Falta de eletrificação nos portos prejudica qualidade do ar em Portugal, diz TdC
Bruxelas quer portos europeus a abastecerem energia elétrica ao navios quando estão atracados, para reduzir emissões poluentes. Em Portugal, o Governo ainda não publicou a devida regulamentação.
À exceção de Sines, os portos portugueses não estão ainda preparados para a eletrificação da economia e para desempenharem o seu papel na transição energética. De acordo com uma auditoria levada a cabo pelo Tribunal de Contas à Qualidade do Ar em Portugal, e divulgada esta sexta-feira, no Douro, Leixões, Viana do Castelo, Lisboa e Algarve “a preparação dos portos portugueses para a alimentação de eletricidade, a partir da rede de terra, aos navios atracados é insuficiente”.
A insuficiência tem sobretudo em conta que os navios atracados — especialmente os grandes navios de cruzeiro — são uma importante fonte de poluição atmosférica. Diz o relatório final da auditoria que, em oito horas de permanência no porto, um cruzeiro emite 1,2 toneladas de óxidos de azoto e 30 kg de partículas em suspensão, o que equivale às emissões de, respetivamente, 10.000 e 6.000 automóveis num percurso entre Paris e Berlim.
Em causa, diz o documento, está o facto de o Governo não ter ainda publicado a respetiva regulamentação. “Apesar de o Decreto-Lei nº 60/2017 estabelecer que as instalações destinadas ao fornecimento de eletricidade ao transporte marítimo devem obedecer a especificações técnicas estabelecidas em despacho do Diretor-Geral de Energia e Geologia, ainda não foi publicada essa regulamentação, não tendo a Direção-Geral de Energia e Geologia desenvolvido qualquer ação nesta matéria”, refere o Tribunal de Contas. A DGEG não forneceu informação durante a auditoria nem fez uso do seu direito de contraditório.
“Apesar das elevadas emissões de poluentes atmosféricos pelos navios nos portos, dos problemas técnicos que o fornecimento de eletricidade aos navios implica para a rede de distribuição de eletricidade e do calendário estabelecido, a situação em Portugal não tem um desenvolvimento relevante”, refere o Tribunal de Contas.
A exceção à regra é Sines. A administração dos Portos de Sines e Algarve, além da verificação do cumprimento da legislação relativa aos teores de enxofre dos combustíveis e dos equipamentos para limitação de emissões dos navios, monitoriza também a qualidade do ar e tem em curso a elaboração de uma avaliação na área de influência do porto de Sines. Ali está já em curso a construção de duas linhas elétricas de alta tensão (60kV) para alimentação da nova subestação, que virá multiplicar por seis a capacidade atual. Os projetos de Ampliação do Terminal XXI (3.ª fase) e do novo Terminal Vasco da Gama preveem já a construção de infraestruturas próprias que permitem a instalação de sistemas para fornecimento de eletricidade, a partir de terra, aos navios atracados ao cais.
Cruzeiros atracados em Lisboa deixarão de usar gasóleo em 2022
Posição diferente tem a Administração do Porto de Lisboa (APL), alegando no contraditório enviado ao Tribunal de Contas que “o contributo do transporte marítimo tem uma expressão reduzida na emissão de partículas e de óxidos de enxofre, quando comparado com outros setores”, e que a eletrificação dos portos só garante a melhoria da qualidade do ar ao nível local. Em curso está uma consulta pública promovida pela Comissão Europeia para rever a diretiva de 2014, depois de os portos marítimos europeus terem dito que a obrigatoriedade da eletrificação acarreta “elevados investimentos necessários para preparação dos navios e para extensão das redes de distribuição e o custo da energia elétrica”.
A Câmara Municipal de Lisboa anunciou recentemente que os navios de cruzeiros vão deixar de poder utilizar gasóleo quando atracarem na cidade, a partir de 2022, através da solução Shore-to-ship, implementada no Porto de Lisboa para a alimentação elétrica dos navios atracados. “Conseguimos chegar anteontem [quarta-feira] a acordo com o Porto de Lisboa para que os cruzeiros a partir de 2022 não usem gasóleo quando atracam em Lisboa. Portanto, que haja eletrificação do porto para não haver poluição atmosférica”, disse o vereador Sá Fernandes.
Já a administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo, tem a decorrer um estudo sobre eletrificação focado na via navegável do Douro mas que também abordará Leixões, centrado sobretudo no gás natural liquefeito. O objetivo é criar um roadmap para a transição energética nos portos, onde os sistemas onshore power supply estarão incluídos.
Às administrações dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo, do Porto de Lisboa e dos Portos de Sines e Algarve, o Tribunal de Contas recomenda que “zelem pelo fornecimento de eletricidade ao transporte marítimo a partir da rede terrestre”
Há 14 anos, logo 2006, a Comissão Europeia recomendou aos Estados-Membros que ponderassem a instalação de sistemas de ligação à rede elétrica terrestre para alimentação dos navios atracados nos portos e que sensibilizassem as autoridades marítimas e portuárias para o abastecimento de eletricidade aos navios a partir da rede de terra (onshore power supply). Em 2014, uma diretiva da UE relativa à criação de uma infraestrutura para combustíveis alternativos, veio ditar a avaliação do fornecimento de energia elétrica nos portos, “até 31 de dezembro de 2025, exceto se não houver procura e se os custos forem desproporcionados em relação aos benefícios ambientais”.
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