A espanhola Ktesios estreou-se na bolsa portuguesa e tem planos "muito ambiciosos", que passam pelo arrendamento acessível. O CEO, Henry Gallego, elogia ainda o regime das SIGI.
Estreou-se na bolsa de Lisboa e pretende continuar a estratégia que tem em Espanha: apostar em casas de renda acessível fora das grandes cidades. “Investimos onde ninguém quer investir”, diz ao ECO Henry Gallego, CEO da Ktesios, explicando que o objetivo são cidades à volta da capital, onde é possível praticar rendas entre os 350 e os 400 euros. Isto porque, no centro de Lisboa, é “mais complexo e complicado”.
Portugal é um “mercado com muito potencial”, diz o responsável, que adianta já estar em contacto com várias instituições para encontrar as melhores oportunidades de negócio. Contudo, isso ainda levará o seu tempo, uma vez que o foco agora é crescer de forma “sustentável”. A Ktesios tem atualmente 258 imóveis, mas quer chegar aos 2.500. É um plano “ambicioso”, diz Henry Gallego.
A empresa é uma SOCIMI (sociedade anónima cotizada de inversión en el mercado inmobiliario), um veículo de investimento imobiliário com sede em Espanha, semelhante aos famosos REIT (real estate investment trust). Agora que chega a Portugal, a Ktesios pode ainda criar uma SIGI (sociedade de investimento e gestão imobiliária), juntando-se, assim, à SIGI da Sonae Sierra e do Bankinter. “Never say never”, diz Henry Gallego, quando questionado sobre essa hipótese, notando que a legislação portuguesa é “bastante avançada e vantajosa”.
Quem é a Ktesios e onde é que investe?
Somos uma SOCIMI residencial, equivalente a uma SIGI portuguesa, com impacto social. Só investimos em ativos residenciais, em zonas limítrofes com grandes populações, mas com um impacto económico favorável. Isto é, onde há geração de emprego e indústria. O que procuramos oferecer é arrendamento acessível de longa duração, orientado para a classe trabalhadora, que é a grande maioria da população.
Além disso, diferenciamo-nos porque os investidores institucionais de outras SOCIMI investem em residencial principalmente nas zonas prime, nas grandes cidades. Nós não. Nós investimos onde ninguém quer investir, mas onde há muito potencial. E neste ponto, somos a primeira SOCIMI europeia cotada em bolsa com este foco social. Somos os únicos institucionais que se dedicam a esta tipologia de investimento, com o qual podemos adquirir ativos com maiores descontos face ao preço de mercado. São ativos que normalmente pertencem a bancos ou a fundos de investimento.
Por exemplo, com um milhão de euros podemos comprar entre 25 a 30 casas, enquanto nas grandes cidades, com um milhão de euros só podemos comprar três ou quatro casas, se tanto. Então é aí que nós marcamos a diferença. Além disso, o objetivo de uma SOCIMI é profissionalizar o setor e isso significa dar entrada a todo o tipo de investidor: do pequeno ao grande. E é isso que pretendemos: dinamizar estas zonas, gerar riqueza e dar acesso a uma casa digna a preços acessíveis.
Quantos ativos têm sob gestão e quanto valem?
Atualmente temos 258 imóveis sob gestão, distribuídos por 14 municípios de quatro províncias espanholas, com um valor de mercado de 12,4 milhões de euros. E comprámo-los por 5,4 milhões de euros.
Portugal é um mercado com muito potencial e muitas oportunidades. Ao investidor institucional interessam ativos de zonas prime, mas há mais vida além disso. E muitas pessoas não ganham o suficiente para pagar as rendas que são praticadas em Lisboa.
O que pensa do mercado imobiliário português?
Consideramos que há muitas semelhanças entre a cultura portuguesa e a cultura espanhola. Consideramos que Portugal é um mercado com muito potencial, com muitas oportunidades, e é aí onde queremos entrar. E tal como acontece em Espanha, também acontece em Portugal: ao investidor institucional interessam ativos de Lisboa, do Porto, de cidades grandes, zonas prime. Mas há mais vida além disso. E muitas pessoas não ganham o suficiente para pagar as rendas que são praticadas em Lisboa. Então nós consideramos que há uma oportunidade para entrarmos em Portugal e rever o tipo de negócio: gerar riqueza, dinamizar as zonas periféricas e dar acesso a casas de renda acessível e de boa qualidade.
Então Portugal é um mercado interessante para investir?
Absolutamente! E, por isso, decidimos entrar na bolsa portuguesa. Precisamos por isso, porque queremos que a nossa presença comece já e estamos a analisar o mercado. Não vou dizer que vamos começar a investir amanhã, tudo leva o seu tempo e temos de ser pacientes, ter um crescimento orgânico, mas sustentável. E vamos entrar em Portugal e, por isso, demos este primeiro passo ao escolher a Euronext Lisboa.
Porquê entrar para a bolsa e não investir “normalmente”, ou seja, adquirindo ativos? Qual a vantagem de entrar para a bolsa?
Tudo acontece no seu tempo. A Ktesios foi criada em 2019 e desde então tem percorrido um caminho muito importante desde que se converteu numa SOCIMI. E, dentro disto, um dos objetivos que tínhamos era estar cotados em bolsa. A partir daqui escolhemos a Euronext Lisboa e agora? Vamos continuar a crescer em Espanha e vamos começar a procurar operações de investimento e crescimento em Portugal. Não vamos fazê-lo imediatamente, mas será feito passo a passo. Estávamos totalmente focados — e todos os nossos esforços estão direcionados nesse sentido — em fazer com que a nossa entrada em bolsa fosse perfeita e agora já começámos com o plano de crescimento.
E qual será a estratégia de investimento em Portugal?
Igual à que levamos a cabo em Espanha. Não vamos mudar o nosso ADN. O ADN da Ktesios é ser uma SOCIMI, um veículo de investimento imobiliário com foco social, que procura rentabilidades recorrentes. E temos o nosso plano de investimentos em Espanha, que queremos replicar em Portugal. Da mesma forma. Claro que há que ajustar algumas coisas, mas no geral é o que pretendemos e já estamos, inclusive, de olho em algumas coisas e em contacto com alguns players do mercado. Será pouco a pouco.
Em termos de cidades, estamos a analisar. Temos visto muitas carteiras e alguns projetos que nos agradam, mas os nossos esforços até agora estavam centralizados na entrada em bolsa. Agora vamos começar a explorar, mas o radar deverá estar à volta de Lisboa para começar, mas populações mais pequenas. Ou seja, perto da capital, mas nas quais poderemos oferecer arrendamentos mais acessíveis. Onde as pessoas prefiram pegar no carro e demorar 40 minutos a chegar ao trabalho, mas tendo uma casa onde paguem 350 ou 400 euros de renda.
Então acredita que em Lisboa não é possível dar às pessoas rendas acessíveis?
Sim, é possível, há oportunidades e há que analisá-las. Em algumas zonas de Lisboa é possível. Mas é muito mais complexo e complicado. Vimos algumas coisas interessantes, mas é preciso ser realista. Se queremos manter o nosso objetivo, temos de ser muito realistas. Adorávamos poder comprar no centro de Lisboa um edifício com desconto de 50% e praticar rendas de 400 euros. Mas isso não existe. E quando existe, quando aparece um imóvel destes, as rentabilidades são muito baixas. Mas se isso aparecer, garanto que seremos os primeiros a apostar nisso.
Em Madrid, por exemplo, acontece o mesmo?
Sim, passa o mesmo. Em Madrid, o retorno que se espera — a yield — nas zonas prime é de cerca de 2%. Por exemplo, em Madrid, com um milhão de euros posso comprar três casas, mas nas zonas onde nós investimos, com um milhão de euros consigo comprar entre 25 a 30 casas. E por isso é que podemos permitir-nos dar casas de renda acessível e mitigar o risco.
Estamos a analisar, mas consideramos que os valores [rendas] estão em linha com o que praticamos em Espanha. Creio que temos de aprofundar um pouco mais. Mas as acredito que à volta de 350 a 400 euros por casas em condições.
Nesse sentido, que preços planeiam praticar em Portugal? O que considera “rendas acessíveis” para os portugueses?
Estamos a analisar, mas consideramos que os valores estão em linha com o que praticamos em Espanha. Creio que temos de aprofundar um pouco mais. Mas acredito que à volta de 350 a 400 euros por casas em condições.
A Ktesios pretende fazer um aumento de capital de dez milhões de euros. Quando é que isto vai acontecer e quem são as empresas envolvidas?
Quando entramos para a bolsa, um dos princípios fundamentais é o crescimento. E isso é importante para atrair novos investidores. Por isso vamos fazer um aumento de capital de dez milhões de euros. Não saberemos quando será, mas sabemos que será em breve. E depois disso faremos mais aumentos de capital. O nosso plano estratégico é ir crescendo e alcançar, no mínimo, as 2.500 casas.
O jornal El Español escreveu que este aumento de capital iria servir para adquirir uma carteira de 500 imóveis, avaliada em 24 milhões de euros. Que carteira é esta?
O que nós fazemos é pôr sempre em valor o queremos. A nossa ideia é comprar cerca de 500 ativos e esses ativos podem ser comprados com cerca de dez milhões de euros. Mas não é verdade que tenhamos uma carteira “comprometida”. Estamos em contacto com entidades financeiras e fundos de investimento que querem vender carteiras e, obviamente, a nossa equipa de análise está constantemente a analisar tudo. Porque nós queremos — e foi sempre a nossa política — transformar rapidamente o dinheiro dos acionistas em aquisições de ativos, para que o ciclo de investimento cresça e a rentabilidade também.
Quanto é que a Ktesios tem disponível para investir em Portugal?
Não vamos entrar em Portugal no curto prazo. As coisas têm de ser feitas com os pés na terra e com um crescimento orgânico, firme e sólido. Vamos continuar com os negócios que temos e depois começaremos a entrar no mercado português. Há um ditado espanhol que diz “quien mucho abarca poco aprieta” [semelhante a “quem muito fala pouco acerta”], isto é, fazer muita coisa ao mesmo tempo não dá bom resultado. Por isso vamos passo a passo para fazer as coisas bem. Por enquanto, não posso dizer que temos 15 milhões de euros para Portugal ou Espanha. Não há um número para Espanha nem para Portugal. Estamos focados no crescimento, vamos analisando as carteiras e tudo o que sejam carteiras elegíveis nós analisaremos. De momento, estamos centrados em Espanha e vamos começar a segunda fase, a médio prazo, em Portugal.
Há intenções de formar uma SIGI em Portugal? Admite essa hipótese?
Never say never. Acabamos de entrar na bolsa e vamos avançando. Os negócios e as estratégias demoram. Há um plano de crescimento imenso, o nosso plano estratégico é muito ambicioso. Veremos.
Parece-nos uma regulação bastante avançada e vantajosa. Parecem-me muito positivos alguns fatores de regulação das SIGI, que são muito interessantes. Vejo muito potencial.
A Merlin Properties – uma SOCIMI espanhola também cotada na bolsa portuguesa – já referiu várias vezes ter intenções de formar uma SIGI, mas critica a lei portuguesa, que diz ser pouco vantajosa. Concorda?
Na minha opinião, do ponto de vista do que fazemos, parece-nos uma regulamentação bastante avançada e vantajosa. Parecem-me muito positivos alguns fatores de regulação das SIGI, que são muito interessantes. Vejo muito potencial. Parece-me uma regulação bastante avançada e acho que fizeram um grande trabalho. Obviamente que há sempre coisas que se podem melhorar, mas na minha opinião, está bastante bem feita. Estamos a estudar ainda os detalhes, porque ainda é uma lei nova e há questões que é preciso entender. Mas no geral é bastante positiva.
Como quer que a Ktesios seja conhecida em Portugal?
Da mesma forma que em Espanha. Que seja conhecida como uma sociedade de investimento imobiliário com impacto social. Esta é a nossa mensagem. É isso que somos e é isso que queremos continuar a ser. Queremos dinamizar, ser parte da sociedade, atrair e gerar boas rentabilidades para os investidores, mas também poder ter impacto social.
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Ktesios chega a Portugal para criar rendas acessíveis “para a classe trabalhadora”, diz Henry Gallego
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