Menos de 1% dos créditos com garantia pública foi para empresas zombie

Menor grau de exigência no acesso às moratórias públicas levou a que o peso das empresas de menor qualidade tenha superado o peso das empresas de maior qualidade.

Apenas 0,9% do montante de novos empréstimos com garantia pública foi concedido a empresas totalmente zombie, revela o Banco de Portugal, no Relatório de Estabilidade Financeira de dezembro, publicado esta segunda-feira. E esta proporção é praticamente idêntica nos novos empréstimos sem garantia pública — cerca de 0,8%. Mas, foram mais as empresas de menor qualidade que tiveram acesso à moratória pública.

Com o objetivo de tentar responder a questões como: “Terão os empréstimos com garantia pública sido concedidos apenas a empresas com modelos de negócio viáveis, ou será que estes contribuíram para o aumento da concessão de crédito às denominadas empresas zombie? E relativamente à moratória pública, que tipo de empresas acederam a esta medida de apoio?”, o Banco de Portugal alinhou alguns indicadores que revelam que o número de empresas totalmente zombie tem vindo a diminuir desde o máximo atingido em 2013. Uma redução que também se faz sentir ai nível do emprego e do ativo das empresas.

Uma empresa é considerada zombie quando apresenta um rácio de cobertura de juros inferior a um durante três anos consecutivos e, cumulativamente, tem pelo menos dez anos de atividade. Um critério que tenta excluir as empresas mais jovens que, tipicamente, ainda não se encontram financeiramente estabilizadas e podem ser facilmente abrangidas pelo primeiro critério. Mas a definição está longe de reunir consenso. E para além da definição de McGowan, existem outras como a de Storz que classifica uma empresa como zombie se esta apresentar, durante dois anos consecutivos, rendibilidade do ativo (resultado líquido/ativo) e investimento líquido inferiores a zero e capacidade de serviço da dívida (EBITDA/dívida financeira) inferiores a 5%.

E é com base nesta que Mingarelli propõe uma definição contínua de zombie: o indicador do nível de “zombificação” de cada empresa varia entre 0 e 1. “As empresas cujo indicador zombie “Z” é igual a 1 são denominadas “empresas zombie” ou empresas “totalmente zombie”. As empresas cujo indicador se situa no intervalo entre 0 e 1 (0<Z<1) são denominadas “quase zombie” e as empresas cujo indicador zombie é igual a 0 são denominadas empresas “não zombie””, explica o Banco de Portugal.

“As empresas com indicador zombie inferior a um e superior ou igual a 0,5 obtiveram 38,4% do montante de novos empréstimos com garantia pública”, revela o relatório, precisando que, cerca de metade deste montante foi concedido a empresas com um indicador zombie superior ou igual a 0,8 e inferior a um. Por outro lado, graças às limitações impostas nas condições e acesso a estes empréstimos, os novos empréstimos com garantia pública foram predominantemente concedidos a empresas não zombie ou a empresas com um indicador zombie relativamente baixo.

Proporção do montante de novos empréstimos bancários concedidos a empresas zombie, quase zombie e não zombie

Fonte: Banco de Portugal Valores em percentagem Notas: O gráfico apresenta a proporção do montante de novos empréstimos bancários, com e sem garantia pública, concedido a empresas zombie, quase zombie e não zombie entre março de 2020 e junho de 2021. O indicador relativo ao nível de “zombificação” das empresas foi apurado com base na informação financeira disponível até 2019. As barras a amarelo representam a percentagem de novos empréstimos sem garantia pública. As barras a azul referem-se à percentagem de novos empréstimos com garantia pública.

Mas se os critérios de acesso às linhas chamadas linhas Covid foram bastante apertados, esse grau de exigência não foi idêntico ao nível do acesso à moratória pública, que permitiu às empresas não pagar os juros e/ou capital dos créditos entre março de 2020 e setembro deste ano. Aliás a medida foi sendo alterada ao longo do tempo e à medida que a pandemia se foi prolongando.

“Os requisitos de acesso à moratória foram menos restritivos do que os associados aos empréstimos com garantia pública”, diz a instituição liderada por Mário Centeno. “Não obstante, apenas 4% do stock de empréstimos que entrou em moratória esteve associado a empresas totalmente zombie (empresas classificadas com base na informação disponível até 2019, antes da pandemia). Para as empresas com um indicador zombie superior ou igual a 0,5 e inferior a 1, esta percentagem foi de 53,2%.” Para o Banco de Portugal isto permite concluir que “o peso das empresas de menor qualidade nos empréstimos em moratória superou o peso das empresas de maior qualidade. No entanto, é também de salientar que uma percentagem significativa dos empréstimos sob moratória estava associada a empresas não zombie (37,3%).

Para o regulador, só depois de a moratória terminar será possível perceber se estas empresas têm capacidade para retomar o reembolso regular dos seus empréstimos, ou se isso apenas será possível após uma reestruturação bem-sucedida das suas responsabilidades financeiras.

Para ajudar o Executivo já criou a Linha de Apoio à Recuperação Económica – Retomar, com uma dotação de 1.000 milhões de euros, para a emissão de garantias sobre os créditos em moratória nos setores mais afetados pela pandemia. A linha destina-se a empresas não financeiras, viáveis, de qualquer dimensão e tem um prazo máximo de operação de até oito anos (ou de até dez anos, no caso de micro e pequenas empresas), incluindo um máximo de 24 meses de carência de capital.

Se as duas hipóteses anteriores não se vierem a concretizar, a terceira alternativa será “um aumento do nível de “zombificação” das empresas portuguesas”.

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