A presidente do Conselho das Finanças Públicas destaca bom momento da economia, mas alerta para subida da despesa e para o impacto da escalada protecionista.
A presidente do Conselho das Finanças Públicas assinala a resiliência da economia portuguesa face aos desafios externos, mas alerta para riscos significativos, nomeadamente perante a escalada protecionista. Em entrevista ao ECO, Nazaré da Costa Cabral acredita que as tensões comerciais podem levar ao recrudescimento da tensão inflacionista e que Portugal pode sofrer efeitos por via indireta, sobretudo devido à exposição à Alemanha.
“Um dos receios que tenho é que podemos vir a assistir a um aumento da taxa de desemprego. Se porventura a produção alemã for afetada, se houver algumas disrupções ao nível dessa produção industrial, não descarto que isso não possa afetar também as indústrias aqui em Portugal”, afirma.
A responsável do CFP revela apreensão face à trajetória de certa despesa pública, apela a um exercício urgente de revisão da despesa no Serviço Nacional de Saúde (SNS) perante uma situação que considera ser “insustentável”, e admite que ficará satisfeita se execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) rondar os 90%.
Mostra-se a favor de um aumento do investimento em defesa, se contribuir para desenvolvimento da indústria em Portugal, mas revela alguma perplexidade perante a sugestão de Bruxelas de flexibilização das regras orçamentais.
A economia cresceu 1,9% no ano passado, com o desempenho do último trimestre a ser melhor do que o esperado. O efeito de arrastamento permite um melhor ponto de partida para este ano. Podemos estar confiantes na estimativa de 2,1% do Governo?
Tivemos um comportamento da economia melhor do que o esperado no final do ano. A economia em cadeia cresceu 1,5% e isso criou de facto tal efeito de arrastamento para o ano 2025, de 1,3%. Se o crescimento fosse nulo nos demais trimestres do ano, esse crescimento já estaria como garantido.
O CFP já havia projetado em setembro uma taxa de crescimento para este ano de 2,4%. Neste momento estamos a trabalhar no novo cenário, que vamos publicar em abril. Há dois aspetos a salientar, que de alguma maneira explicam este bom desempenho da economia no final de 2024, princípio de 2025.
Por um lado, o comportamento da procura interna, particularmente do consumo privado, que foi muito impulsionado pelas medidas de política económica que foram adotadas, nomeadamente ao nível das pensões e do IRS. Isso libertou rendimento para as famílias, o que potenciou consumo também nessa fase do ano. Ainda do lado da procura interna houve uma certa aceleração do próprio Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e do investimento associado.
E na componente externa?
Não obstante estarmos num período bastante crítico e que nos suscita uma série de riscos para o futuro, a dimensão externa também foi favorável. A economia portuguesa apresentou um excedente externo em 2024 de 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Estamos a revelar alguma resiliência, por exemplo, no sentido de obtenção de alguns ganhos de quota de mercado.
O que é importante na medida em que nos torna, de alguma maneira, menos dependentes das dinâmicas da procura externa e está de certa forma a acontecer tanto ao nível dos serviços como da exportação de bens. A própria diversificação da economia parece-me um aspeto crucial.
Ou seja, sabemos que ainda estamos muito concentrados na exportação de serviços de turismo, mas ao nível dos bens temos um panorama de diversificação maior. É importante, porque estamos menos expostos a choques económicos negativos. Sabemos lidar melhor com eles quando a economia é mais diversificada, assenta em vários setores e não está tão concentrada na produção num só.
Dito isto, existem riscos sérios para a economia portuguesa e advêm sobretudo de duas dimensões. Uma é a dimensão internacional. O facto de estarmos num contexto internacional de grande mudança.
As tarifas e a política comercial dos Estados Unidos são um risco acrescido para a economia?
Creio que sim. Esse é um aspeto importante. Quando pensamos na escalada protecionista que está em curso por força das medidas que já foram anunciadas pela Administração Trump, no sentido, por exemplo, de tributar 10% as exportações europeias para os Estados Unidos, é evidente que isso tem canais de transmissão. Podem afetar claramente a economia europeia no seu todo e portuguesa em particular.
Desde logo ao nível do volume das trocas comerciais. Sabemos que isso pode determinar de imediato uma quebra importante das exportações da Europa para os Estados Unidos. Por outro lado, o agravamento de todas estas tarifas pode determinar um aumento dos preços dos produtos.

Podemos estar aqui perante um novo foco? Podem reacender a inflação?
Podemos. Creio que sim e que esse é um risco, aliás, significativo. Até porque o choque inflacionário que sofremos por força da crise energética que tivemos em 2022 não está ainda completamente debelado. Esta escalada protecionista, que depois pode envolver medidas de retaliação, pode contribuir para o recrudescimento dessa tensão inflacionista.
E pode determinar uma alteração da própria política monetária com custos para a Europa. O Banco Central Europeu, que neste momento iniciou uma trajetória de alívio nas taxas de juro, pode suster essa redução e até pode revertê-la.
Esta escalada protecionista, que depois pode envolver medidas de retaliação, pode contribuir para o recrudescimento dessa tensão inflacionista.
Voltar a subir as taxas de juro?
Isso é uma hipótese. Penso que não está neste momento em cima da mesa, mas nunca poderemos afastá-la. Ou seja, esta ideia de que o Banco Central se veja obrigado a reagir novamente, quer através das taxas de juro e depois também da própria taxa de câmbio do euro com tudo o que isso implicaria em termos de perda de competitividade para a economia europeia.
Por outro lado, Portugal em si não é das economias mais expostas à procura final dos Estados.
Mas poderá ter consequências por via indireta.
Indiretamente, exatamente. Produzimos no contexto das cadeias de produção onde estamos inseridos, sobretudo de componentes de bens em áreas como um setor automóvel, maquinarias. Ou seja, fornecemos bens intermédios por exemplo para a Alemanha que, por sua vez, exporta os bens finais para os Estados Unidos.
Se houver aqui obstáculos acrescidos às trocas comerciais entre estas duas economias, indiretamente poderemos vir a ser também prejudicados. Por outro lado, há uma segunda dimensão que queria destacar, é a própria debilidade neste momento da economia alemã.
Um dos receios que tenho é que podemos vir a assistir a um aumento da taxa de desemprego. Se porventura a produção alemã for afetada, se houver algumas disrupções ao nível dessa produção industrial, não descarto que isso não possa afetar também as indústrias aqui em Portugal.
Que continuou em recessão em 2024.
Tem vindo a sofrer taxas de crescimento negativo nos últimos dois anos e não sabemos como é que as coisas agora ficaram com a alteração do Governo, mas seja como for as perspetivas não são completamente favoráveis, não são fantásticas. O que significa que a Alemanha está numa situação difícil do ponto de vista da resposta a este choque.
Na verdade, é um choque económico que a Alemanha está a sofrer, o de ser capaz de enfrentar a transição digital e a transição ambiental ombreando com os seus concorrentes mais diretos – a China e os próprios Estados Unidos. O que significa que nós como economia aberta, muito dependente da Alemanha, estamos naturalmente muito expostos e isso pode, evidentemente, ter um efeito.
Aliás, um dos receios que tenho é que podemos vir a assistir a um aumento da taxa de desemprego. Se, porventura, a produção alemã for afetada, se houver aqui algumas disrupções ao nível dessa produção industrial, não descarto que isso não possa afetar também as indústrias aqui em Portugal.

Enquanto a economia europeia abranda e as principais economias têm taxas de crescimento reduzidas, Portugal e Espanha têm brilhado. Como é que olha para esta fotografia?
Neste momento, a Península Ibérica apresenta um elemento de resistência e de resiliência acrescido. É evidente que é favorável e é positivo, traduzido desde logo na melhoria daqueles indicadores que mencionava na componente externa, por exemplo, também ao nível da redução da dívida externa, da redução da posição de investimento internacional, que apesar de ser -58,3% do PIB, é de certa forma notável face aquilo que é o histórico das últimas décadas.
É um dado salutar, mas acho que é evidente que estamos sempre muito dependentes do contexto externo.
Recordemos que a Europa tem, por exemplo, uma guerra às suas portas…
A Europa vive um problema difícil de afirmação e não apenas no plano económico. Um problema que pode ser sério enquanto modelo de integração política. Por um lado, neste contexto de guerra e de uma nova atitude norte-americana perante a Ucrânia. Por outro lado, a forma como a Europa se posiciona nesta luta de titãs em termos globais, que é a luta que envolve os Estados Unidos e a China pelo acesso a matérias-primas, a rotas comerciais, a novas terras, terras raras, pelo acesso a dados, à informação.
Há uma dificuldade da Europa neste momento em posicionar-se perante essa luta. Por um lado, tem a sua ligação histórica transatlântica, mas por outro há a necessidade de aproveitar as oportunidades que a China, enquanto novo bloco comercial, oferece.
Depois, outro problema e perante a nova postura norte-americana é o posicionamento da Europa perante o conflito na Ucrânia. Nesta matéria, temos vindo a assistir a um certo voluntarismo da Europa.
Vamos agora defender-nos porque existe essa urgência do reforço da defesa da segurança, mas ao mesmo tempo existe todo um conjunto de fraquezas e de dissonâncias na própria Europa. A Europa não é uma voz.
Vamos agora defender-nos porque existe essa urgência do reforço da defesa da segurança, mas ao mesmo tempo existe todo um conjunto de fraquezas e de dissonâncias na própria Europa. A Europa não é uma voz.
E não fala a uma só voz.
Existe uma dissonância de vozes. Esta ideia de federalizar a defesa parece uma ideia muito utópica. Quando temos uma Hungria com posicionamento diferente em relação à Rússia, quando temos diferentes posições em relação à entrada da Ucrânia quer na NATO, quer na própria União Europeia… temos uma Europa que parece bastante fragmentada.
Isso é percebido pelos outros interlocutores e fragiliza a Europa enquanto interlocutor internacional. Veja-se o que está a acontecer às instituições europeias de ficarem de fora do processo de negociação de paz que alegadamente estará para breve na Ucrânia. Isto é um aspeto grave, sério que que afeta a própria identidade e a própria.

Em relação às finanças públicas. O Governo tem optado por uma estratégia de deixar excedente orçamental para “não pôr em causa o investimento” nos serviços públicos. Considera que esta é uma estratégia adequada?
Temos a perspetiva de estimativa de excedente para o ano 2024. Ainda não está fechada – nós próprios estamos a trabalhar no fecho dessa estimativa –, mas em setembro projetámos um excedente de 0,6%/0,7% do PIB e não cremos que deva afastar-se muito destes valores. Para 2025, a perspetiva é de manutenção desse excedente e, nas nossas projeções, na ordem dos 0,4% do PIB.
Não são fenomenais, mas são excedentes e isso é um aspeto que deve ser realçado. Não devemos ter medo de dizer que o equilíbrio orçamental é um objetivo salutar de finanças públicas e que deve ser sempre preservado. Evidentemente que há contextos de recessão e é por isso que é importante que nos anos bons da economia, como é o que estamos agora a atravessar, existam excedentes que depois devem ser usados e aproveitados, por exemplo, para diminuir o rácio da dívida no produto.
Esse é um rácio ainda muito elevado. Não obstante os progressos que têm sido feitos, ainda se fixa acima dos 90% do PIB e está ainda muito longe das metas do Tratado da União Europeia. Para todos os efeitos, continuamos a ser um país altamente endividado e que tem todo o interesse em aproveitar os excedentes orçamentais numa estratégia de continuidade, de redução da nossa dívida pública no produto.
É nesse quadro que se deve fazer a gestão da política orçamental e da orientação dessa política orçamental. Não vejo neste momento razões para que ela seja uma política excessivamente expansionista. Portugal está neste momento a beneficiar do PRR e, portanto, o Estado deve aproveitar esse estímulo orçamental para incrementar o potencial de crescimento da economia portuguesa, porque é disso que virá a capacidade de gerar futuros equilíbrios orçamentais.
Não devemos ter medo de dizer que o equilíbrio orçamental é um objetivo salutar de finanças públicas e que deve ser sempre preservado.
Falando do PRR e da sua reprogramação, podemos vir a assistir ao que acontece muitas vezes com outros fundos comunitários em que, no final do prazo, começamos a aplicar o dinheiro em ‘tudo e mais alguma coisa’ só para o gastar?
Essa é uma chamada de atenção que tenho feito em alguns momentos. Gostaria muito que o PRR fosse um instrumento motor e de reconversão tecnológica e estrutural da economia portuguesa. Creio que neste momento esta reprogramação, que está em curso, resulta de uma necessidade pragmática.
Perante a verificação de que não era possível usar atempadamente esses fundos num determinado tipo de despesa que levaria mais tempo a realizar-se, o Governo optou por alocar a outras áreas de despesa onde está convencido que terá condições para executar.
Resta saber, evidentemente, se servirá para aqueles que são os objetivos. Essa será outra discussão que no final ter-se-á de fazer, que é de avaliar até que ponto o PRR foi de facto um instrumento efetivo de transformação estrutural da economia portuguesa.
Dada a reprogramação, acredita que a execução do PRR chegará a bom porto?
Não tenho indicadores em sentido contrário. Aquilo que nos é dito é que feito desta forma a despesa realizar-se-á. Uma parte dela em 2026 até com recurso a empréstimos. Isso também terá naturalmente algum impacto a nível do saldo. Mas quero crer que sim, quero crer que será possível de executar.
Agora, é evidente, nós próprios, nas projeções que fazemos, tendo em conta aquilo que é o histórico de execução tradicional dos fundos europeus, não chegamos a admitir uma execução a 100%. Mas se puder estar em torno dos 90% já será um bom registo.
Tendo em conta aquilo que é o histórico de execução tradicional dos fundos europeus, não chegamos a admitir uma execução a 100%. Mas se puder estar em torno dos 90% já será um bom registo.
Considera que é uma estratégia adequada para as finanças públicas se o Governo aumentar a utilização dos empréstimos ou utilizar até a sua totalidade?
Tenho pena que a Comissão Europeia quando fez o financiamento através da emissão de obrigações sociais, para financiar justamente os custos do Next Generation, não tenha ido mais além para permitir, justamente, que as subvenções aos Estados pudessem até ser maiores do que aquelas que acabaram por ser.
Mas isso foi um momento que se perdeu naturalmente. Também ninguém, nessa altura, estaria porventura à espera que sofreríamos um choque inflacionário e que, portanto, as políticas monetárias em termos globais se alterassem. É evidente que esta é uma estratégia de financiamento que aproveita, apesar de tudo, o facto de, não obstante a subida das taxas de juro, a vantagem de termos custos de financiamento moderados.
Mas a partir de 2026 começa a pesar.
É evidente. Isso terá um impacto sobre o saldo para o Estado, sobre os encargos correntes da dívida e terá um impacto também ao nível da dívida pública.
Na avaliação que o CFP faz do plano orçamental de médio prazo estima que a despesa líquida entre 2025 e 2028 seja superior à prevista pelo Governo. Em que medida é uma preocupação?
É uma preocupação, até porque temos neste momento um conjunto de novas pressões sobre a despesa e que são muito fortes. Não obstante o desempenho favorável do ponto de vista orçamental que se perspetiva mesmo para este ano, tenho algumas preocupações em relação à trajetória de certa despesa pública, nomeadamente alguma despesa corrente que sofreu um aumento muito significativo, sobretudo em áreas particulares.
Não posso deixar de referir a área da saúde, no Serviço Nacional de Saúde (SNS). É uma área que para mim é sempre muito problemática, porque tem havido sempre uma aceleração no crescimento da despesa. Por outro lado, o ano passado tivemos um aumento da despesa no SNS na ordem dos 9% e ainda nem estamos a considerar as valorizações ao nível da carreira médica e da carreira dos enfermeiros.
Contando com todas as medidas que foram adotadas – a dedicação plena dos profissionais de saúde, os novos centros de responsabilidade integrada, a criação de uma nova carreira de técnico auxiliar, as medidas de compensação, por exemplo, pelas urgências que os médicos realizam – determinou só em despesa com pessoal um aumento de 12%.
É incomportável, é insustentável manter uma situação destas para futuro. A perspetiva de admitir que possa continuar deve merecer toda a atenção.
A despesa com pessoal do SNS teve aumento de 12%. É incomportável, é insustentável manter uma situação destas para futuro.
É má gestão?
Há um aspeto que tem de ser observado que é como é que está organizado o sistema. Evidentemente têm de ser adotadas medidas urgentes no sentido de melhorar e de identificar formas de obtenção de poupança de despesa. Sabemos que o Governo está a trabalhar no desenvolvimento de instrumentos ao nível de revisão da despesa.
É aqui que um exercício de revisão é fundamental?
Um exercício sério e urgente de revisão da despesa ao nível do SNS parece-me fulcral. Com uma população cada vez mais envelhecida – a força da demografia aqui é imparável – não podemos contornar isto se não houver medidas que olhem para o sistema, identificar desperdícios, que eles existem, e ter também alguma coragem política de adotar medidas que são necessárias em determinados segmentos da gestão do sistema.
A juntar a isto temos uma nova pressão, que é pressão que vem do lado da defesa.

De que forma é que Portugal conseguirá responder a esse desafio de aumentar o investimento na defesa?
Aquilo que está neste momento em cima da mesa também devo dizer que me deixa algumas preocupações. Tínhamos um compromisso perante a NATO de atingir os 2% do PIB em despesa com defesa. Neste momento, a nossa despesa ronda os 1,5% do PIB. Nos últimos tempos já se vem falando na perspetiva de atingirmos 3,5% do PIB e esta seria, de facto, uma alteração extraordinária, absolutamente colossal.
Basta pensar que os Estados Unidos, em termos médios, gastam em despesa com defesa 3,3% do seu PIB. Teríamos ainda que ir além deste valor. É evidente que isto cria aqui algumas interrogações sobre qual possa vir a ser o impacto de um crescimento nesta ordem de grandeza, quer para o crescimento da despesa pública, para a deterioração do saldo e depois ao nível do impacto da dívida, porque isto teria de ser financiado.
Mas temos de olhar para as coisas numa dupla perspetiva. Pessoalmente, vejo com bons olhos que se possa investir na indústria da defesa. Não apenas pela importância que isso possa ter em termos de reforço da nossa capacidade de defesa e promoção da nossa segurança, mas também porque a indústria da defesa tende a ser um bom motor de crescimento económico se houver efeitos de contágio para outras áreas que são críticas.
Por exemplo, a das telecomunicações, da aeronáutica. Se for bem orientada isto pode ser positivo para o aumento do potencial de crescimento da economia portuguesa. Agora, se o que está aqui em causa é aumentarmos a nossa despesa, para adquirir ao exterior, para importar material bélico, munições, mísseis, artilharia, e desde logo em relação aos Estados Unidos que é o grande fornecedor deste material, aí teremos de olhar não apenas para o impacto que pode ter para as contas públicas, mas para as contas externas.
O financiamento da defesa é um tema que tem estado em cima da mesa na União Europeia. Têm sido apresentadas algumas ideias, como a flexibilização das regras orçamentais ou a emissão de dívida comum, à semelhança do que foi feito para o PRR. Como é que avalia estas opções?
Em relação à flexibilização das regras orçamentais, devo dizer que fico um pouco perplexa. Estas regras acabaram de entrar em vigor e já estamos a abrir aqui um flanco de exceção, que me parece que me parece preocupante no sentido da estabilização do novo modelo que foi criado. Por outro lado, mesmo que haja uma exceção ao nível dos tais limites da despesa líquida, não nos podemos esquecer que há a dívida.
Que tem de ser paga.
Que tem de ser paga. É um passivo que fica ali sobre o Estado, que vai ter de honrar mais cedo ou mais tarde e com custos futuros para os contribuintes. Esse ponto não deixa de estar em cima da mesa.
Relativamente à perspetiva da federalização da defesa, não apenas com a criação de competências novas a este nível, mas depois ao nível também de termos um fundo comum para financiar o esforço de defesa que cada Estado-membro vai fazer, isso pode ser uma via para no imediato, pelo menos, aliviar um pouco o pouco esforço orçamental por parte de cada Estado individualmente considerado. Mas não é líquido que esse esforço no futuro seja aliviado.
É uma discussão que me parece que está bastante atrasada. A partir de 2028, a Europa vai ter de começar, no fundo, a desembolsar para pagar a dívida que assumiu para pagar as obrigações que emitiu. Como é que isto vai ser pago?
Porque os Estados depois podem ter de aumentar as contribuições nacionais para o orçamento comunitário?
Ora bem. No âmbito do sistema de recursos próprios, a Comissão Europeia pode ter de determinar o aumento das transferências que os Estados fazem para o orçamento europeu, justamente para fazer face aos custos e aos encargos decorrentes do pagamento de todas as despesas. Porque a própria Comissão Europeia ter-se-ia que financiar para suportar estes custos.
Tal como se financiou para o PRR e agora se começa a discutir como é que vai ter capacidade para pagar essa dívida.
Exatamente. Essa é uma discussão que me parece que está, aliás, bastante atrasada. A partir de 2028, a Europa vai ter de começar, no fundo, a desembolsar para pagar a dívida que assumiu para pagar as obrigações que emitiu. Como é que isto vai ser pago?
Quais vão ser os recursos, os impostos? Como é que vai ser distribuído o esforço financeiro pelos países da União Europeia para justamente fazer face a esta exigência de pagamento que se vai colocar?
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“Tenho algumas preocupações em relação à trajetória de certa despesa pública”
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