No pipeline há mais dois mil milhões de euros em investimentos. Japão e Coreia do Sul são novas apostas e já há visitas a ser planeadas para 2020.
Eurico Brilhante Dias garante que já deu duas voltas ao globo nos dois anos que ocupa a Secretaria de Estado da Internacionalização. Para “vender” Portugal tem uma punch line que não falha: “Dentro da Europa e do euro, seguro e com talentos”. Em quatro anos de legislatura, Portugal já contratualizou 2,7 mil milhões de euros de investimento, tem mais dois mil milhões já decididos, mas pendentes de conclusão das negociações de incentivos financeiros, e mais uma mão cheia de investimentos que não dependeram do Estado, como a Google, Cisco, Microsoft, Volkswagen, etc. No capítulo das exportações a meta é atingir os 50% do PIB. Mas ainda há caminho a percorrer, mas os ganhos de quota de mercado, em 2017 e 2018, são um ponto positivo. O abrandamento europeu é uma realidade que não pode deixar nenhum governante indiferente — “um membro do Governo que nunca está preocupado está no lugar errado” — e a aposta é diversificar mercados. Costa do Marfim é só um exemplo e os voos diretos da TAP são uma mais-valia. Mas o Governo não tem ilusões: “Não estamos à espera de ter na TAP um espelho das opções estratégicas da política de internacionalização. Aquilo é uma companhia aérea”, diz Brilhante Dias em entrevista ao ECO.
Quantos quilómetros já fez desde que tomou posse como secretário de Estado da internacionalização?
Duas voltas à terra, provavelmente.
E até o final do mandato espera dar mais outra?
Não. Agora até o fim de julho faremos várias viagens: Angola outra vez, por ocasião da Filda e a abertura da delegação da Aicep, em Dublin, que é uma das duas aberturas deste ano (a outra foi Cantão). A partir daí talvez tenha de fazer um raide africano, para uma operação muito concreta. Serão as três viagens que farei provavelmente até o fim do mandato, se não houver nenhuma surpresa.
A que raide africano se está a referir?
Temos vindo a investir bastante na costa ocidental africana. Houve já duas missões: uma com a comissão mista com o ministro dos Negócios Estrangeiros e outra com o Presidente da República. Continuamos a investir fortemente no nosso posicionamento naquela região, estrategicamente muito importante para o país.
Há expectativa de novos novos investimentos?
Acima de tudo há a perspetiva de ter empresas portuguesas com investimentos naquela região, que compreende não só a Costa do Marfim, mas também Senegal, Gana como países onde há expectativas de novos negócios. Na costa ocidental africana há novas perspetivas: é uma região do globo com proximidade geográfica, tem a grande vantagem de ter voos diretos da TAP.
Estes novos negócios têm alguma área em particular?
Não, são áreas muito diversificadas: construção civil, resíduos como é o caso da Mota-Engil na Costa do Marfim, na área da metalomecânica, equipamentos. Há a crescente oportunidade, de forma quase indireta, de algumas dessas operações trazerem outras empresas especialmente nas áreas da construção e das engenharias: da área de projeto, de engenharia de águas e resíduos ligado ao ambiente, das engenharias na área da construção civil.
Falando da TAP, como que viu o episódio dos prémios atribuídos aos trabalhadores? O Governo disse ter havido uma quebra de confiança e depois, aparentemente, tudo se resolve como se não fosse nada?
Não sei se foi como se não fosse nada. Esse é o tema do senhor ministro das Infraestruturas e não queria meter a foice em seara alheia. Mas parece-me evidente que, pelo menos, a intervenção do Governo, e o trabalho dos jornalistas, gerou a necessidade de clarificação do regulamento de prémios. O Estado é acionista em 50%. Mas temos uma gestão privada da TAP. Acho normal que funcionem instrumentos de incentivo que façam com que a TAP prossiga os seus objetivos.
Por isso lhe dirijo a questão apesar de a tutela não ser sua.
A oferta da TAP não tem impacto apenas no turismo. A facilidade de fazer negócios também tem a ver com ligações diretas e com o rápido acesso. Essa possibilidade de clarificar os regulamentos e de escrutínio público, que é reforçado porque o Estado é um acionista importante (50%), ganhou-se neste caso.
O reconhecimento da importância estratégica que a TAP tem para a economia nacional reflete-se, por exemplo, numa ida ao aumento de capital da TAP?
Esse é um tema acionista de que a Secretaria de Estado da Internacionalização não participa. É um tema acompanhado pelo Ministério das Finanças e pelo meu colega das Infraestruturas. O que digo é que a TAP é um instrumento fundamental da internacionalização da economia portuguesa, quer para o setor do turismo quer para o setor dos bens.
O Governo pede à TAP para inaugurar linhas que são importantes para os objetivos de internacionalização da economia portuguesa?
O Governo é acionista e tem opinião no conselho de administração e na assembleia geral.
As vossas sugestões são tidas em conta?
Não acompanho os conselhos de administração da TAP. Não sei se sim ou não. Agora é evidente que a opção atlântica da TAP para o Brasil, para os Estados Unidos — recordo que a linha para São Francisco foi anunciada, o ano passado, pelo primeiro-ministro, em Nova Iorque — e para a costa ocidental africana são opções alinhadas com as grandes questões da diversificação da economia portuguesa. E recordo que na diversificação se inclui Estados Unidos e Canadá. Inclui-se seguramente a América Latina, falo em particular dos voos para o Brasil, e evidentemente a costa ocidental africana e a África lusófona, de língua portuguesa, como é o caso de Angola e de Moçambique. Não estamos à espera de ter na TAP um espelho das opções estratégicas da política de internacionalização. Aquilo é uma companhia aérea. Agora, essas grandes opções têm alinhamento connosco. E São Francisco é um caso evidente de ligação a Silicon Valley, quando Lisboa e o Porto (mas não só) se posicionam como Hubs de desenvolvimento de software e em particular de desenvolvendo do ecossistema de startups.
Não estamos à espera de ter na TAP um espelho das opções estratégicas da política de internacionalização. Aquilo é uma companhia aérea. Agora, essas grandes opções têm alinhamento connosco.
Claro que há regiões do globo em que começamos a ver aparecer empresas portuguesas. O lado oriental da África e devo dizer que países como Egito, Etiópia, mesmo o Uganda ou o Ruanda, mas em particular, a Etiópia e o Egito aparecem no radar como países importantes. É evidente que, na Ásia, o reforço das ligações na China, Japão e Coreia do Sul continuam a ser aspetos importantes. O Japão tem muitas leads [manifestações de interesse] de investimento. Este ano, o senhor primeiro-ministro recebeu uma grande delegação de empresários nipónicos, num daqueles tours onde muitas vezes escolhem um país para visitar de forma profunda. Portugal foi um dos países selecionados para 2019. Estão em preparação visitas, muito proximamente, ao Japão e à Coreia do Sul, acreditamos que no princípio de 2020. Acreditamos que ainda vai ser possível arranjar agenda, neste ano atribulado para o Japão que também tem a mudança de imperador e nós eleições.
Se planeiam visitas ao Japão e à Coreia no início de 2020 isso é assumir que o PS vencerá as eleições legislativas?
Japão e Coreia serão, acredito, independentemente de qualquer Governo. Porque vivo, governamentalmente, numa área de grande consenso político. A internacionalização é um grande consenso nacional, político. Não é uma área de confrontação, é uma área que tem tido resultados.
Desde o início da legislatura quanto investimento direto estrangeiro já entrou em Portugal?
O valor que tenho para junho de 2019 é o valor contratualizado pela Aicep que anda nos 2,7 mil milhões, sendo que temos, nesta altura, um pipeline — projetos decididos, mas que estão em processo de negociação de incentivos financeiros — aproximadamente de dois mil milhões de euros. Nesses 2,7 mil milhões contratualizámos umas 20 origens diferentes de capital. Posso somar a estes projetos outros que vieram para Portugal sem contratualização. Os casos mais conhecidos são a Google, Daimler Truks, Volkswagen e Cisco, que não tem contrato com o Estado. Tudo casos de empresas americanas, alemãs. Depois temos as leads, projetos que continuamos a negociar arduamente, que achamos poder ganhar. Temos leads de quase 20 países diferentes. Mas temos uma elevadíssima concentração de Estados Unidos, França e Alemanha.
Há alguma concentração em termos de setores de atividade?
Repartiria por três áreas, cerca de um terço cada: centros de engenharia, centros de serviços partilhados e indústria.
A semana passada ficámos a conhecer o estudo da EY sobre a atratividade de Portugal…
Não ficámos mal na fotografia.
Mas estamos menos atrativos do que no ano passado. Está preocupado com os sinais de abrandamento, por virtude do abrandamento da economia europeia, das guerras comerciais… isso já se sente?
Um membro do Governo que nunca está preocupado está no lugar errado. Isso seria uma irresponsabilidade. Evidentemente que é por isso que temos trabalhado na diversificação e continuamos a trabalhá-la percebendo que a União Europeia é o nosso principal mercado. Mas também temos de fazer diversificação dentro da UE. Temos uma realidade muito específica no Reino Unido nesta altura, devido ao Brexit.
Estamos a exportar mais e há mais empresas que exportam para o Reino Unido do que no dia em que se anunciou o Brexit.
Como está a correr?
Estamos a exportar mais e há mais empresas que exportam para o Reino Unido do que no dia em que se anunciou o Brexit. É estatística pura. Não são opções do Governo, mas das empresas. A nossa maior origem de capital estrangeiro, em 2018, foi o Reino Unido e, entre 2007 e 2018, captamos 1,7 mil milhões de IDE do Reino Unido — algum contratualizado pela Aicep, mas muito dele não foi contratualizado pela Aicep e muito é de natureza financeira com Special Purpuse Entities (SPE).
E para fora da União Europeia?
Continuamos a pensar fora da UE: África, América Latina, América do Norte e Ásia. Como é que este esforço se faz? Com Convenções para Evitar a Dupla Tributação (CDT) e Acordos de Promoção e Proteção Recíproca de Investimento (APPRI) para aumentar o grau de confiança. Desde o início da legislatura lançamos APPRI com nove Estados e concluímos dez CDT. Segundo, no setor agroalimentar abrimos em mais de 54 mercados, para mais de 200 novos produtos de origem animal e vegetal. O caso mais famoso é o porco na China. A seguir vem a uva de mesa, depois a pera e a maçã. Tal como temos de continuar no México, onde a Pera Rocha foi uma questão importante; no Brasil onde o leite e os laticínios continuam a ser uma questão muito presente, sobretudo para os laticínios dos Açores. Ainda não fechámos o dossiê, mas acredito que estamos muito mais perto de o fechar. Precisamos continuar a fazer este caminho, pois temos o objetivo de chegar a 50% do peso das exportações no PIB.
E vai ser possível?
Isso significa as exportações continuarem a crescer 2% a 2,5% acima do PIB em termos reais. A economia europeia está a crescer menos. Temos ganhado quota de mercado, em 2017 e 2018. Acredito que vamos continuar a ganhar quota de mercado em 2019. Todos os números indicam isso.
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