“Divórcio” entre Clube e SAD. As respostas do Acórdão Belenenses e as questões por resolver
Cabe às partes encontrar um modelo que permita aos investidores ter o controlo que desejam para investir e aos clubes o controlo que necessitam para proteger o seu património.
Foi recentemente tornado público o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no âmbito do litígio entre o Clube de Futebol “Os Belenenses” e “Os Belenenses” – Sociedade Desportiva de Futebol, SAD, na sequência do recurso apresentado por esta última.
Pelo referido acórdão veio o Tribunal da Relação de Lisboa decidir, mantendo integralmente a decisão da 1.ª instância, que o Regime Jurídico das Sociedades Desportivas (doravante, RJSD) nomeadamente o seu art. 23.º, não impede que o clube fundador de sociedade anónima desportiva (SAD), criada através da personalização jurídica da sua equipa de futebol, venda a totalidade das acções de que é titular na SAD, uma vez que a lei deixou de estabelecer que a participação mínima de 10% no capital social da SAD deve ser respeitada a todo o tempo, como estava previsto no Decreto-Lei n.º 67/97, de 3 de Abril, que regulava as sociedades desportivas até à entrada em vigor do RJSD.
O Tribunal esclarece ainda que a rácio da lei era a de associar à participação do clube fundador determinados direitos que visam a protecção dos seus interesses e não a obrigação de uma relação perpétua entre clube e SAD. Mais referiu o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que o art. 23.º, n.º 1 do RJSD procura estabelecer um equilíbrio entre a possibilidade de obtenção de investimento por parte dos clubes e a protecção destes perante os restantes accionistas.
Em todo o caso, se o legislador pretendesse que os 10% mínimos fossem absolutamente intransmissíveis, essa intransmissibilidade estaria prevista no art. 14.º do RJSD. Porém, no n.º 2 desse artigo estabeleceu-se precisamente a regra da livre transmissibilidade das acções, ao contrário do que está previsto quanto às sociedades desportivas unipessoais por quotas.
Deste modo, entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa que um clube pode alienar a totalidade da sua participação numa SAD, sem que a existência desta seja colocada em causa e sem que tal alienação impeça que o clube, que criou a SAD através da personalização jurídica da sua equipa de futebol, posteriormente, constitua uma nova sociedade desportiva, o que, aliás, é obrigatório caso pretenda participar em competições desportivas profissionais.
O acórdão em causa vem responder aquela que era talvez a maior questão por resolver nos litígios e potenciais litígios entre SAD’s e clubes fundadores.
Ganham agora maior importância as questões, até hoje secundárias, mas agora ainda mais relevantes no momento de entrada de um investidor empresarial no capital de uma SAD: como serão as regras relativas à utilização das instalações desportivas, ao uso da designação social da SAD, e ao uso de marca e símbolo do clube, uma vez que o RJSD apenas considera obrigatória a transferência para a sociedade desportiva dos direitos de participação do clube fundador na competição em que se inseria, bem como dos contratos de trabalho desportivos e dos contratos de formação desportiva relativos a praticantes da modalidade ou modalidades que constitui ou constituem objecto da sociedade, deixando à disposição das partes todas as restantes questões.
Cabe às partes encontrar um modelo que permita aos investidores ter o controlo que desejam para investir e aos clubes o controlo que necessitam para proteger o seu património já que a realidade nos mostra que são cada vez mais raros os casos de clubes em Portugal que se conseguem manter competitivos sem investimento empresarial e cada vez mais frequentes os casos de “divórcios” entre Clube e SAD, sejam os mais mediáticos como Belenenses, CD Aves ou Cova da Piedade ou outros mais latentes que talvez se venham a precipitar em breve na sequência deste acórdão.
Nota: Os autores escrevem ao abrigo do antigo acordo ortográfico.
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