Ordem dos Advogados – apatia externa e quezílias internas

  • Luís Menezes Leitão
  • 14 Maio 2019

A apatia externa da Ordem é compensada por uma guerrilha interna sem precedentes entre os seus órgãos e uma ingerência despudorada em competências alheias.

A Ordem dos Advogados atravessa neste momento uma fase extremamente difícil, contrastando entre uma total apatia externa e o multiplicar de quezílias internas. Em termos externos, a Ordem não está a cumprir a sua missão de garantia do Estado de Direito e dos direitos dos cidadãos.

As custas judiciais continuam em valores astronómicos, sem que haja qualquer perspetiva da sua redução. Os atrasos na justiça são contínuos, desesperando os cidadãos que pretendem recorrer a tribunal. E a justiça penal desdobra-se em megaprocessos, cada vez mais longos, deixando o cidadão sem perspetivas de ver a sua situação resolvida, a não ser passados muitos anos, com tudo o que isto implica de lesão dos seus direitos. Em consequência, os julgamentos mediáticos substituem-se aos verdadeiros julgamentos, com a justiça a ser abusivamente feita pelos meios de comunicação social.

Mas sobre isso nunca se ouve a Ordem dos Advogados, a não ser quando os próprios titulares dos seus órgãos se colocam no papel de comentadores judiciários em processos alheios. Substitui-se assim a intervenção de fundo da Ordem nos problemas da Justiça dos portugueses por uma simples crónica judiciária. Esta apatia externa da Ordem é compensada por uma guerrilha interna sem precedentes entre os seus órgãos e uma ingerência despudorada em competências alheias.

O Presidente do Conselho Regional de Lisboa, provavelmente aproveitando o eclipse do Bastonário, aparece a solicitar iniciativas legislativas ao Governo em matérias de âmbito nacional, usurpando as competências do Conselho Geral, sem que este tome qualquer atitude. O facto de estas solicitações serem absolutamente ridículas, como ter pedido para sujeitar os advogados ao regime do IVA dos partidos políticos, ou pretender um diploma legislativo a dilatar prazos por uma falha do Citius de dois dias, não as torna aceitáveis, pois lesam gravemente o prestígio da Ordem dos Advogados.

Como também não é aceitável ter-se publicado no site do Conselho Regional acórdãos disciplinares do Conselho Superior, procurando retirar dividendos políticos de julgamentos disciplinares de colegas, que devem ter sempre a máxima reserva. Mas a campanha eleitoral em curso tudo justifica, até a feitura de crónicas nos jornais atacando os outros órgãos da Ordem, para depois recuar, quando confrontado com a justa indignação dos visados.

Em compensação, a situação dos advogados piora a olhos vistos sem que nenhum órgão executivo da Ordem, nacional ou regional, lute contra isso. Enquanto anteriormente os advogados viviam sob a ameaça de uma subida constante das contribuições para a CPAS (Caixa de Previdência dos Advogados e dos Solicitadores), hoje não fazem a mínima ideia de quais serão os seus pagamentos no ano seguinte, confrontados com um desconto que varia todos os anos e que não permite prever quais as suas futuras contribuições nem a reforma que no futuro poderão ter.

Ao mesmo tempo, os honorários no sistema do acesso ao Direito não são atualizados desde 2004, sendo que, numa altura em que se discute se os magistrados devem receber acima do Primeiro-Ministro ou do Presidente da República, ou se os professores devem recuperar nove anos de carreira de uma vez ou faseadamente, nenhum órgão executivo da Ordem, nacional ou regional, aparece a falar sobre um congelamento de honorários dos advogados no SADT (Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais), que dura há 15 anos.

Pelo contrário, a Ordem aceita pacificamente uma reforma do SADT, que não só não atualiza a remuneração dos advogados como o abre aos solicitadores. E também nenhum órgão executivo da Ordem, nacional ou regional, reagiu perante a situação achincalhante de pôr os advogados a tirar senhas à entrada dos Tribunais, como se uma deslocação do advogado ao Tribunal pudesse ser tratada como uma ida à farmácia para recolher medicamentos.

É perante o estado atual da Ordem que aceitei o desafio de encabeçar como Bastonário uma candidatura ao seu Conselho Geral para alterar de vez este estado de coisas. O que nos propomos fazer é expresso no nosso slogan: “Respeito, Dignidade e Segurança para a Advocacia”.

Devolver aos advogados o Respeito que merecem no exercício da sua profissão. Assegurar aos advogados que a sua profissão é exercida de forma digna, com uma remuneração adequada. E garantir aos advogados a Segurança necessária em termos de proteção social na velhice, doença e parentalidade. Se merecermos a confiança dos Colegas, a Ordem dos Advogados voltará a estar ao serviço dos Advogados.

  • Luís Menezes Leitão
  • Bastonário da Ordem dos Advogados

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