Pedro Nuno Santos promete que se o PS voltar a governar vai prolongar o ciclo de crescimento económico. Para isso é preciso criar parcerias entre Estado e privados, como no caso da ferrovia.
O ex-ministro e candidato à liderança do PS afirma, em entrevista ao ECO um dia antes do início das diretas do partido, que não é “tão obcecado” com a herança socialista mas tem orgulho dos resultados dos governos de António Costa, especialmente o crescimento económico e a criação de emprego.
Pedro Nuno Santos critica a direita por centrar a sua política económica “numa bala de prata, uma redução mágica do IRC que por magia faz a economia florescer”, contrapondo que uma estratégia de desenvolvimento económico tem de ir para lá da dimensão fiscal.
A internacionalização das empresas tem de ser uma prioridade, defende, não apenas com apoios às presenças nas feiras, mas também nas aquisições. Outra aposta reside no investimento na produção de conhecimento e, depois, na transferência desse conhecimento para as empresas. Em relação ao comércio externo, acredita que é necessário ter uma política focada no aumento da incorporação nacional nas exportações.
Vamos falar de economia e de políticas. Diz-se também herdeiro de António Costa. Parece que há aqui uma luta para saber quem é que é mais herdeiro…
Ah, não, eu não estou assim tão obcecado com isso. Obviamente tenho orgulho naquilo que fizemos.
Mas pergunto lhe qual é a herança que este Governo deixa? Vou dar três indicadores. O país está a empobrecer na riqueza por habitante há oito anos consecutivos e fomos ultrapassados em 2022, 2023 por países da Europa Leste.
Que países, já agora? É que eu já estou um bocado cansado dessa conversa e quando nós vamos a ver, somos ultrapassados por quem? Sabe?
Pela Letónia, pela Estónia…
Não é verdade.
Não é verdade?
Nós fomos ultrapassados por dois países.
E estamos em vias de este ano sermos ultrapassados pela Roménia…
Não sei se estamos.
Mas vou dar-lhe mais indicadores. A produtividade está estagnada no país, a pobreza aumentou em 2022, 17% da população em risco de pobreza, um valor superior a 2021. Os portugueses pagam uma carga fiscal recorde e os serviços públicos, nomeadamente na saúde e educação, são o que são. É esta a herança que quer levar à campanha?
Este é o retrato que faz. Os números quando são apresentados assim, não espelham a realidade portuguesa. Então, posso dizer o seguinte. Se estamos a falar de números, vamos falar de números. Nós temos um país que, ao longo da maioria deste período, cresceu acima da média europeia. Nós não podemos só escolher os factos que nos interessam.
Crescemos acima da média europeia porque os três países mais importantes da União Europeia estagnaram e, obviamente, com o peso que têm no conjunto puxaram a média…
Concluindo, Portugal esteve melhor que a média europeia. Essa é a conclusão que retiramos até do que acabou de dizer. Depois, ao longo destes últimos oito anos criamos mais 600 mil postos de trabalho.
Postos de trabalho destruídos de 2008 a 2017…
Exatamente, o que quer dizer que conseguimos que a economia portuguesa criasse mais 600 mil postos de trabalho. Podíamos ter ficado no mesmo estado em que estávamos em 2015, mas temos hoje um país que tem mais de 5 milhões de portugueses atualmente a trabalhar em Portugal.
Em cima disto, tínhamos uma economia que pagava 505 euros em salário mínimo em Portugal em 2015 e que vai pagar em janeiro 820 euros. Aumentou 62% desde 2015. O salário em Portugal, em 2022 e 2023, está a subir acima da taxa de inflação. Isto é, naquilo que verdadeiramente interessa, crescimento económico acima da média europeia.
Criou-se muito emprego ao longo destes anos, o salário mínimo subiu 62%. Os salários dos últimos dois anos estão a subir acima da taxa de inflação. Quando vamos aos serviços públicos, hoje temos uma grande pressão, nomeadamente sobre a saúde, e é uma pressão que não vai acabar tão cedo.
E sobre a educação também, embora diferente…
Também podemos ir à educação e às consequências das opções que foram tomadas no tempo da direita.
Mas para já falemos de economia, tem falado pouco de economia…
Como estava a dizer que isto foi um desastre, eu estava a dizer que não, não foi. A economia cresceu acima da média europeia. Gostávamos de crescer mais? Sim, mas não podemos ignorar que crescemos acima da média europeia, criámos emprego, os salários aumentaram.
Crescemos acima da média europeia, já discutimos porquê. O emprego foi recuperado, foram criados 600 mil postos de trabalho. Os 5 milhões de empregos e o número que nós tínhamos em 2008…
Já conseguimos lá chegar e vamos continuar a criar. Se o Partido Socialista continuar a governar, vamos continuar a fazer com que a economia continue a crescer e a criar emprego. Não vamos interromper este ciclo de crescimento económico e de criação de emprego. Porque se formos para projetos como os do PSD, da Iniciativa Liberal e do Chega, provavelmente não nos conseguem dar garantias que este ciclo que nós gostávamos que fosse mais intenso, mas que tem sido positivo, não seja interrompido.
Relativamente à pobreza, não podemos ter vistas curtas. Porque, em primeiro lugar, do ponto de vista global, a pobreza está mais baixa do que estava em 2015. Ponto. E aquilo que verdadeiramente interessa, e o António Costa, que dirige um jornal económico sabe muito bem disso, é a tendência. E a tendência desde que nós somos governo, é uma tendência de redução.
Agora, se pontualmente podemos ter uma subida, obviamente deve ser olhado para nós com atenção, mas não podemos perder de vista a tendência de redução da pobreza em Portugal desde que o Partido Socialista tomou posse em 2015. E depois também tentarmos perceber o que é que pode explicar o aumento da pobreza, que é essencialmente em Lisboa e nos Açores, que voltou a ser a região mais pobre do país.
E há, obviamente, fenómenos recentes que têm consequências do ponto de vista da pobreza, nomeadamente a emigração e a subida muito significativa dos preços na habitação. Agora, a pobreza em Portugal, e isto os portugueses sabem, é a mais baixa em 2023 do que era em 2015.
A direita tem uma bala de prata, ponto. Reduz quase a sua política económica a uma redução mágica do IRC que por magia faz a economia florescer.
Falou durante esta campanha que a sua preocupação era pôr a economia a crescer para pagar melhores salários. Como é que põe a economia a crescer? O Orçamento de Estado, que votou favoravelmente, tem uma previsão de crescimento de 1,5%.
A direita tem uma bala de prata, ponto. Reduz quase a sua política económica a uma redução mágica do IRC que por magia faz a economia florescer. Mas a estratégia de desenvolvimento económico é uma estratégia, vai para lá da dimensão fiscal, vai muito para lá da dimensão fiscal. E nós temos de ter uma estratégia que tenha como objetivo promover a mudança do perfil de especialização da economia portuguesa. E esse é o ponto crítico.
Nós só conseguiremos ter uma economia mais produtiva, que produz maior valor acrescentado, se conseguirmos migrar para setores de maior valor acrescentado. Isso implica uma estratégia que passa por ter que intervir em várias dimensões, desde logo na produção de conhecimento, na investigação e no desenvolvimento.
Continuamos com um investimento público em investigação e desenvolvimento que com níveis muito inferiores à média da OCDE e nenhum país conseguirá mudar o perfil da sua economia se não tiver um forte investimento na produção de conhecimento. Depois, na transferência desse conhecimento para as empresas, continuamos com algumas dificuldades na relação e na ligação entre a produção de conhecimento e as pequenas e médias empresas. Com as grandes, a situação já é diferente, mas com as pequenas e médias empresas ainda temos essa dificuldade.
E depois apoiar as nossas empresas para elas conseguirem incorporar inovação e apoiá-las na internacionalização. Não é apoiar só as exportações, é mais do que isso, é apoiar a presença das nossas empresas lá fora, nomeadamente com aquisições. Não só a presença nas feiras, precisamos de alterar o sistema de apoios porque ainda – mal na minha opinião –, os apoios, por exemplo a presença nas feiras estão a ser aprovados nas vésperas do ano em que elas se vão realizar.
As empresas precisam de planear com antecedência. Portanto, o sistema de apoios às empresas em Portugal tem que conseguir funcionar de forma mais ágil e mais rápida. Mas apoiar, como eu dizia, não só as exportações, mas a fixação, a aquisição de empresas no estrangeiro, a participação nas feiras e na promoção. Mais do que apoiar a exportação, apoiar a internacionalização das nossas empresas. Ao mesmo tempo que nós devemos apoiar também e ter uma política focada no aumento da incorporação nacional nas nossas exportações.
Nós temos estado focados nas vendas ao exterior sem levar em consideração qual é a incorporação de produção nacional nessas exportações. Não é a mesma coisa exportarmos o que estamos a importar, não é igual a haver incorporação nacional. E por isso que temos que ter políticas que sejam seletivas, porque obviamente as exportações com maior valor acrescentado em Portugal são mais interessantes para o país do que exportar por exportar.
Olhamos para o IAPMEI, e não paga a tempo e horas…
O IAPMEI precisa de uma volta muito grande. O AICEP e o IAPMEI não podem estar em ministérios diferentes. Nós temos que repensar o nosso sistema de incentivos. E depois há outra coisa que eu quero dizer a propósito do papel do Estado. O Estado não tem que substituir, não deve substituir, não é esse o seu papel, substituir as empresas, mas deve ser um parceiro e um parceiro muito importante.
Dou o exemplo do que estávamos a conseguir fazer na ferrovia, que temos de continuar. Porque é um setor que não tem presença na nossa economia. Não existia, já existiu no passado, com a Sorefame na Amadora, e é um setor que está em forte crescimento em toda a Europa. Todos os países vão comprar comboios. E é um setor com maior valor acrescentado, por exemplo, do que o setor automóvel, com predominância na nossa economia.
E é muito importante que nós consigamos ajudar muitas pequenas e médias empresas em Portugal, que trabalham e fornecem o setor automóvel a conseguirem trabalhar e fornecer para o setor ferroviário. Uma das coisas que nós fizemos não vou agora descrever toda a nossa estratégia, mas uma das coisas que nós fizemos foi a criação de um centro de competências ferroviário que junta mais de 100 empresas privadas, os operadores públicos e a academia, nomeadamente a Universidade do Porto.
Junta estes três atores que depois constituíram um centro de competências, onde se faz formação, tem uma incubadora de empresas do setor ferroviário e faz investigação e desenvolvimento na área da indústria ferroviária. E esta é uma forma de nós tentarmos juntar quem produz conhecimento, juntar as empresas privadas, juntar já agora as empresas que são públicas e pô-las a trabalhar em conjunto para ajudarmos estas mais de 100 empresas a conseguir trabalhar para um setor ferroviário, não só nacional, mas amanhã estarem a fornecer.
No setor ferroviário, um dos eixos é seguramente o PRR. Mas neste, como noutros, a execução tem sido muito atrasada…
É verdade e temos de perceber porquê.
Sabe quanto é que chegou às empresas?
Já chegou bastante, já chegou muito dinheiro.
Mil milhões de euros, de um total de quase 5 mil milhões.
Mas temos que perceber os ciclos de investimento, porque no início de qualquer projeto, é um início de preparação, de elaboração do projeto, de desenvolvimento. O grosso da execução é na segunda metade do período. É assim, seja no investimento público, seja no de empresas. Nós achamos que vamos vendo uma execução constante ao longo dos anos, mas não.
É agora que vai ser?
Não é agora que vai ser. Tem a ver com a natureza do investimento, todo o investimento numa empresa ou num país. As pessoas, quando falam, também têm que saber. Quando lançamos um projeto de uma obra pública, os primeiros anos não são anos de forte execução do ponto de vista financeiro, porque se está a fazer concursos, está-se a fazer um projeto.
É quando chegamos à fase de empreitada, propriamente dita, que a explosão na execução financeira acontece e também acontece o mesmo no investimento privado. No caso do PRR, um dos projetos é um comboio português e esse é um consórcio que junta 13 empresas. Neste momento já apresentaram o projeto de comboio numa feira recente em Madrid e o processo está a andar bem, e como esse, muitos outros projetos.
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“O Estado não tem que substituir as empresas, mas deve ser um parceiro muito importante”
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