A corretora polaca vai lançar este ano em Portugal uma solução de pagamentos e transferências para "entrarmos mais na área bancária", revela Eduardo Silva, diretor-geral da XTB Portugal em entrevista.
A XTB entrou no mercado nacional em 2010 e rapidamente ficou conhecida como uma corretora orientada para o trading, por via da comercialização de CFD (Contrato por Diferença, em português) e de outros produtos derivados. No entanto, desde há alguns anos que a corretora de origem polaca tem vindo a alargar a sua oferta para outros produtos, para alargar a sua base de clientes.
Ações fracionadas e fundos de índice (ETF) têm sido alguns dos produtos que têm colhido o interesse dos investidores nacionais na plataforma da XTB que, em breve, terão também à sua disposição obrigações soberanas e de empresas. “Fomos escolhidos pela XTB como o primeiro país a oferecer a negociação de obrigações”, adianta Eduardo Silva, diretor-geral da XTB Portugal em entrevista ao ECO.
Mas os planos da corretora em Portugal não se ficam por aqui. No horizonte da XTB está a ambição de se tornar numa espécie de “one stop shop”, disponibilizando aos seus clientes um vasto conjunto de soluções de investimento e de serviços bancários. É nesse âmbito que a XTB pretende lançar no segundo semestre as E-wallets, um sistema de pagamentos e de transferências.
“Será a abertura de uma nova janela de desenvolvimento de produtos para entrarmos mais na área bancária, para começarmos a explorar outras áreas de negócio”, adianta Eduardo Silva.
A XTB está em Portugal desde 2010. Teve na sua génese a comercialização de CFD e de produtos derivados, mas tem vindo a alargar a sua oferta com ações, ETF e, mais recentemente, a remuneração dos fundos dos investidores que não estão aplicados. Porquê?
Na altura, o principal mercado das corretoras era o Forex, mas com as alterações de regulamentação ao longo do tempo tivemo-nos de adaptar. Com a entrada da ESMA pareceu-nos óbvio diversificar a nossa oferta de produtos e tentarmos alargar a base de clientes. Fugir um bocado da conotação que tínhamos de sermos uma corretora de CFD para nos transformar, de certa forma, numa ‘super’ aplicação de investimentos com todo o tipo de produtos, em que qualquer pessoa, com qualquer nível financeiro, horizonte temporal ou apetite por risco conseguisse encontrar na XTB em que esteve ali para investir, passou um bocado por aí.
Neste momento os CFD continuam a ser o principal produto negociado pelos vossos clientes?
Não. Desde 2021, com a introdução das ações e dos ETF com comissão zero, começámos a ver, principalmente em Portugal, um grande interesse por produtos de investimento passivo. No primeiro trimestre deste ano notámos que a primeira transação de 70% dos nossos novos clientes é investimento passivo, como um plano de investimento, um ETF ou ações. Mudou completamente.
Mas em termos de volume de negócio, os CFD continuam a ser o principal produto da XTB?
Obviamente. Ainda estamos numa fase de transição [na alocação por ativos] e ainda não chegámos àquele ponto em que existe escala suficiente para dizermos que o investimento passivo é o que rende mais à corretora. Não estamos nesse ponto. Portanto, o nosso principal produto em termos de gerar dinheiro, de gerar rentabilidade para a corretora, acabam por ser os CFD.
Este ano vamos lançar a oferta de obrigações, que era um produto que estava em falta e que gera muito interesse para os investidores nesta fase, em função do atual ciclo de taxas de juro e por uma questão de gestão de volatilidade e de risco.
Como correu 2023 para a XTB Portugal?
Foi um ano recorde. Fizemos 175 milhões de euros de resultado líquido consolidado e os clientes foram 312 mil.
Isso em termos globais. E em Portugal?
Neste momento somos o segundo país com maior crescimento em termos de novos clientes. Se olharmos para 2022, tivemos um crescimento da base de clientes de 80% nesse ano. E de março de 2023 a março deste ano, o crescimento de novos clientes disparou 240%.
De que forma é que esse crescimento se traduz em números absolutos?
Como somos uma empresa cotada em bolsa é difícil divulgar exatamente esses números, mas há cerca de um mês lançámos um número global de um milhão de novos clientes.
Em que posição está Portugal nesse ranking?
Estamos em sexto ao nível de novos clientes.
O mercado em que a XTB opera é muito concorrencial e vocês têm conseguido ganhar quota de mercado ao longo dos anos. O que vos torna diferentes da concorrência?
Uma das coisas é possibilitarmos a negociação de ETF fracionados, que permite, por exemplo, uma pessoa que tenha menos capital possa experimentar o produto com valores mais baixo. E depois, realmente, à medida que vai conhecendo os produtos, pode ir aumentando o portefólio. Isso foi um dos pontos que tem feito a diferença relativamente à nossa concorrência. Depois temos o facto de estamos aqui, em Portugal, de forma presencial. Isso faz muita diferença. Estamos aqui há 15 anos.
Ao longo desses 15 anos têm aumentado a oferta de produtos. Têm planeado novidades para este ano?
Este ano vamos lançar a oferta de obrigações, que era um produto que estava em falta e que gera muito interesse para os investidores nesta fase, em função do atual ciclo de taxas de juro e por uma questão de gestão de volatilidade e de risco.
A vossa oferta será composta tanto por obrigações soberanas como títulos de dívida de empresas?
Sim. Vamos introduzir cerca de 90 obrigações de empresas e governos, mas apenas de qualidade, de investment grade.
Irão também disponibilizar obrigações fracionadas, como já sucede com as ações e os ETF?
Também. Será possível os investidores negociarem a partir de dez euros em diferentes moedas.
A negociação de “comissão zero” praticada nas ações será também aplicada nas obrigações?
Ainda não sabemos exatamente qual será o modelo que vamos acabar por lançar – estamos a ultimar isso. As obrigações vão ser lançadas em maio e há dois ou três cenários em cima da mesa. Mas independentemente de ser comissão zero ou uma comissão muito baixa, será sempre um produto para as pessoas se introduzirem, portanto, será sempre muito mais competitivo do que o que está neste momento no mercado, para que as pessoas possam começar a conhecer os produtos.
Qual é a vossa expectativa até ao final do ano em relação à oferta de obrigações?
Não vai ser um produto de bandeira. Até porque, se olharmos para o que aconteceu com os ETF, em que tivemos entre 2021 e 2023 um grande crescimento, não foi exponencial.
Têm sentido, por parte dos vossos clientes, uma procura crescida por ETF de obrigações?
Não tanto. Até porque o nível de literacia do próprio país faz com que não exista um conhecimento tão grande, ao ponto de as pessoas estarem constantemente à procura de certos produtos mais específicos. O ETF mais negociado numa corretora como a XTB é um que vai replicar um índice como o S&P 500, porque os investidores leem em todos os livros e é uma forma de entrar no mercado e ter alguma exposição.
Hoje em dia produzimos muito conteúdo, mas, além disso, queremos que os nossos clientes também sejam um livro aberto e as pessoas entendam onde é que está tudo a acontecer.
No final do ano passado também anunciaram o regresso da vossa rede social Xsocial. Isso irá acontecer este ano?
Este ano já foi lançado na Polónia e por isso será uma questão de tempo até termos isso em Portugal. Mas esta versão é diferente da anterior. O que tínhamos no passado era um sistema em que as pessoas podiam seguir um trader e o que o trader fizesse era replicado automaticamente na conta do cliente. Agora, quando um trader abre uma posição, somos notificados da operação e vamos ter a oportunidade de analisar se queremos entrar ou não. Há um pouco mais de oportunidade para cada pessoa decidir se quer realmente seguir tudo ou não.
Porque decidiram regressar agora com esta rede social?
Estamos muito limitados em dar recomendações no mercado. E as pessoas procuram informação sobre quem é que está a ganhar dinheiro nas ações, nos ETF, os setores que estão a ganhar mais, etc. E através desta rede social poderão ter essa informação. Hoje em dia produzimos muito conteúdo mas, além disso, queremos que os nossos clientes também sejam um livro aberto e as pessoas entendam onde é que está tudo a acontecer.
Essa solução das redes sociais tem sido uma aposta de várias corretoras. Não considera que este tipo de produto promove a gamificação do investimento, com todos os riscos que isso pode estar associado?
Fugimos 100% da gamificação. Não é o nosso foco passar por cima da parte da literacia financeira e de ensinar as pessoas a investirem com conhecimento. Ao mesmo tempo, uma rede social é um sítio onde as pessoas podem partilhar, podem escrever o que pensam e podem tirar ideias.
Mas esses fóruns já existem.
Exatamente. Este é só mais um fórum onde as pessoas com interesses comuns podem partilhar informação. E até considero que isto é um ponto de literacia, porque de certa forma vão estar as pessoas a que que percebem a falar e as outras pessoas que estão interessadas em aprender.
Vamos entrar num setor que não fazia parte do horizonte da corretora há uns anos [sistema de pagamentos e transferências E-wallets], mas sentimos que os clientes procuram estes serviços.
Além da Xsocial e da oferta de obrigações, haverá mais alguma novidade?
Câmbios dentro da plataforma para investimento e, provavelmente, a maior disrupção na corretora vai ser a introdução de um novo produto no segundo semestre que são as E-wallets.
Que produto é esse?
É um sistema de pagamentos e também de transferências. Vamos entrar num setor que não fazia parte do horizonte da corretora há uns anos, mas sentimos que os clientes procuram estes serviços. Querem ter o cartão da corretora para chegar a uma loja e pagar com o dinheiro que têm na corretora.
Será mais um passo para entrarem no setor bancário?
Já disponibilizamos o pagamento de juros sobre o capital que não está investido, que tem corrido muito bem. Portanto, este é o próximo passo. Será a abertura de uma nova janela de desenvolvimento de produtos para entrarmos mais na área bancária, para começarmos a explorar outras áreas de negócio.
A XTB e outras corretoras concorrentes viradas para o retalho sustentam grande parte do seu marketing em redor da ausência de comissões de negociação. No entanto, isso não é inteiramente assim, dado que essas comissões estão, por exemplo, no spread do preço de compra e venda mais alargado do que nas corretoras mais convencionais. Em setembro do ano passado introduziram uma nova comissão a que chamaram de “taxa de inatividade”. É o início de uma mudança do vosso modelo de negócio?
Não, é exatamente manter a linha em que funcionamos. Acho até que é a taxa de inatividade mais irrisória que existe no mercado. As pessoas só têm de fazer um trade, o que com comissão zero só têm de abrir e fechar uma ação e não têm nenhum custo.
Mas porquê a introdução desta taxa?
É a prática comum do setor. A taxa de inatividade é, de certa forma, chamar as pessoas à corretora para verem como é que está o seu portefólio, como é que está a sua conta, ajustar os seus movimentos. Faz parte de uma estratégia normal de qualquer corretora perante os seus clientes, e acho que até somos dos que estamos mais tranquilos neste cenário.
Mas isso significa que, na vossa perspetiva, o trading é uma estratégia mais indicada do que uma estratégia de investimento passiva?
É exatamente o contrário. Quando falamos de um ano, não estamos a falar de trading, estamos a falar de investimento.
Mas se eu não fizer nada na minha carteira durante um ano, pago uma comissão de 10 euros por mês.
Mas é uma comissão que nem tem de pagar a comissão. É só abrir e fechar uma posição. A única coisa que queremos é ter o cliente no nosso ambiente, ver o que estamos a fazer, o que há de novo.
Têm uma grande percentagem de contas inativas?
Não. Se pensarmos, podíamos ter ou não ter esta comissão. Não há nenhuma explicação para esta situação.
De uma forma geral, o investidor nacional é mais ativo do que a média dos investidores europeus?
Somos mais adeptos do investimento passivo. Por isso é que, por exemplo, os bancos de investimento como a BlackRock, quando estimam qual o mercado com o maior potencial de crescimento em produtos como os ETF apontam para a Península Ibérica, Roménia.
Quem tem mais rendimento também tem mais disponibilidade para arriscar um pouco mais. Uma pessoa na Alemanha, provavelmente consegue investir ou ser mais pró-ativo no seu investimento, mais virado para o trading do que provavelmente um investidor português, onde realmente há menos rendimento e as pessoas procuram preservar o seu capital primeiro e depois tentar procurar uma maior rentabilidade. Portanto, aqui o investimento passivo é realmente o principal foco do consumidor. Daí também termos sido escolhidos pela XTB como o primeiro país a oferecer a negociação de obrigações.
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