Os advogados do amanhã

  • Helder Galvão
  • 19 Novembro 2020

A maneira como compramos, aprendemos, comunicamos uns com os outros serão completamente (ainda mais) revolucionadas.

Em 1996, ao lançar The Future of Law, o jurista britânico Richard Susskind introduziu importantes debates no mercado jurídico, cujos efeitos, curiosamente, atendendo ao tempo, ainda hoje são atuais, principalmente no contexto da pandemia Covid-19.

Susskind apontou, em resumo, três mudanças, consideradas como radicais no desempenho das atividades dos advogados. Diga-se, é verdade, que essas mudanças vieram na sequência das suas outras publicações, como Tomorrow´s Lawyers.

A primeira foi o que intitula mais por menos ou o more-for-less challenge, onde a procura jurídica cresce numa escala maior e desproporcional se comparada à disponibilidade e propensão do mercado para pagar por serviços jurídicos. Como forma de equilibrar, os advogados em geral passaram a investir mais em automação, standardização e sistematização, além do desenvolvimento de plataformas de cross-selling entre os seus clientes.

Já a segunda, extravagante para o modelo português, é a liberalização da prática jurídica, no movimento conhecido como Legal Services Act, de 2007, e que começou a produzir efeitos a partir de 2011. Foram criadas as ABS’s (Alternative Business Structure), possibilitando investimento externo, private equity e venture capital para escritórios de advocacia. No Reino Unido, diploma legislativo foi bem recebido pelo mercado, ao citar famosas firmas de contabilidade que buscaram licenciar-se como uma ABS. Em outras partes do mundo, como no grandioso mercado brasileiro, não se prevê esse tipo de liberalização. O terceiro movimento de mudança, por sua vez, envolve a utilização da tecnologia. Susskind não poupa críticas ao comportamento cético da maioria dos advogados, ao qual denomina irrational rejectionism, uma dogmática e visceral rejeição de uma tecnologia da qual o cético nem ao menos possui experiência. Embora o direito em si demore mais a atualizar-se, as tecnologias que servem como plataforma para o direito são muito mais rápidas, exponenciais, e é dever do advogado antecipar-se a essa mudança tecnológica.

O desafio, contudo, não deve ser mais voltado somente para a automação de práticas jurídicas estabelecidas, como o uso de software em geral, pois isso já se tornou regra em um mercado com forte simetria, mas sim de criar novas práticas, jamais consideradas possíveis até então. O jurista britânico cita mais de dez novas tendências, entre elas o Legal Data Scientist, que é o responsável pela análise de dados, identificação de tendências e padrões, tanto em estatísticas de conteúdo jurídico quanto em estratégicas para o cliente, de modo a oferecer soluções preditivas e não mais baseadas no que chama de demand-pulled.

O objetivo, assim, é incentivar os operadores do direito a buscarem práticas inovadoras. É positivo insistir na crença de que a empresa é incentivada não pela existência de seus concorrentes, mas pelas necessidades de seus clientes, no resgate da velha máxima do customer first. Como afirma o ex-editor da Revista Wired, Kevin Kelli, não adianta resistir. A maneira como compramos, aprendemos, comunicamos uns com os outros serão completamente (ainda mais) revolucionadas. O que podemos fazer, segundo ele, e diante do inexorável caminho da inovação, é compreendê-las e abraçá-las para assim aumentarmos a probabilidade de beneficiarmos delas.

  • Helder Galvão
  • Consultor da Abreu Advogados

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