Editorial

O que poderia ser feito com os três mil milhões da TAP?

Os tripulantes da TAP estão em greve, hoje e amanhã. É uma decisão irresponsável e ingrata, e o caminho mais rápido para a falência da companhia.

A TAP é uma espécie de empresa-maldita, faz parte daquelas que, públicas ou privadas, são vistas como de todos (como os CTT, a CGD ou a RTP), foi privatizada e depois renacionalizada em dois tempos. Agora, pública, está mais exposta do que nunca à ganância dos sindicatos que, apesar de terem beneficiado de um esforço conjunto dos contribuintes portugueses superior a três mil milhões de euros, jogam a sobrevivência da companhia na defesa de interesses particulares. É mesmo isto que está em causa na greve dos tripulantes da TAP.

A recuperação da TAP está longe de ser um dado adquirido e isso também explica a pressa do Governo em voltar a vender a companhia, depois de António Costa nos andar a dizer, durante anos, que a TAP teria de ser portuguesa e era tão importante como as caravelas dos descobrimentos. A TAP não tem solução possível nas mãos do Estado e o caminho para a falência é inevitável, porque a Comissão Europeia não deixará o Estado meter mais dinheiro público e desvirtuar a concorrência. Mas, aparentemente, o sindicato dos tripulantes e os respetivos associados acreditam que é possível ‘esticar a corda’ e forçar a administração e o Governo a cederem à pressão. O Estado, recorde-se, tem de transferir até ao final do ano mais 900 milhões de euros e não tem margem de recuo.

O pecado original, que explica muito do que a TAP está a viver, remonta a 2016 quando António Costa e Pedro Marques mudaram as condições da privatização da empresa de aviação. David Neeleman aproveitou. Depois, com as responsabilidades assumidas, chegou a pandemia e Pedro Nuno Santos comete o segundo erro, pelo qual está também a pagar. Expulsou Neeleman (e Antonoaldo Neves, que não servia para a TAP, mas serve para a Etihad…), contratou a melhor gestora que poderia pagar e assumiu o ónus político do que poderia acontecer. E está a acontecer.

A assembleia geral do Sindicato Nacional do Pessoal da Aviação Civil (SNPVAC) confirmou a greve dos tripulantes de cabine da TAP nos dias 8 e 9 de dezembro. Será a primeira paralisação dos tripulantes desde dezembro de 2014, quando várias classes profissionais da companhia aérea pararam durante quatro dias, e em pleno processo de reestruturação e, segundo as contas da própria empresa, custará oito milhões de euros. Mas custará, na realidade mais, com contas impossíveis de calcular: Quantos passageiros deixarão de marcar viagens na TAP nos próximos meses por causa da instabilidade laboral e da incerteza sobre novas greves, aliás já prometidas?

A legitimidade da atual gestora, Christine Ourmiére-Widener, está fortemente posta em causa, depois de episódios como a compra de carros ou a contratação da mulher do personal trainer do seu próprio marido. Erros de palmatória numa empresa em reestruturação. Mas isso não justifica a greve de hoje e de amanhã.

Sim, o plano de reestruturação é duro para os trabalhadores, os cortes salariais são impactantes — mesmo tendo em conta os salários de partida, elevados face à realidade do país e que foram aumentados com Neeleman –, mas a alternativa seria o desemprego, e a criação de uma nova empresa ao lado, muito mais pequena, com os despojos da TAP. Mas o processo de reestruturação também é duro e exigente para os contribuintes: O que poderia ser feito com três mil milhões de euros na saúde e na educação?

PS: Há exatamente um ano, Carlos Guimarães Pinto e André Pinção Lucas lançaram, no âmbito do instituto +Liberdade, o livro “Milhões a voar. As mentiras que nos contaram sobre a TAP”. Neste dia de greve, o primeiro desde 2014, é uma leitura que se recomenda.

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