Precisamos de falar sobre a saúde mental dos empreendedores
De acordo com a OCDE, 18.4% da população portuguesa sofre de algum tipo de problema relacionado com a sua saúde mental. Os dados relacionados com empreendedorismo, no nosso país são inexistentes.
Desde que fundei a Hug-a-Group, tenho visto amigos, colegas e sentido na pele o lado que muitas vezes não é notícia – quando falhamos, quando as coisas correm mal, quando existem problemas, quando alguém não está bem ou percebe que prefere fazer outra coisa profissionalmente.
Segundo o relatório Health at a Glance 2018 da OCDE, 18.4% da população portuguesa sofre de algum tipo de problema relacionado com a sua saúde mental. Quando procuramos dados relacionados com empreendedorismo, no nosso país são inexistentes, o que diz muito sobre o tema. Um artigo do Business Insider fez um paralelismo semelhante na Austrália e percebeu-se que a prevalência deste tipo de problemas era quatro vezes superior na comunidade empreendedora.
Porque é que isto acontece?
A maioria dos empreendedores com quem contacto têm um brilho nos olhos quando falam sobre a sua organização e é claro que estão super alinhados com o que fazem diariamente, traz-lhes propósito. Mas isso faz com que fiquem demasiado ligados aos altos e baixos do mesmo, ou seja, nas melhores fases sentem-se bem mas, quando surgem problemas, tendem a sentir desgaste, o que é perfeitamente normal. No entanto, o problema é esse desgaste acumulado – o chamado burnout circunstancial. Outros empreendedores sentem muita adrenalina na fase inicial de construir um negócio, na fase de ideação, e deixam de se sentir motivados quando a burocracia e os processos formais de ter uma organização aparecem – o burnout existencial.
Mas o que podemos fazer, enquanto empreendedores, para evitar o burnout?
- Penso que a primeira coisa a ter em conta é não deixar que o que quer que aconteça na organização nos isole. É fundamental mantermos as nossas relações sociais e os nossos hobbies fora do trabalho.
- Em segundo lugar, ter cuidado com a nossa saúde física. A imagem do empreendedor que come noodles ou massa com atum todos os dias e dorme pouco porque, caso contrário, não vai ter sucesso, parece-me um pouco desatualizada. Manter hábitos de alimentação saudável, exercício físico e higiene de sono é fundamental.
- Em terceiro lugar – e este é um dos mais difíceis – não devemos deixar que os obstáculos que atravessamos diariamente nos afetem na nossa vida pessoal. Falo por experiência própria; muitas vezes a linha que nos distingue das nossas organizações é muito ténue e isso complica e muito as coisas do ponto de vista mental e da motivação. Penso que, para isto, é importante delimitar barreiras e marcar tempo para nós próprios nos fins de semana ou não deixar que o trabalho nos tire horas preciosas de tempo em família ou com amigos.
- Por último, acho muito importante falar com outros empreendedores, perceber como eles navegam nestes problemas. Não somos os únicos no mundo a lidar com problemas de faturação, com contabilistas, com clientes, com colaboradores – são problemas partilhados por muita gente e comunidades como a do IES-Social Business School têm essa rede de pessoas com quem nos devemos abrir.
Não é comum falar-se de falhanço em Portugal e penso que existe uma relação direta com este tema – temos medo de falhar. O que vão dizer de nós se, de repente, tudo correr mal? Não nos esqueçamos que 9 em cada 10 startups não são bem-sucedidas, por isso o normal é que todos nós, mais tarde ou mais cedo, passemos por obstáculos difíceis na nossa jornada. É importante que tenhamos força para os ultrapassar, mas que também estejamos preparados mentalmente para, um dia, falhar.
Tenho a certeza que mais vale falhar do que não tentar.
*Pedro Marques, CEO da Hug-a-Group.
**Este texto faz parte de uma parceria entre o ECO e o IES que integra artigos de opinião que ajudem dar visibilidade ao empreendedorismo social através de diversos empreendedores sociais, geridos pelo IES, dado o seu trabalho e experiência nesta área.
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