Licenciaturas em gestão e economia com médias recorde e vagas em vias de extinção

As candidaturas aos cursos de economia e gestão dispararam e as médias bateram recordes. Os estudantes querem melhores escolas e, acima de tudo, cursos que assegurem o futuro, dizem os responsáveis.

Médias de entrada acima dos 17 valores e vagas inexistentes para a 2.ª fase de acesso ao ensino superior. Este ano, a procura por licenciaturas em economia e gestão aumentou significativamente e as notas dos últimos alunos colocados nestes cursos bateram recordes.

O média do exame nacional de Matemática A, mais alta este ano, contribuiu para o aumento dos números, mas as universidades apontam outras razões: a vontade de apostar em áreas com maior empregabilidade, a crise causada pela pandemia, a maior consciencialização dos estudantes sobre a necessidade de melhores gestores e decisores no futuro e, ainda, a impossibilidade de estudarem no estrangeiro.

Nas universidades Nova SBE, Católica-Lisbon, ISCTE, ISEG e FEUP, no Porto, a média conjunta de entrada fixou-se nos 17,4. Apesar de o Governo ter anunciado mais 4.700 vagas para o ensino superior para este ano letivo, nenhuma destas universidades tem vagas adicionais para a 2.ª fase de acesso ao ensino superior.

Na Católica Lisbon School of Business & Economics, só foram aceites alunos com nota mínima de candidatura de 17,6 nas licenciaturas de economia e gestão e a procura aumentou 60%. Foram admitidos mais de 100 alunos com médias de candidatura superiores a 18 valores e mais de 25 alunos com médias superiores a 19,0 valores, informou a universidade em comunicado.

Além da subida significativa das notas dos últimos alunos colocados, não há vagas sobrantes para a segunda fase de candidaturas. Esse cenário só será possível, explica Filipa Luz, diretora de admissões da Nova SBE, se os estudantes da 1.ª fase não efetivarem as matrículas. Com as vagas extra anunciadas pelo Governo, a Nova SBE subiu o número de lugares da licenciatura em economia, de 195 para 254, e, no caso do curso de gestão, de 195 para 265 vagas.

Para Filipa Luz, o fenómeno deve-se principalmente à subida da média do exame nacional de Matemática A, que aumentou 1,8 valores este ano, e também à reputação da escola. Mas na Nova SBE, o recorde não se ficou só pelas licenciaturas. Este ano, a universidade registou um número recorde de 3.000 candidaturas aos mestrados, com grande destaque para o mestrado internacional em gestão, que registou mais 80% de procura.

Jogar pelo seguro num futuro incerto

A reputação das escolas parece ser outro dos fatores apontados pelas universidades para o aumento da procura destes cursos.

“O que é específico dos cursos da área da economia e da gestão é que têm tradicionalmente uma forte atratividade, e penso que se deve à qualidade da formação que o sistema universitário público oferece nestas áreas e que é percebida pelos candidatos como tal“, defende José Varejão, diretor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto.

Na Universidade do Porto, a nota de entrada do último colocado na licenciatura em gestão fixou-se nos 18,5 valores, aproximando-se dos cursos que têm tradicionalmente as maiores médias, como o de Medicina. “São alunos que têm classificações que lhes permitiam escolher praticamente todas as outras áreas. São alunos que escolhem estas áreas, porque são estas as que procuram”, destaca o responsável.

“Quando há muita incerteza, os alunos tendem a procurar os valores mais seguros ou as melhores reputações e qualidade. Portanto, as escolas com maior reputação tendem a beneficiar nestes contextos de muita incerteza em relação ao futuro do mercado de trabalho. Os alunos sabem que a educação superior é valiosa e sabem que se tiverem um grau de uma boa escola, terão uma empregabilidade quase garantida. Num contexto de incerteza, isso conta muito”, sublinha Filipe Santos, dean da Católica-Lisbon.

As saídas profissionais que estes cursos permitem não estão fechadas num modelo único. Estes cursos abrem outras perspetivas de desenvolver uma carreira quer em empresas, organizações sem fins lucrativos, quer em iniciativas de empreendedorismo.

José Varejão

Diretor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto

Filipa Luz, da Nova SBE, acredita que o crescimento da reputação, o cariz internacional da instituição e o contacto com empresas, startups e parceiros ativos da sociedade, são fatores de atração para os estudantes que procuram estes cursos.

A percentagem de alunos que escolheu o Iscte – Instituto Universitário de Lisboa como primeira opção, e com nota maior ou igual a 17 valores face ao número de vagas –– o designado “índice de excelência” –, duplicou para as licenciaturas de economia e quase triplicou para o curso de gestão, revela Maria João Cortinhal, diretora do ISCTE Business School. “São indicadores muito bons e que podem traduzir um interesse, não só pelas áreas, mas também pela nossa escola em particular“, refere.

Economia e gestão: cursos que “abrem horizontes” e garantem futuro

As médias dos exames nacionais subiram e a reputação das escolas está cada vez maior, com algumas das universidades portuguesas a ganharem destaque em rankings europeus e mundiais. Mas estes fenómenos não explicam tudo.

“As saídas profissionais que estes cursos permitem não estão fechadas num modelo único. Estes cursos abrem outras perspetivas de desenvolver uma carreira, tanto em empresas como em organizações sem fins lucrativos, quer em iniciativas de empreendedorismo. Abrem horizontes, digamos assim. Não são carreiras fechadas, padronizadas“, sublinha José Varejão, diretor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, que registou a nota mais alta do último colocado na 1.ª fase para a licenciatura em gestão: 18,5 valores.

Este ano, o ISCTE disponibilizou mais 25 lugares na licenciatura em gestão e mais 15 em economia. Para a Maria João Cortinhal, ainda é cedo para fazer previsões. “É-me difícil saber se isto é um maior interesse nas áreas, se é um fenómeno que é transversal e que resulta diretamente no incremento das notas de acesso ao ensino superior. Só o futuro nos dirá“, nota a responsável.

Hoje em dia, há uma maior ligação entre a economia e a gestão, e as áreas mais científicas. Isso pode trazer um apelo adicional, a bons alunos, a quererem vir para estas áreas.

Clara Raposo

Presidente do ISEG Lisbon School of Economics and Management da Universidade de Lisboa

Filipe Santos, dean da Católica Lisbon School of Business & Economics, acredita que há três fatores que justificam o aumento da procura: o aumento da média do exame nacional de Matemática A, o contexto socioeconómico atual e, ainda, o facto de os alunos apostarem no ensino nacional. “Há um número razoável de alunos muito bons que normalmente querem estudar no estrangeiro, em economia e gestão, e este ano esses alunos não podiam estar no estrangeiro e optaram por ficar cá“, esclarece.

“Numa altura de crise o rigor de gestão é fundamental. Estando o país, a Europa e o mundo, à beira de uma crise económica e social, é fundamental que as pessoas giram bem os recursos humanos e os ativos das organizações. Os jovens aperceberam-se com certeza, de que esse foco é importante e de que é uma linha com futuro”, acrescenta Pedro Costa, diretor do Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra, que este ano também registou um número recorde de candidaturas aos mestrados e abriu um novo curso de licenciatura em Finanças e Contabilidade, com 100 vagas.

Um novo perfil de estudantes

Acima de 18,5 valores na lista da nota final dos últimos estudantes colocados para a 1.ª fase do concurso de acesso ao ensino superior, só encontramos o curso de Medicina, na Universidade do Minho (18,78 valores) e o curso de Matemática Aplicada à Economia e à Gestão (MAE), no ISEG, com 18,75 valores.

“Hoje em dia, há uma maior ligação entre a economia e a gestão, e as áreas mais científicas. Isso pode trazer um apelo adicional, a bons alunos, a quererem vir para estas áreas“, lembra Clara Raposo, presidente do ISEG Lisbon School of Economics and Management.

A responsável concorda que o peso da crise socioeconómica associada à pandemia pode justificar o aumento da procura pelas licenciaturas em economia e gestão, mas acredita ainda que estes cursos podem estar a atrair um novo perfil de alunos: mais conscientes da necessidade de alterar algumas formas de gerir e de alterar processos, e ainda de ter em conta questões de sustentabilidade.

 

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