Em entrevista ao ECO, Catarina Martins explica os passos que o BE quer dar para recuperar o controlo de empresas estratégicas, a começar pelos CTT. E explica a relação do partido com os empresários.
O Bloco de Esquerda quer pôr na agenda do próximo Governo o que chama de “recuperação do controlo de empresas de setores estratégicos”. E há uma prioridade na agenda de Catarina Martins: os CTT. “Nos CTT foi distribuído mais aos acionistas em dividendos do que os lucros da empresa”. O discurso do Bloco é sempre crítico dos empresários, como se viu na biografia publicada no sítio esquerda.net sobre Alexandre Soares dos Santos. Ainda assim, Catarina Martins garante que o Bloco é capaz de “aprender com os empresários”.
O Bloco de Esquerda quer que o Estado recupere o controlo das empresas estratégicas? Como é que se pode fazer isso?
No programa eleitoral, identificamos as empresas estratégicas que deveriam ter um controlo público, identificamos alguns passos imediatos e propomos a criação de um programa a prazo que estude, caso a caso, como recuperar as empresas. Não propomos, de um momento para o outro, a nacionalização de todas as empresas estratégicas, isso pode não ser possível, nem prudente. O que achamos é que nos CTT é possível fazê-lo…
Como? Nacionalizando ou comprando em bolsa aos privados donos da empresa?
Nos CTT fizemos propostas várias que fazem uma avaliação do que foi o preço da empresa, do que se perdeu com a gestão privada e com a responsabilização disso. Um exemplo: Nos CTT foi distribuído mais aos acionistas em dividendos do que os lucros da empresa. Propomos que haja uma ponderação de tudo isto no momento da operação.
Esse valor seria descontado?
Sim, tem de haver uma avaliação do que foi feito. Há outros setores, a REN e a EDP, o setor energético… um dos primeiros passos deveria ser a nacionalização do despacho da REN, que é a parte da REN que decide que energia de que produtor entra em que sistema, que determina em boa medida o preço da energia que pagamos. É importante do ponto de vista dos consumidores como da emergência climática como da transparência e da concorrência. A nacionalização do despacho da REN seria o primeiro passo. É preciso criar uma unidade no próprio Governo que estude como alargar as nacionalizações de setores estratégicos, porque as empresas não são todas iguais. Na ANA, temos um enorme problema com os aeroportos em Portugal, a Vinci ficou com os aeroportos, não pagou nada, já recuperou todo o investimento que fez na compra da ANA. [Por outro lado] a solução Montijo é muito barata, embora que seja um problema ambiental gravíssimo. Espero bem que haja tempo ainda para pensar isso. Sempre dissemos que damos muita importância ao impacto ambiental.
Será um dossiê determinante em possíveis negociações com o PS?
Do nosso ponto de vista, [o Montijo] é um erro e o estudo de impacte ambiental põe esse problema à vista, mas não é o único. Ficamos sem mecanismos. Vemos isso quando olhamos para as outras soluções aeroportuárias. Está na altura de reverter para o Estado a concessão dos aeroportos.
Isso significa rasgar contratos.
Todos os contratos se renegoceiam. O Estado tem é um papel de força, ou não, para renegociar, ou aceita tudo ou não aceita tudo. O setor mais óbvio sobre o facto de o Estado entrar numa posição de fraqueza é o financeiro onde aceitámos tudo, incluindo não nomear nenhum administrador para o Novo Banco, o que permite à Lone Star pôr as perdas o mais rápido que pode para, depois, vender o banco com lucro.
Quando eu vir uma grande empresa que não faça isto, terei todo o gosto em elogiá-la.
Morreu Alexandre Soares dos Santos e o Bloco de Esquerda publicou um texto muito crítico do empresário no sítio esquerda.net. É possível ouvir elogios do BE a empresários?
A esquerda.net publicou uma biografia do livro “Os burgueses”, não fez uma notícia sobre a morte…
…mas publicou uma biografia com uma visão crítica do empresário.
Todas têm uma visão. Alexandre Soares dos Santos sempre foi muito crítico de uma política de esquerda neste país, portanto, é normal. Na verdade, a maior parte dos empresários que tem tido espaço público têm sido defensores de políticas que permitem a renda do Estado e, aliás, com grande desprezo pelas condições e dignidade de quem trabalha. É óbvio que há essa diferença. Dito isto, não é verdade que não sejamos capazes de ter conversas e de aprender com empresários. Lembro-me de fazer visitas a empresas e de estar a conversar com empresários com práticas laborais e estratégia económica importante. Tenho sempre muito gosto em fazê-lo, continuarei a fazê-lo.
Faz uma avaliação diferente entre empresários de grandes grupos económicos e das PME?
Também há PME com práticas lastimáveis…
… mas há grandes grupos empresariais com boas práticas?
Os grandes grupos, pela própria estrutura, pelo próprio tecido empresarial português têm vivido muito das rendas do Estado e da compressão salarial. Quando eu vir uma grande empresa que não faça isto, terei todo o gosto em elogiá-la. Ainda não há descobri.
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“Não é verdade que não sejamos capazes de aprender com empresários”
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