos que aprender a conviver. O facto de sermos uma equipa pequena e jovem, fora dos grupos de risco, também terá ajudado a toda a dinâmica que conseguimos criar. Sempre entendemos, desde o início desta pandemia, que os tribunais não deviam encerrar, que as diligências teriam que continuar e que nós advogados cá estaríamos, com todos os cuidados, a defender os direitos dos nossos clientes e a prestar-lhes toda a assessoria jurídica e apoio neste momento de crise. Foi este e é este o nosso mindset.
O volume de trabalho aumentou?
Sim, mas muito foi não remunerado. Fizemos bastante pro bono e apoiámos clientes que estavam numa situação financeira mais complicada. Esta pandemia trouxe uma enxurrada legislativa e a CRS Advogados neste contexto desenvolveu um conjunto de projetos para dar resposta e esclarecer as dúvidas jurídicas mais frequentes, desde reunir toda a legislação publicada, à criação de Guias Jurídicos em tempo de Covid-19 para os nossos clientes, entre outras iniciativas.
Efetivamente avançar para um processo judicial, dado as custas judiciais muito elevadas, é um luxo ao qual poucos se podem dar.
E a faturação? Aumentou ou diminuiu?
Aumentou. A maioria dos nossos clientes trabalha connosco em regime de avença e, apesar de muitos terem sido afetados com a crise pandémica, conseguiram sobreviver a esta crise. Muitos estão hoje ainda mais fortes. E são eles que nos trazem clientes. Muitas PME’s, que são o nosso mercado, não tinham advogados ou não tinham uma relação permanente e de confiança com um advogado, e esta crise veio demonstrar a importância de estarem devidamente assessorados por advogados. Quem o fez sentiu-se mais seguro, apoiado e confiante. Acredito que o mercado de advocacia cresceu com esta crise. Nós crescemos.
Ao longo da sua carreira tem vindo a representar várias empresas nacionais e internacionais dos mais diversos setores de atividade. Sente que o volume de negócios está a voltar aos números pré-pandemia?
Depende do setor. Esta pandemia para além de ter gerado uma nova realidade em que empresas que eram viáveis foram colocadas numa situação de insolvência, devido aos condicionalismos da Covid-19, está também a gerar novos mercados e uma nova economia. Claro que os setores mais atingidos como o turismo, eventos, restauração e lazer, estão ainda a lutar com grandes dificuldades. No entanto, aqueles que souberam agir rapidamente e que tinham um conhecimento profundo dos instrumentos legais que tinham à sua disposição são os que estão hoje estão a recuperar de forma mais célere. Mas temos outros que continuaram a manter uma performance estável e outros mesmo a crescer, como o da construção.
Enquanto cidadão, acha que o país precisava de uma crise política que resultou em eleições antecipadas?
Não. Esta crise política não faz sentido nenhum. Não aconteceu nada de diferente em relação aos últimos 6 anos, em que tivemos uma maioria de esquerda a viabilizar o governo, que justifique o chumbo do orçamento de Estado. Foram apenas aspetos de ordem tática e de sobrevivência política que ditaram este desfecho que é nefasto para a nossa economia e para a estabilidade política que é tão necessária neste momento. É só tempo perdido. São os políticos a brincarem aos políticos. Esta guerrilha permanente entre os partidos políticos, incapazes de estabelecer consensos, só leva a um país que é incapaz de avançar.
Onde acha que houve falhas por parte do Governo para levar a esta crise política?
O governo falhou, e muito, em várias áreas. Mas na justiça as falhas são gritantes. No recente inquérito realizado pela Deco Proteste sobre o índice de confiança dos portugueses nas instituições nacionais a justiça surge em último lugar. Último lugar! Este resultado não me espanta. Infelizmente a justiça não é uma prioridade e basta ver a desatenção com que o poder político tratou a justiça durante esta pandemia da Covid-19, deixando-a para segundo plano, bem depois do futebol e como foi a novela do procurador europeu, entre outras. Mas esta crise não resulta de um escrutínio ao governo. Resulta da vontade do BE e do PCP irem para eleições, para luta. E do primeiro-ministro ter afirmado que no dia em que dependesse do PSD esse seria o dia em que se demitiria. Andamos nisto…
O facto de sermos uma equipa pequena e jovem, fora dos grupos de risco, também terá ajudado a toda a dinâmica que conseguimos criar.
Se fosse do Governo, qual seria a sua primeira medida a implementar na área da justiça?
Assegurar um efetivo acesso ao direito e aos tribunais à classe média e aos remediados. Existe a ideia de que há uma justiça para os muito ricos e outra para os pobres. Mas esta ideia é errada. Aliás, estes são exatamente os únicos que têm acesso à justiça. Os muito ricos pelo facto de o dinheiro não ser um problema e os pobres por beneficiarem de apoio judiciário gratuito. Na verdade nem serão os pobres, mas os indigentes, tendo em conta o valor máximo de rendimento do agregado familiar necessário para ficar isento das custas judiciais e dos honorários do advogado. E é aqui que reside o grande problema no nosso sistema de Justiça. Efetivamente avançar para um processo judicial, dado as custas judiciais muito elevadas, é um luxo ao qual poucos se podem dar. A somar a este entrave ainda temos o facto dos honorários dos advogados estarem sujeitos a uma taxa de IVA de 23%. Assim, a primeira medida seria diminuir as custas judiciais, para verdadeiras taxas moderadoras, bem como estabelecer a taxa de IVA em 6% para a prestação de serviços jurídicos. Esta seria a primeira medida pois é urgente terminar com esta violação clara e grave da nossa Constituição que consagra o direito de acesso à Justiça.
Qual é o maior problema da justiça portuguesa?
Relativamente ao funcionamento da justiça, a lentidão é o maior problema. É inaceitável ter um sistema que demora 8, 12, 18 anos até termos uma decisão transitada em julgado. E falo de todos os ramos do direito, não apenas do direito penal. Os cidadãos e as empresas não podem esperar anos para verem os seus direitos reconhecidos e executados. Uma decisão célere para além de um direito é também um sinal da eficácia do setor, do desenvolvimento de um país e do conceito de justiça numa sociedade. Para mudar este estado de coisas é necessário uma reforma profunda e um entendimento alargado na Assembleia da República e na sociedade civil, onde a Ordem dos Advogados tem aqui um papel fundamental. Não podemos ter em 2021 os tribunais a trabalhar como na década de 60. Simplesmente não é possível. A confiança nas instituições adquire-se com o facto de serem transparentes, de existir informação sobre as mesmas e de estas demonstrarem a sua independência. É fundamentalmente termos uma melhor gestão nos processos, no controlo dos prazos e nas práticas adotadas.
Portugal tem excelentes advogados, quer em prática individual quer a trabalhar em sociedades.
Enquanto ex-vogal do CRL, qual é a sua posição sobre a proposta de alterações aos Estatutos da Ordem dos Advogados, em que se pretende que só mestres ou doutorados em direito ou licenciados pré-Bolonha possam requerer a sua inscrição como advogados estagiários?
A favor. As pessoas quando recorrem a um advogado partem do princípio de que ele tem a formação competente, de que para ter a carteira profissional de advogado passou por um rigoroso processo de aprendizagem tendo-o superado com sucesso e por isso está habilitado a advogar. É a ideia de que existe um controlo na concessão dessa carteira profissional e de que temos apertadas regras deontológicas que dá a fiabilidade aos advogados e a segurança a quem nos procura. Ser advogado não é um direito. O direito que existe é o dos cidadãos terem acesso à justiça e a advogados que defendam os seus interesses. Isso é que é o relevante, a qualidade do serviço jurídico. Por isso partilho a visão do Conselho Geral de que esta medida reforça o prestígio e a qualidade da advocacia.
A Ordem é uma instituição fundamental ao bom funcionamento da justiça, à defesa dos direitos e garantias dos cidadãos, à credibilidade e prestígio dos advogados. Existe uma tendência para menorizar o papel da Ordem e quem coloque mesmo em causa a razão da sua existência. Nada mais errado. Em parte isto acontece porque a Ordem nos últimos anos se esqueceu de defender os advogados, focando-se em perseguições internas em vez de externas, não se adaptou às novas tendências do mercado jurídico, à evolução da sociedade, mantendo-se com uma visão do mundo pré-internet. Além disso é necessário que os vários órgãos da Ordem percebam o seu papel, que se foquem no mesmo e nos tempos de mudança que estamos a viver. O que temos tido nos últimos anos são vários responsáveis a quererem fazer política dentro da Ordem. Bastonário existe só um. E é ele quem deve falar, por ter sido eleito, em nome dos advogados. A Ordem tem que ser mais coesa e servir os advogados. E infelizmente muitos não sentem ou não percebem a utilidade em termos uma Ordem de Advogados.
Esta guerrilha permanente entre os partidos políticos, incapazes de estabelecer consensos, só leva a um país que é incapaz de avançar.
Qual o principal desafio que a advocacia enfrenta atualmente?
A adaptação ao novo mundo. 2022 será um ano de grandes desafios, pois o mundo está a mudar a uma velocidade vertiginosa, desde as alterações dos modelos económicos à forma de encarar o trabalho e o tempo livre. Teremos um mundo antes e depois da Covid-19. E acredito que 2022 será o ano dessa viragem. Por isso temos que ter capacidade de antecipação e estarmos prontos para realizar investimentos de forma intensa e constante em inovação e conhecimento. Os clientes terão exigências diferentes, quererão interagir connosco de forma diferente e a uma velocidade a que tudo acontecerá será ainda mais rápida. Os locais de trabalho também terão que ser diferentes. É o que estamos a fazer ao investir nesta nova sede que contará com um espaço polivalente para formação e conferências, espaços sociais que visam promover a troca de ideias e a qualidade de vida no local de trabalho. Estamos prontos para o que der e vier.
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