Editorial

Uma mensagem do Pai Natal

António Costa falou ao país no dia de Natal. Mas não foi uma mensagem do primeiro-ministro, foi uma carta do Pai Natal, com meias verdades e omissões, para manter a ilusão.

António Costa vestiu-se de Pai Natal para falar aos portugueses na tradicional mensagem do dia 25 de dezembro. O primeiro-ministro encheu o discurso de meias verdades em relação ao que se passou em 2018, e foi totalmente omisso em relação ao que nos espera para 2019, quer interna quer externamente. Só não contava com uma intervenção surpresa, e certeira, do Presidente da República.

Marcelo Rebelo de Sousa disse mais em meia dúzia de palavras – primeiro no Jornal de Notícias e depois em declarações avulsas aos jornalistas – do que preparada mensagem de Natal de António Costa. O dia e a noite, o contraste não poderia ser maior. Onde um falou do ciclo eleitoral, o outro desconversou com promessas de investimento nos serviços públicos, onde um falou de coesão social (e implicitamente) de greves, o outro trouxe a aposta na demografia e no território. Numa intervenção, acordámos, na outro adormecemos.

António Costa é um mestre nas meias verdades. Mas ‘não mentir’ não significa dizer a verdade. Foi o que fez nesta mensagem natalícia. Portugal cresceu mais do que a média comunitária? Sim. De acordo com os dados divulgados pelo Eurostat, no terceiro trimestre do ano, a economia nacional cresceu 2,1% em termos homólogos, ficando acima da média comunitária (1,9%), mas atrás de 14 Estados-membros. No topo dessa tabela está a Polónia, que cresceu 5,7% face ao mesmo período do ano passado. Mas há mais: Em 2017, ano em que crescemos 2,8%, o PIB per capita situou-se em 76,6%, valor inferior em 0,6 pontos percentuais ao que foi verificado em 2016 (77,2%), comparado com a média da união europeia. E caímos para os últimos lugares da tabela. Mesmo assim, António Costa promete manter a política que nos trouxe até aqui.

O Serviço Nacional de Saúde e os transportes, particularmente ferroviários, estão numa situação próxima do calamitoso, mas o que faz António Costa? Promete a continuação do investimento no SNS e nos transportes, quando as cativações continuam a ser o volante da política orçamental. O que aconteceu ainda há dias na Maternidade Alfredo da Costa, que fechou as urgências por falta de anestesistas? Ou o anúncio de que a ala pediátrica no Hospital de São João no Porto vai arrancar até ao final… de 2019 e mais 24 meses de obra? E a supressão contínua, e crescente, de comboios da CP por falta de manutenção, o que destrói os anúncios (outra vez) de uma ligação Lisboa-Porto em duas horas?

O primeiro-ministro deixa cair, no meio da mensagem natalícia, que não se ilude com os números. Nem deve, porque sabe, melhor do que ninguém, o que nos espera em 2019. E não é por causa das eleições. A economia vai abrandar, por razões internas e externas. Porque o efeito de criação de emprego (o lado mais positivo deste ciclo económico e político) na economia está quase esgotado e, sem reformas que se vissem, a produtividade não chega para compensar. Depois, porque o abrandamento económico europeu e internacional vai afetar diretamente as exportações. Vamos regressar à normalidade, aos crescimentos económicos em torno de 1%, quando não for pior. Para o Banco de Portugal, a economia vai crescer 1,8% em 2019. Não será otimismo a mais?

E sobre 2019? A demografia e o território (quantas vezes já não ouvimos estas declarações de amor?) não são prioridades para um ano, são bandeiras eleitorais para 6 de outubro de 2019, dia das legislativas. Não há nada de mais relevante, pois não? Marcelo tem razão, sim, o tempo do ciclo pré-eleitoral já começou, e o primeiro-ministro, vestido de Pai Natal, é o primeiro a dar-nos uma conversa de encantar.

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