Almirante Presidente
O Almirante sem partidos é uma ficção gaullista. O Almirante valoriza a Pátria como solução para a crise do Estado, o Almirante valoriza o Estado como solução para a crise Social.
A política portuguesa passa do Orçamento para a segunda volta das Presidenciais. Tudo tem de ser novidade, antecipação, senão os portugueses dispersam e percebem que não há política nova com os erros da política velha. Na política dos cenários e da especulação não se pensa a política porque se nega a política em favor das ambições pessoais e do circuito das vaidades. E assim, porque tudo passa, não há tempo para ter a certeza de que algo se passa. E a vida do país escassa foge apressada que quando se começa já está acabada.
O Almirante é a luz opaca que ilumina a política portuguesa. Não sei se o Almirante pretende ser levado à letra ou levado a sério. Seja à letra, seja a sério, não deixa de ser um mistério o que leva um cidadão sem história, sem experiência, sem relevância política a pretender ser Presidente da República. Talvez se tenha apaixonado ao espelho pela autoridade difusa e pelo carisma de um protagonista da história. Muito se fala no pensamento político e na intervenção cívica de um militar de carreira que se desvanece no nevoeiro. A sua carreira política é um livro que nunca foi escrito. A sua carreira militar é um livro que acaba de terminar. O Almirante é politicamente um “late bloomer”. E uma figura com reflexos sebastianistas.
Numa análise mais clínica, podemos colocar a suposta, presuntiva, hipotética, genial candidatura do Almirante no domínio das grandes metáforas e das grandes lições da política nacional. Para o Almirante a política é em Portugal uma pandemia que necessita de uma nova vacina para a ordem e prosperidade nacionais. Pela escassez de Senadores com currículo político, um Almirante sem currículo político parece ser a melhor solução para Belém. Será? Na tradição civilista da República vai então o país optar pela grande aventura de um candidato cuja educação política se resume à arte de comandar e à arte de obedecer. Entre o comando e a obediência não existe espaço político para a função essencial ao Presidente da República – o papel de moderador no coração do Regime. Não é um exercício politicamente impossível em Portugal, mas em momentos de crise nacional, em circunstâncias de ruptura constitucional, em cenários de revolução política. Talvez o país viva a revolução do esgotamento do Regime, a crise moral da República de Abril, a recusa intencional de se pensar perante a incerteza no Mundo. Um Almirante é sempre um Almirante. “Esta é a primeira vez que cá estou depois da última vez que cá estive”.
O Presidente da República deixou de ser um chefe de facção ou o representante de um bloco político específico. Vinte anos da Esquerda em Belém marcaram a vida política e garantiram a supremacia cultural e política da Esquerda. O país apenas teve direito à Direita que a Esquerda permitiu. Vinte anos da Direita em Belém produziram a erosão da identidade da República. O país tem hoje uma Direita fragmentada que apesar de ser uma maioria sociológica se comporta politicamente como uma multiplicação de minorias. O conceito de “Presidente de todos os Portugueses” funciona como modelo à Esquerda, mas falha de modo disfuncional à Direita. Primeiro, a Direita tornou o Presidente da República uma figura fria e distante. Depois, a Direita tornou o Presidente da República na futilidade popular de uma proximidade estudada.
A Constituição confere alguma latitude política na interpretação dos Poderes Presidenciais. Não parece ser esse o desígnio do Almirante. No entanto, em função da deriva Parlamentarista da República, perante a fragmentação partidária da representação política, face à improbabilidade de uma qualquer Maioria Absoluta no tempo político mais próximo, na observação de uma Direita Radical em expansão, terá o Almirante Presidente a coragem da Dissolução e das Eleições Antecipadas? Pelo desvario tremendista da personalidade a resposta só poderá ser afirmativa. Estaremos perante uma Nova República entre o Parlamentarismo e o Presidencialismo?
O Almirante sem partidos é uma ficção gaullista. O Almirante patriota é uma nova versão sidonista. O Almirante valoriza a Pátria como solução para a crise do Estado. O Almirante valoriza o Estado como solução para a crise Social. O Almirante valoriza a moral como solução para a crise Política. O Almirante valoriza o povo como solução para a crise de Autoridade. Se assim não é, assim parece. Todos os políticos em silêncio são geniais.
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