Dos motivos aos serviços mínimos, tudo o que precisa de saber sobre a greve geral
- Isabel Patrício
- 11 Dezembro 2025
Revisão da lei do trabalho está no centro da greve geral marcada para esta quinta-feira, que promete ter um impacto nas escolas, hospitais, transportes públicos, indústria e até a banca.
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Quem convocou esta greve geral?
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Afinal, o que motivou a convocação desta greve?
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Mas o Governo recusou negociar as alterações à lei do trabalho?
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E quando seguem estas alterações para o Parlamento?
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A greve desta quinta-feira vai afetar que setores?
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Mas não há serviços mínimos?
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No limite, o Governo pode recorrer à requisição civil?
Dos motivos aos serviços mínimos, tudo o que precisa de saber sobre a greve geral
- Isabel Patrício
- 11 Dezembro 2025
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Quem convocou esta greve geral?
A greve geral foi convocada pela CGTP e pela UGT. Desde 2013 que estas duas centrais sindicais não consensualizaram um protesto deste tipo. Aliás, em 51 anos de democracia, esta é apenas a quinta vez que tal acontece.
Em declarações ao ECO aquando do anúncio desta paralisação, o secretário-geral adjunto da UGT, Sérgio Monte, denunciava que o Governo não está a negociar a reforma da lei do trabalho, “mas a impor as suas vontades“.
Por sua vez, Tiago Oliveira, secretário-geral da CGTP, já disse que antecipa uma “grande greve” em protesto contra um pacote que “acentua a precariedade, facilita os despedimentos, desregula os tempos de trabalho, limita a atuação dos sindicatos, e ataca a negociação coletiva.
“Temos de exigir, neste momento, a retirada do pacote. É neste momento. Nenhum trabalhador perdoaria se não déssemos combate”, afirmou o sindicalista.
Proxima Pergunta: Afinal, o que motivou a convocação desta greve?
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Afinal, o que motivou a convocação desta greve?
No centro desta paralisação, está a reforma da lei do trabalho que o Governo quer levar a cabo.
No final de julho, o Governo aprovou em Conselho de Ministros e apresentou na Concertação Social o anteprojeto “Trabalho XXI”, que pôs em cima da mesa mais de 100 mudanças ao Código do Trabalho, nomeadamente no que diz respeito aos contratos a prazo, aos despedimentos, às licenças parentais e aos bancos de horas.
Desde essa altura que a UGT tem feito críticas, mas, entretanto, decidiu consensualizar uma data com a CGTP para uma greve geral, em protesto não só contra as medidas que estão em cima da mesa, mas também contra a falta de evolução na negociação.
Vários sindicatos setoriais também já anunciaram a sua adesão a esta paralisação, da saúde à educação, passando pela banca, seguros e transportes.
Proxima Pergunta: Mas o Governo recusou negociar as alterações à lei do trabalho?
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Mas o Governo recusou negociar as alterações à lei do trabalho?
O Governo tem dito e repetido que esta greve geral “não faz sentido” por duas razões:
- Porque entende que as medidas em causa vão modernizar o mercado de trabalho, com ganhos salariais para os trabalhadores (aliás, o primeiro-ministro já fala num salário mínimo nacional de 1.600 euros, embora não defina um prazo);
- Porque insiste que está aberto a negociar esta revisão do trabalho com os parceiros sociais, sublinhando que tem promovido diversas reuniões, desde o verão, com os representantes dos empregadores e dos trabalhadores.
No entanto, a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, tem deixado também sinais a que vale a pena dar atenção.
Desde logo, garantiu que a negociação na Concertação Social seria feita sem pressa, mas não seria eterna. Chegou a admitir enviar a proposta para o Parlamento, mesmo sem acordo nessa sede.
Por outro lado, declarou mais do que uma vez que as “traves-mestras” desta revisão são para manter. Disse-o, por exemplo, na abertura da conferência que o Trabalho by ECO promoveu sobre o tema. Os sindicatos têm entendido esse recado como a fixação de linhas vermelhas na negociação.
Além disso, em entrevista ao ECO em setembro, a ministra do Trabalho deixou claro que não vai “comprar consensos agora para criar conflitos depois ou ‘passar’ à força na Concertação só para garantir aprovação no Parlamento”.
Por fim, apesar de insistirem que tem abertura para negociar, tanto a ministra do Trabalho, como o primeiro-ministro não têm dado sinais de recuar nas matérias consideradas mais críticas pelos sindicatos. Por exemplo, ainda no final de novembro, Palma Ramalho foi à RTP defender o outsourcing, referindo que “também é criador de emprego”, o alargamento dos contratos a prazo e o banco de horas individual.
Proxima Pergunta: E quando seguem estas alterações para o Parlamento?
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E quando seguem estas alterações para o Parlamento?
Ainda não é certo. A UGT receava que, finda a discussão do Orçamento do Estado para 2026, o Governo desse por terminada a negociação da lei laboral na Concertação Social e seguisse para o Parlamento.
Tal não aconteceu, até porque, antes da votação global final do OE, essa central sindical reuniu com a ministra do Trabalho e pediu-lhe mais tempo.
“A UGT pediu mais tempo para analisar o anteprojeto e também para analisar as propostas de alteração ao mesmo, que tínhamos avançado na última reunião. Naturalmente, o Governo, dada a importância deste dossiê, concederá à UGT o tempo suficiente para fazer essa análise”, salientou a ministra do Trabalho, em declarações aos jornalistas.
Para já, a UGT tem recusado fixar um prazo para essa avaliação, dizendo apenas que em causa está um pacote extenso e que, por isso, tem de ser debatido e negociado com tempo.
Proxima Pergunta: A greve desta quinta-feira vai afetar que setores?
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A greve desta quinta-feira vai afetar que setores?
Saúde, educação, transportes, banca, seguros, cultura, media, indústria. São variados os setores que deverão ser impactados por esta greve geral, já que os sindicatos que representam os trabalhadores dessas áreas já mostraram apoio a esta paralisação, criticando duramente as propostas laborais do Governo.
Na educação, por exemplo, a Fenprof não tardou a aderir, considerando o anteprojeto do Executivo uma “ameaça de retrocesso civilizacional“.
Na saúde, aderiram à paralisação, por exemplo, o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP) e a Federação Nacional dos Médicos (FNAM), e a própria ministra da tutela, Ana Paula Martins, já admitiu que as cirurgias e consultas serão afetadas, apesar dos serviços mínimos.
Já na indústria, a comissão de trabalhadores da Autoeuropa diz prever uma grande adesão à greve na fábrica de Palmela. “O Governo não quer negociar — não o quis durante cinco ou seis meses e continua a não querer — e os trabalhadores vão responder à nossa chamada. Penso que aqui, na Autoeuropa, a greve geral vai ter uma adesão bastante grande”, disse à agência Lusa Rogério Nogueira, coordenador da comissão de trabalhadores.
Proxima Pergunta: Mas não há serviços mínimos?
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Mas não há serviços mínimos?
Há, conforme o ECO já escreveu em detalhe. Mas, atenção, os serviços mínimos só são fixados (por acordo ou decisão) nos setores que respondem a necessidades impreteríveis da população, como na saúde e nos transportes.
O direito à greve está estabelecido na Constituição, mas a lei do trabalho define que, nas empresas e os estabelecimentos que se destinam à “satisfação de necessidades sociais impreteríveis”, os sindicatos devem assegurar a “prestação de serviços mínimos indispensáveis” para salvaguardar essas necessidades.
Esses serviços mínimos podem ser definidos por acordo entre os representantes dos trabalhadores e os empregadores ou, na ausência desse entendimento, o serviço competente do Ministério do Trabalho convoca essas partes para a levar a cabo negociação.
Na falta de acordo, os serviços mínimos são, então, definidos por despacho conjunto, “devidamente fundamentado”, do Ministério do Trabalho e do Ministério responsável pelo setor de atividade afetado. Ou, tratando-se de empresa do setor empresarial do Estado, por tribunal arbitral.
Foi o tribunal arbitral que decidiu os serviços mínimos a aplicar, por exemplo, à CP e à Carris.
Quanto à Comboios de Portugal, ficou decidido que todos os comboios que transportem substâncias ou matérias perigosas (em carga ou em vazio) devem ser conduzidos ao seu destino, e que todas as composições que hajam iniciado a marcha devem ser conduzidas ao respetivo destino e estacionadas em condições normais de segurança.
“Relativamente à circulação de comboios, o tribunal aceitou a proposta de serviços mínimos da CP [pode ler em detalhe aqui], mas com exceção dos comboios de longo curso 133, 134, 523, de 15 circulações regionais, três urbanos de Coimbra, 33 urbanos de Lisboa e 15 do Porto”, lê-se ainda na decisão publicada pelo CES.
Relativamente à Carris, o tribunal determinou serviços mínimos que garantem o funcionamento do transporte para cidadãos com mobilidade reduzida e de 12 carreiras, “mantendo a sua distribuição proporcional conforme os momentos do dia com maior e menor procura, tomando por referência a frequência horária prevista em cada carreira num dia normal de semana”.
Por outro lado, o tribunal arbitral negou a fixação de serviços mínimos no Metropolitano de Lisboa, decisão que a empresa criticou.
Ainda nos transportes, estão fixados, por acordo, serviços mínimos no que diz respeito, por exemplo, aos voos da TAP e da EasyJet, estando também assegurados os serviços de handling correspondentes.
E na saúde? Estão fixados serviços mínimos que incluem situações de urgência, quimioterapia, cuidados paliativos e pensos.
Proxima Pergunta: No limite, o Governo pode recorrer à requisição civil?
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No limite, o Governo pode recorrer à requisição civil?
Sim. Caso os serviços mínimos não sejam cumpridos, o Governo pode “subir o tom” e recorrer, por decisão do Conselho de Ministros, à requisição civil para assegurar que as tais necessidades impreteríveis da população são cumpridas.
Foi isso que foi feito, por exemplo, em 2019, aquando da greve dos motoristas de matérias perigosas. Nessa altura, face ao incumprimento dos serviços mínimos, o Governo decidiu recorrer à requisição civil, figura que prevê que os trabalhadores que não obedeçam arriscam ser despedidos por justa causa ou até uma pena de prisão até dois anos.