Blanchard sobre o crescimento de 2,8%: “Um pássaro não faz a primavera”
Olivier Blanchard, ex-economista-chefe do FMI, reconhece que a economia portuguesa está a recuperar. Mas no estudo com Pedro Portugal, identifica quatro constrangimentos ao crescimento.
“Um pássaro não faz a primavera”, avisa Olivier Blanchard, ex-economista-chefe do FMI, referindo-se ao crescimento de 2,8% conseguido pela economia portuguesa, no primeiro trimestre de 2017. Num encontro com jornalistas, a propósito da sua vinda a Lisboa para a conferência Portugal, from here to where?, o perito em macroeconomia assumiu estar surpreendido com os desenvolvimentos da atividade económica dos últimos meses.
“Vamos ter cuidado, poderá não durar muito”, disse Blanchard. “As coisas estão melhores do que todos pensavam há um ano. Porquê? Não é muito claro para mim. O que está por trás desta performance muito forte das exportações? Não sabemos bem. É um grande ponto de interrogação”, somou o macroeconomista.
Blanchard reconhece que “a retoma económica está a acontecer” em Portugal, mas frisa que agora “a questão é saber que medidas podem ser tomadas para reforçá-la.” Até porque há constrangimentos estruturais ao crescimento que importa reconhecer. No estudo que fez em parceria com o economista Pedro Portugal, especialista em mercado de trabalho do Banco de Portugal, estes constrangimentos ao crescimento estão bem identificados.
O que está a impedir Portugal de crescer?
1 – Persistem fortes desequilíbrios internos
“Portugal ainda sofre de um grande desequilíbrio interno”, frisa o estudo dos dois economistas. O documento explica que a acreditar nas estimativas do hiato do produto atuais, “a taxa de desemprego natural estaria entre os 10% e os 11%”. Ora, “isto parece muito pessimista”, notam. Por isso, argumentam que a questão deve ser colocada de outro modo: antes da crise, a taxa de desemprego natural (isto é, o peso de desempregados na população ativa que é estrutural, que é natural que não diminua, mesmo com a economia a crescer a bom ritmo) em Portugal rondava os 5% a 6%. “Há razões para pensar que praticamente duplicou?”, perguntam.
Pesando vários fatores, os autores do estudo concluem que “o aumento na taxa de desemprego natural não deverá ser superior a 2%, pelo que a taxa não deverá ser superior a 7% ou 8%.” E por isso argumentam que não faz sentido pensar que a economia já está a operar perto do potencial.
2 – Elevada dívida privada e pública, e muito crédito malparado
O estudo identifica este como um dos principais entraves ao crescimento: a dívida das famílias ultrapassa os 130% do rendimento disponível, a dívida das empresas não financeiras excede os 200% do PIB e a dívida pública supera os 130% do PIB.
Os economistas reconhecem que os bancos já fizeram um esforço para limpar os créditos malparados dos seus balanços, mas defende que “a proporção de malparado é ainda elevada e preocupante.” E o problema é que não são só os bancos que ficam com as suas taxas de rendibilidade limitadas, são também os fundos que ficam “mal alocados”. Por isso, é preciso ir mais longe. Como? Se for preciso, furando os limites do défice.
3 – Persistem desequilíbrios externos
Portugal corrigiu o défice da balança corrente, mas esta conquista ainda não é estrutural, avisam os economistas. A principal razão pela qual a balança corrente é neste momento positiva é porque o PIB está a funcionar abaixo do potencial e, por isso, as importações estão baixas. Mas assim que a economia acelerar, o défice pode regressar.
O estudo reconhece que “o crescimento económico tem sido relativamente forte”, mas a questão é saber “porquê”. E aqui, tal como Blanchard disse aos jornalistas, não se encontra um motivo claro. “Uma hipótese é assumir que os exportadores são price takers e que na medida em que as suas empresas têm lucros mais altos, isso permite-lhes aumentar a produção e as exportações”, lê-se no estudo.
4 – Baixo crescimento da produtividade
Competitividade e produtividade não são a mesma coisa. E no que toca à produtividade, os números portugueses mostram que ainda há muito caminho pela frente. O estudo assume dados de 2015, mas evidencia que a produtividade do trabalho em Portugal representa 38% da alemã na indústria, 54% na construção e 81% no comércio. Face a Espanha, os números são 43%, 37% e 80%, respetivamente.
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