Covid-19 atinge seguradoras em bolsa. Europeias já corrigem
O risco de pandemia ameaça cadeias de abastecimento e procura global, levando a volatilidade a máximos de 9 anos na última semana. No arranque de março, as seguradoras europeias sinalizam correção.
Embora partilhando a ideia de que ainda é cedo para falar de consequências da epidemia e que a volatilidade persiste, os investidores já interiorizam que o risco de pandemia por Covid-19 terá impacto marginal na indústria seguradora. Assim, depois de uma semana agitada no mercado de capitais e face a um panorama misto nos principais índices bolsistas do velho continente, com destaque negativo para o italiano MIB30, o setor de seguros inicia março a contrariar as quedas que se mantêm em banca, automóveis e turismo e lazer.
Em detalhe, a Prudential Plc progredia 1,14%, para 14,5 libras esterlinas por ação no FTSE100, em Londres, aliviando as perdas do último mês para 6,3%. A Legal & General, também cotada na London Stock Exchange (LSE) e que esta semana apresenta os resultados anuais, avançava 0,38%, para 261,00 libras por ação, atenuando um resfriado de quase 15% desde 03 de fevereiro. No mesmo sentido, a Aviva Plc subia 1,52%, para 356,12 libras por título, corrigindo perdas que ainda representam variação negativa de 12% face ao valor bolsista de 03 de fevereiro.
Em ritmo de recuperação mais sólido, a Swiss Life Holding avançava 4,4% face ao valor de fecho anterior, para valer 457,90 francos por ação, acumulando ainda uma perda de 6% ao longo de fevereiro.
A meio da manhã desta segunda-feira, sessão de arranque mensal em Frankfurt (índice Xetra), a Allianz SE, holding que controla a AGCS, subia 0,11% para 195,02 euros/ação, cedendo ainda cerca de 10% face aos níveis a que cotava um mês antes. Por fim, a AXA, que iniciou o dia em alta no mercado Euronext Paris, cedia 0,72%, para os 20,805 euros por ação, sem força para manter a recuperação depois de ter derrapado 16% no acumulado de fevereiro.
As principais bolsas da Europa iniciaram a sessão com variações positivas, com exceção de Milão (a Itália é o país europeu mais atingido pela epidemia do novo coronavírus nCov19), mas a meio da manhã a volatilidade voltava a marcar o sentimento capitalista, com Milão, Frankfurt e Madrid a comporem o trio negativo na Europa, embora com o IBEX35 a variar entre perdas e ganhos pouco significativos.
Segundo analistas, os mercados operam animados com indicações de que os bancos centrais (dos EUA, Japão e Reino Unido) estão preparados para responder a qualquer eventual necessidade de estabilização do sistema financeiro.
Seguradoras cotadas em Nova Iorque penaram na última semana de fevereiro
O problema associado à depreciação bolsista das seguradoras não é tanto o que o Covid-19 pode significar em custos de indemnizações e reembolsos por parte da indústria. Segundo Brett Horn, da Morningstar, “estas companhias investem parte das receitas com prémios em ativos de bolsa, a maior fatia em obrigações. Essas carteiras estão muito alinhadas com o comportamento dos mercados de capitais”. Quando os mercados caem, as ações das companhias acompanham a tendência.
Seguradoras dos ramos Saúde, como a UnitedHealth, Cigna e Humana afundaram em torno de 14% na última semana, mais do que a descida de aproximadamente 9% no índice de referência S&P500. Logo a seguir, os papéis das companhias que lideram em Vida, como a Prudential, Metlife, Manulife, AIG, Primerica registaram desvalorizações acumuladas de aproximadamente 10% nos primeiros quatros dias da última semana de fevereiro.
Em operação de fecho mensal (fato que normalmente também influência o andamento do mercado), o cenário que se abria com o risco associado ao Covid-19 (novo coronavírus) atingiu a quase totalidade dos setores cotados (companhia aéreas; turismo; automóvel; consumo; banca; tecnologia; energia; serviços, etc).
As bolsas passaram de máximos para uma queda semanal que, em termos históricos só é ultrapassada pelos crashes da crise financeira (2007-2008), os atentados de 11/9, em 2001 e a crise da dívida da Rússia, em 1998. As curvas de rendibilidades (yields) que sustentavam os mercados até à penúltima semana de fevereiro pulverizaram-se na generalidade de ativos bolsistas.
Em comentários que antecipavam o balanço semanal, analistas e operadores trocam argumentos para explicar o tombo nas maiores bolsas do mundo: ‘correção no mercado?’; ‘acerto de carteiras em fecho de semana e mês?’; ‘desconto antecipado de continuação da tendência?’.
Convém não arriscar prognósticos, nem com o que contar nos próximos dias, a não ser ativos de refúgio clássicos ou típicos de ‘cenário de desastre’. O mais prudente é deixar o jogo para os que tratam estes momentos como oportunidade. Nesta incerteza, o VIX, índice de volatilidade da CBOE (bolsa de Chicago), um termómetro fiel do sentimento dos investidores, disparou para cima dos 42% na última quinta-feira (27 de fevereiro), o nível mais elevado desde março de 2011.
Os principais índices da NYSE (DJ; S&P500) e da plataforma Nasdaq (Nasdaq 100) tiveram uma semana negra, em alguns casos protagonizando quedas históricas para mínimos multianuais que fazem lembrar a agonia da crise financeira, 12 anos atrás, e as cotadas do setor segurador não escaparam ao contágio.
A tentativa de explicar as desvalorizações ainda referenciou o efeito negativo ‘Bernie Sanders’, potencial candidato democrata às próximas presidenciais norte-americanas, cuja proposta para a saúde esboça um modelo ainda mais socialista do que o Affordable Care Act (vulgo Obamacare), programa implementado em 2010, pelo executivo do anterior Presidente dos EUA, Barack Obama. Mas, no fim de contas, as opiniões coincidiam para o cenário de risco que decorre de uma eventual pandemia, potencial de consequente disrupção económica e o seu efeito no médio prazo.
Enquanto circulavam números, com base no índice global MSCI, indicando que mais de 5 biliões de dólares (trillions na linguagem anglo-saxónica) evaporaram-se do mercado bolsista global em quatro dias, havia quem antecipasse que a Reserva Federal dos EUA teria de intervir em termos de política monetária antes mesmo que fosse declarada a situação de pandemia.
As abordagens mais tecnicistas falavam de um verdadeiro hair cut: basta retirar cerca de 10% – correspondente às perdas acumuladas desde 20 de fevereiro até à última quinta-feira – a um valor acima de 60 trillions que se estima seja capitalização bolsista global.
No entanto, mesmo que tenhamos “um ano duro pela frente” convém não esquecer que os fundamentais das cotadas em bolsa (sociedades cotadas) devem resistir a choques que podem durar um ano (como é a crise atual), pois as bolsas também recuperaram da crise financeira que começou com o escândalo Lehman Brothers, notava Jeremy Siegel, professor de Finanças na Wharton School, em declarações ao Market Watch (CNBC).
Neste contexto, o Wall Street Journal recordava que, as ações das seguradoras foram uma boa aposta de investimento na última década, precisamente por causa do enquadramento proporcionado pelo Obamacare. Nos últimos 10 anos, valores como a UnitedHealth (maior seguradora do mundo), Centene, Cigna, Humana e outras superaram em centenas de pontos percentuais o desempenho capitalista do S&P 500, o índice de base setorial mais alargada no mercado de Wall Street.
Mas como dizia Horn, o retorno das carteiras de investimento das seguradoras estão muito alinhadas com o comportamento dos mercados de capitais. Quando os mercados caem, as ações das companhias acompanham a tendência.
Entre as seguradoras cotadas em Nova Iorque, a United Health – cuja capitalização bolsista ronda 241 mil milhões de dólares, a perda semanal superou 14%. Entre as do ramo Saúde, Cigna, HCA Healthcare, CVS-Aetna e a UnitedHealth lideram a desvalorização acumulada na semana, com variações negativas em torno de 14%. No ramo Vida, Prudential, Primerica e Manulife caíram dois dígitos. Metlife, AIG (presente em Vida e P&C) e Aflac acumulam descidas próximas de 10%. Em Património e Danos, o grupo de companhias como a Allstate, Chubb, Harford e Travelers Company compõe o ramo menos atingido da indústria, sinalizando descida entre cerca de 3% e 7% nas primeiras quatro sessões da última semana de fevereiro.
O que os mais pessimistas designaram de sell-off (venda desenfreada de posições) – mas que também pode constituir oportunidade -, acentuou-se nos últimos dois dias da semana refletindo quedas fortes em todas as latitudes, de Nova Iorque à Ásia, passando pela Europa. Na quinta-feira (27), o pior dia da semana, o seletivo industrial Dow Jones protagonizou uma queda histórica de quase 1 200 pontos, até agora um recorde por conta do Covid-19.
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