A ambientalista Ângela Morgado diz que as faturas mais caras de energia são compensadas pela ausência de consumo de combustíveis, passes de transportes, refeições fora de casa e compras por impulso.
Circulam petições online para que as empresas não cobrem luz e gás neste momento em que as famílias se encontram fechadas em casa e o consumo energético tende a aumentar — pelo menos mais 20%, estima a defesa do consumidor. O setor da energia confirma que o segmento doméstico está a gastar mais, e que as faturas vão subir muito em breve, mas as empresas estão impedidas pela ERSE de efetuar cortes ao fornecimento e falam em “oportunismo”: por causa disso, já há consumidores que estão a aproveitar para não pagar as faturas da luz e do gás.
Ângela Morgado, diretora executiva da ANP|WWF, defende que o pagamento de serviços básicos como a eletricidade e o gás não só é justo como necessário para travar consumos excessivos de energia e promover a eficiência em nome do ambiente. Por isso, em vez de energia à borla, a ambientalista diz que a quarentena “pode ser a altura ideal para fazer uma simulação dos gastos energéticos em sua casa, mudar para uma tarifa 100% verde ou para tarifa bi ou tri-horária”.
Consideram que serviços básicos como a luz e o gás deviam ser oferecidos?
Compreendemos que estes consumos são fora do hábito das famílias, mas é um serviço que está a ser prestado e que deve continuar a ser pago pelos utilizadores, até para que haja uma auto-regulação dos consumos. É muito provável que o que é gasto neste contexto esteja a ser poupado pela ausência de consumo de combustíveis, passes de transportes, refeições fora de casa (que são sempre mais caras que as caseiras), compras por impulso, desporto e lazer, entre outros gastos que agora não existirão.
Que dicas de poupança e eficiência energética deixam para as pessoas que estão em casa em isolamento social?
Esta poderá ser a altura ideal para fazer uma simulação dos gastos energéticos em sua casa, mudar para uma tarifa 100% verde ou para tarifa bi ou tri-horária. Ainda, poderá verificar se há janelas ou frinchas que permitam a entrada do vento, devendo estas ser isoladas para manter o calor de aquecimentos. Durante o isolamento, mantêm-se as regras que se devem aplicar no resto do ano: abrir os estores ao acordar, para não ser necessário ligar a luz; desligar todos os aparelhos não necessários das tomadas (as luzes em stand-by e carregadores nas tomadas sem estar em utilização consomem eletricidade); desligar as luzes sempre que sair de uma divisão; substituir lâmpadas incandescentes por lâmpadas LED ou economizadoras; à noite, procurar ter luzes de leitura ligadas em vez de todos os candeeiros de teto.
Fechadas em casa as famílias gastam mais água, mais eletricidade e mais gás. Como podem poupar na carteira e no ambiente?
Evitar lavar louça à mão: a maioria das máquinas de lavar louça têm já um nível de eficiência que permite poupar mais água por lavagem se se utilizar apenas a máquina. Uma vez que a máquina fica cheia mais depressa, não passe a louça por água antes de a colocar na máquina – raspe bem todos os restos para o lixo e coloque diretamente. Nos banhos, porque não criar um jogo com as crianças? Durante uma semana contabilizam o tempo de banho de cada um com um cronómetro, e no final, quem tiver tomado os banhos mais curtos ganha um prémio. Ainda no banho, fechem a torneira enquanto se ensaboam – usam apenas a água para enxaguar.
Podem ainda recolher a água que sai da torneira enquanto esperam que a água aqueça e usá-la para cozinhar, para regar plantas ou para encher o depósito do autoclismo, caso seja externo. Este é também um bom momento para colocar uma garrafa cheia (com terra, areia, pedras, ou até mesmo água) dentro do tanque do autoclismo, reduzindo assim a água disponível em cada descarga. Estima-se que em Portugal 60% do consumo de água doméstico aconteça nestas descargas e durante o duche. Não esquecer de fechar sempre a água enquanto se escova os dentes – ou usar um copo, em alternativa.
Mais tempo em casa é igual a mais lixo e resíduos. O esforço de reciclagem deve ser maior?
Acima de tudo, devem lembrar-se da ordem dos R’s:
1. Repensar – Têm tempo em mãos? Este é o momento ideal para repensarem a vossa casa, o vosso consumo e o que realmente precisam. Comecem por perceber a quantidade de lixo que produzem e – mais importante – que tipo de lixo é. Desafiamos todos a perceber o que deitam fora todos os dias e a pensar em formas de minimizar esse lixo. E será que é mesmo lixo?
2. Recusar – Agora que estamos mais tempo em casa e que o espaço é mais limitado, é altura de recusar tudo o que consideramos desnecessário: aquela promoção no supermercado que nos obriga a armazenar bens supérfluos, os panfletos que vão diretos para a reciclagem, as amostras de produtos que nunca iremos usar, basicamente tudo o que não precisamos.
3. Reduzir – Com a recusa também vem a redução. Sabemos que temos de criar espaço em casa para armazenar comida e alguns bens essenciais, por forma a minimizar as saídas para compras. Porque não então apostar em bens que durem mais tempo e que reduzam a quantidade de resíduos que deitamos fora? Pilhas reutilizáveis são um excelente exemplo. Reduzam também o vosso consumo de água e energia – a carteira agradece.
4. Reparar – Já pensaram em aproveitar parte do vosso tempo a reparar roupas e bens que estejam danificados, prolongando-lhes a vida e reduzindo o vosso consumo? Podem ainda passar em revista as roupas que já não querem, deixando artigos de boa qualidade ficar e pensando se podem ser alterados para os tornar mais atuais.
5. Reintegrar – Aquela jarra que nunca usam pode ser dada como presente à avó? O casaco que afinal não serve cabe à minha amiga? Aquele cântaro da tetravó até fica giro como decoração? Encontrem um novo uso para objetos velhos, e tragam vida ao que têm em casa.
6. Reutilizar – Pensem: o que podemos reutilizar? Frascos de vidro para armazenar grãos e cereais secos? Copos de iogurte para fazer jogos durante o isolamento? Cartões de caixas para fazer posters? Reutilizar é uma forma de prolongar o uso de um bem que foi produzido – e previne que se produzam novos bens.
7. Reciclar – Tudo o que não cabe na lista ou que já não esteja em condições de ser usado, deve ser colocado no ponto de reciclagem adequado. Se têm duvidas de qual será, espreitem a aplicação Wasteapp. Tenham em conta que poderá haver alterações ao horário habitual de recolha de resíduos.
Quem tem ecopontos mais longe de casa, como faz?
Aproveitem as saídas para ir às compras e tracem o vosso percurso por forma a passar por um ecoponto no caminho. Caso isto seja impossível, lavem bem as embalagens que continham alimentos, espalmem-nas e empilhem. Esta é uma forma interessante de perceberem quanto dos bens que consomem estão embalados e que poderiam ser substituídos por alternativas com menos embalagens.
Que dicas de consumo sustentável deixam para quem está em casa?
Aproveitem o tempo em casa para cancelar todas as contas em papel que ainda possam ter e tornar tudo digital. Procurem em lojas online soluções de embalagens reutilizáveis que se possam adequar ao vosso estilo de vida e que simultaneamente reduzam o uso de embalagens de uso único: quando recomeçar a escola, podem enviar as bolachas das crianças num tupperware pequeno em vez de pacotes individuais? Usar papel de cera de abelha para tapar comida em vez de película aderente, que não é reciclável? E porque não usar sacos de silicone reutilizáveis nos snacks, em vez de sacos de ziplock de uso único?
Reduzam o consumo de carne, procurando novas receitas com vegetais – desta forma conseguirão equilibrar melhor o orçamento familiar. Estejam atentos ao tamanho do peixe que compram, evitando peixe de tamanhos pequenos. Procurem sempre produtos certificados, garantindo que as melhores práticas de sustentabilidade são aplicadas. Comprem biológico, sazonal, local, e em pequeno comércio: mais do que nunca, as pequenas empresas precisam do nosso apoio. A maioria delas enfrentará uma enorme recessão quando tudo passar.
É mais difícil agora optar por comprar produtos a granel e reduzir as embalagens?
Muitos supermercados têm já secções de venda a granel, pelo que poderão optar por estes locais para as vossas compras, assim evitando ter de comprar produtos embalados. Não há até ao momento evidências do vírus se transmitir através de alimentos, pelo que sempre que considerarem seguro, levem frascos ou caixas e armazenem os produtos em embalagens trazidas de casa (mesmo a carne, o peixe, o fiambre ou o queijo). Quando compram produtos embalados, estejam atentos aos prazos e prefiram prazos de maior validade, minimizando assim o desperdício alimentar.
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Quarentena “é a altura ideal para fazer uma simulação dos gastos energéticos em casa”
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