A PGR cega, surda e muda
Na memória, irá ficar a saída da magistrada da sala da primeira Comissão, protegida pelo seu guarda-costas que 'barrou' a tentativa de perguntas de jornalistas que ali esperavam que mais fosse dito.
Uma hora e meia para questões dos deputados, com perguntas por vezes repetidas e repetitivas, e meia hora para Lucília Gago responder. Diria que nesta quarta-feira, Lucília Gago teve o trabalho facilitado naquela que foi a sua primeira audição no Parlamento para explicar (alegadamente) o relatório síntese do Ministério Público de 2024.
Primeira e última, já que o seu mandato termina em outubro. Certo é que a pergunta que foi feita por vários deputados para que a titular da investigação criminal explicasse a acusação feita há meses – em entrevista à RTP – de que estava a ser orquestrada uma campanha contra o MP, não obteve resposta. Na verdade, leviana e arrogantemente, a maioria das questões que todos nós, cidadãos, gostaríamos de ver esclarecidas, foram ignoradas pela PGR.
Não faltou Dante – mas apenas para frisar as condições e volume de trabalho dos procuradores que apelidou de dantescas – e não faltou o apontar de culpas a vários alvos, como já vem sendo apanágio de Lucília Gago.
Resumindo e baralhando, as escutas telefónicas existem na lei como meio de prova, são ordenadas e demoradas no tempo mas não são em demasia e não são contrárias à lei. A detenção de mais de 22 dias de suspeitos – como aconteceu no caso de alegada corrupção na Madeira – aconteceu mas foi justificada, chegando mesmo a chamar de “crença de alguns” o fato de ter sido em tempo excessivo e o atraso de três meses na entrega do relatório de atividades do Ministério Público – entregue a 5 de agosto – foi culpa da greve dos funcionários judiciais.
No assunto sensível chamado de violação do segredo de Justiça, Lucília Gago não deixou, mais uma vez, de defender a classe que dirige, dizendo que há uma presunção de culpa de que esta violação é feita pelo MP quando na verdade, quem beneficia com estas violações são os advogados das defesas que aproveitam este contexto para vitimizar os seus clientes. E chegou a dizer, de forma mais ou menos impercetível aos mais distraídos, que se querem que se saiba quem viola o segredo de justiça, então faça-se mais escutas telefónicas, deixando no ar que os jornalistas também deveriam ser escutados!
Lucília Gago desvalorizou também o facto de o relatório do Ministério Público só ter sido publicamente divulgado em agosto, quando o prazo previsto é 31 de maio, ao lembrar atrasos no mandato da sua antecessora, Joana Marques Vidal. “Em setembro de 2018, antes de iniciar o meu mandato, foram divulgados três relatórios, reportados aos anos 2017, 2015-16 e 2015-14. Relativamente ao meu mandato, os relatórios foram sequenciais e tudo foi rigorosamente cumprido, salvo o momento de apresentação”. Portanto, estava confortavelmente a ganhar pó na gaveta desde maio… (ironia).
Fiel ao seu estilo, Lucília Gago defendeu a magistratura do MP em todas as decisões polémicas dos últimos anos, numa audiência do Parlamento há muito aguardada mas que ficou demasiado aquém das expectativas. Mas pior do que defender a classe foi a desresponsabilização da sua pessoa, como se o seu cargo fosse o de Rainha de Inglaterra (lembram-se de Pinto Monteiro?) e não de uma mera magistrada nomeada pelo poder político.
Curioso, embora expectável, foi também a posição do Chega e a sua defesa inabalável perante o trabalho de Lucília e do seu MP. Tendo em conta os acontecimentos de 7 de novembro, em que uma mera investigação resultou na demissão de um Governo e eleições antecipadas e que, até agora, não mostrou ainda resultados, é de ficar a pensar, não?
Na memória, irá ficar a saída da magistrada da sala 6 da primeira Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, protegida pelo seu guarda-costas que ‘barrou’ a tentativa de perguntas de jornalistas que ali esperavam que mais fosse dito. Mas não: Lucília Gago ficará assim para a história como a PGR cega, surda e muda. E que considera que os cidadãos e deputados são todos cegos, surdos e mudos. À exceção de André Ventura e os seus lacaios.
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