Salário mínimo sem consenso: “O Governo não subscreve um acordo a qualquer preço”
Salário mínimo sobe, mas sem acordo dos parceiros. Ministro do Trabalho entende que a falta de consenso não incide no valor em concreto, mas sim nas condições exigidas pelos patrões para essa subida.
Desta vez não houve acordo em torno do aumento do salário mínimo. A subida em janeiro de 2018, de 557 para 580 euros, vai concretizar-se à mesma, mas sem o apoio dos parceiros sociais. O ministro do Trabalho acredita que a falta de consenso não incide no valor em concreto, mas sim nas condições exigidas para essa subida. E depois apontou o dedo aos patrões. “O Governo não subscreve um acordo a qualquer preço”, sublinha Vieira da Silva.
De acordo com o governante, as reivindicações apresentadas pelo patronato são “impossíveis de satisfazer”. Quais são? Desde logo, “que o Governo garantisse a preservação inalterada da legislação laboral”, explicou. Ou seja, “que o Governo se comprometesse a não legislar na área laboral”, “algo que não pode ser pedido a um Governo”, frisou Vieira da Silva. O ministro diz que está disponível para encontrar compromissos sobre este tema em concertação social, “mas nunca sob uma pressão desta natureza.”
A segunda condição passava por mudanças nos Fundos de Compensação do Trabalho, que hoje exigem um desconto, por parte das empresas, de 1% da retribuição base e diuturnidades dos trabalhadores contratados a partir de outubro de 2013, embora preveja algumas exceções. Os fundos servem depois para pagar parte das compensações por despedimento.
A proposta era “baixar em termos relativos de 100 para 20” o nível de descontos, “de um momento para outro”, indicou ainda o ministro. Ainda assim, o Governo já se mostrou disponível para discutir estes instrumentos e hoje voltou a reforçar essa ideia, dizendo que é preciso avaliar a relação entre os dois fundos, já que um tem capitalização elevada e o outro não tem sido usado. A CIP – Confederação Empresarial de Portugal quer reduzir o desconto de 1% para 0,2%, o que, nas contas de António Saraiva, implica uma redução do esforço das empresas de 7,1 milhões de euros para 1 milhão, argumentando que os fundos estão fortemente capitalizados para a utilização que têm.
Por fim, os patrões também exigiram “uma transformação significativa na fiscalidade” sobre o rendimento das empresas, disse Vieira da Silva. O governante diz que está disponível para discutir, não as taxas de IRC, mas outras dimensões como o pagamento por conta ou o Pagamento Especial por Conta (PEC).
O Governo não conseguiu assim o aval dos patrões para aumentar o salário mínimo. Mas diz que o valor “não foi questionado do ponto de vista do seu impacto” na vida das empresas tal como aconteceu noutros anos, já que há agora “muito maior tranquilidade”. “Foi o caderno reivindicativo colocado à volta da possibilidade de continuar a apoiar este aumento que levou à impossibilidade de um acordo”, disse Vieira da Silva. “Lamento”, conclui.
António Saraiva também afirmou que não estava em causa o valor do salário mínimo para 2018, que já estava decidido pelo Governo, mas sim “o cumprimento do acordo” atual, nomeadamente no que toca ao Fundo de Compensação do Trabalho, o PEC ou a “estabilidade das relações laborais”. Mas isso ainda não foi conseguido nesta reunião, afirmou.
Mesmo sem acordo, Vieira Lopes, da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), mostra-se igualmente interessado em que “o diálogo continue”.
Mesmo sem acordo, concertação social vai discutir outras matérias
Ainda que desta reunião não tenham saído conclusões no que toca a medidas concretas além do aumento do salário mínimo, a discussão em concertação social vai continuar noutros temas. O próprio acordo assinado pelos parceiros sociais, que ainda vigora, prevê matérias que se estendem no tempo. “Agora, obviamente que o Governo não subscreve um acordo a qualquer preço”, e a um preço “que é para nós até do ponto de vista simbólico absolutamente inaceitável”, sublinha Vieira da Silva.
Referindo-se ao pedido de congelamento da legislação laboral, Vieira da Silva afirmou que no primeiro semestre de 2018 o tema será discutido em concertação social. O Governo diz que a negociação coletiva e a redução da segmentação no mercado de trabalho são prioridades. Neste sentido, já admitiu limitar as regras da contratação a termo.
Já no que diz respeito a medidas fiscais, o ministro recorda que há compromissos para 2019 nomeadamente em matéria do IRC, e isto será discutido em concertação social. A lei que reduziu o PEC — a alternativa encontrada para substituir a redução da TSU para empresas com salários mínimos, quando esta medida foi travada no Parlamento — já diz que o Governo deve apresentar à Assembleia da República uma proposta de lei de alteração do regime simplificado de determinação da matéria coletável em IRC, para entrar em vigor a 1 de janeiro de 2019.
Falhado um consenso, Vieira da Silva afasta o risco de conflitualidade laboral e também não antecipa que Portugal fique mais frágil perante as instituições internacionais. “Se a ausência de um acordo fosse justificada por parte dos parceiros sociais pelo seu elevado valor ser incomportável para a economia portuguesa, isso poderia ser um problema, não ouvi sinceramente essas afirmações”, disse.
Centrais sindicais queriam ir mais longe
O ministro garante que “ninguém está zangado com ninguém”, mas mesmo do lado sindical, as centrais queriam ir mais longe: a UGT pedia 585 euros e a CGTP 600. Arménio Carlos avisa que fará o possível nas empresas e na contratação coletiva para que o salário mínimo “de referência seja 600 euros”. Para o líder da Inter, o Governo “foi obrigado a reconhecer” que “cedências sistemáticas” ao patronato eram “inadmissíveis e eram imorais”.
A UGT também entende que “não há qualquer hipótese de assinatura de um acordo” já que não há vontade da maioria, um resultado que a presidente, Lucinda Dâmaso, lamenta.
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