Abstenção à beira mar plantada
Nunca conheci ninguém que me dissesse que uma das suas resoluções de início do ano seria participar mais ativamente na política do seu país
Janeiro de 2019 é conhecido como o mês das resoluções de ano novo. Prometemos fazer mais desporto, ler mais livros (de preferência mais “eruditos”), atingir uma nova meta de carreira, fazer aquela viagem com que sempre sonhámos, quem sabe até, fazer voluntariado ou estar mais presente na família… Enfim, a lista difere conforme o sujeito e o seu verbo de ação. O curioso é que nestas resoluções de ano novo encontramos mais singular do que plural e raramente podemos detetar uma consciência de bem coletivo.
Nunca conheci ninguém que me dissesse que uma das suas resoluções seria participar mais ativamente na política do seu país, incentivar os seus pares a exercer o seu direito (e dever) de voto, ou agir para o bem da sua nação. Talvez porque estas sejam intenções que consideramos intrínsecas à nossa vivencia enquanto cidadãos e, portanto, decidimos deixá-las fora da lista. Contudo, 2018 provou que estes devem ser pontos da nossa “agenda” deste ano.
A política mudou de protagonistas, consolidou consensos, gerou debate pelo mundo (real e digital), reforçou a importância da informação clara e imparcial em decisões sustentáveis e revolucionou a forma como vemos certos países. Portugal voltou a fazer sucesso no turismo, mas a ser descrito como um país que “exclui os pobres das elites políticas” muito mais do que a maioria dos seus restantes “vizinhos” europeus.
Em ano de eleições, estas questões incomodam-me particularmente. Sente-se uma certa apatia e descrença (geral) na política portuguesa (sentimento que não é novo, mas que não deixa de ser preocupante). Para ser sincera, enquanto jovem, ainda que com pouca experiência na matéria de voto, nunca percebi o porquê de eleitores (oficialmente reconhecidos como tal), não exercerem o seu poder de voto. Lutaram mulheres como eu, há alguns anos, para que lhes fosse reconhecido este direito e agora esquecemos este dever. Posso compreender que, para muitos, se torne um gesto simbólico não comparecer nas urnas, mas na minha opinião, nada resolve ou altera.
Curiosamente, acontecimentos impactantes como a eleição de Donald Trump ou o Brexit, vieram reverter esta noção de que o “meu voto nada muda” e que “não é por eu votar que os políticos vão ser outros”. A visão do político corrupto que coloca a maioria em desvantagem para proveito de uma minoria elitista, essa (infelizmente), ainda não mudou. Mas estes eventos históricos que temos oportunidade de viver (como a eleição de Jair Bolsonaro ou o surgimento do populismo), provam que nós, eleitores (jovens ou não), temos o poder de mudar o nosso futuro.
O desaparecimento das classes médias, entre tantos outros fatores, fez com que surgissem estes “novos movimentos extremistas e populistas” que prometem defender os que se sentem esquecidos pela política, que se “fartaram” da globalização e da cooperação internacional e que foram deixados na miséria e sem sonho. A minha geração vive todo este mundo de forma ímpar.
As nossas opiniões talvez estejam muito mais visíveis nas redes sociais, não percebemos (e por vezes não procuramos entender) certas decisões nos nossos países e damos a democracia e a paz como um dado adquirido (quando a maioria dos nossos avós, tal como o meu, viveram na ditadura a partilhar uma sardinha por sete irmãos e com a certeza da Guerra do Ultramar ou de uma Europa conflituosa). E por todos estes motivos e mais alguns, procuramos outros meios para nos fazermos ouvir.
Não “vibramos” com a política por desacreditarmos em sistemas verticais e não colaborativos, por vermos o setor privado a vingar e por privilegiarmos o marketing digital sobre qualquer forma tradicional. Mas não podemos esquecer: as políticas públicas têm um impacto decisivo na nossa vida. Existe um ‘gap’ gigante entre os jovens e a política.
O comportamento de muitos políticos não incentiva a nossa participação em partidos e o impacto no curso dos países multiplica-se. O nosso afastamento da política cria espaços vazios que podem ser perigosamente ocupados.
Com tudo isto, questiono-me se será então justa a exigência que aqueles que não votam, fazem às suas nações? Acredito que o nosso voto pode, de facto, ter impacto no futuro de Portugal (em tantas questões que vemos debater e que debatemos: desde o sistema nacional de saúde ao salário mínimo). É verdade que 2018 registou a maior participação do século nas ‘midterms’, mas será suficiente? Será que veremos em 2019 a abstenção diminuir no nosso país?
A Google elegeu a palavra “good” como uma das mais pesquisadas no mundo no ano de 2018. Espero que este ano possamos ver mais palavras igualmente altruístas e “plurais” no centro das nossas preocupações e pesquisas e, principalmente, no centro das nossas ações.
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