Há pelo menos dez entidades a fiscalizar os milhões de Bruxelas
Agência da Coesão, que controla a aplicação dos fundos europeus tem um protocolo de colaboração com o DCIAP. Tribunal de Contas (nacional e europeu), assim como a IGF, fazem auditorias aos fundos.
Com o aproximar da data em que a Comissão Europeia deverá “passar um cheque” de 57 mil milhões de euros a Portugal vão-se multiplicando os alertas para evitar riscos de fraude e corrupção na utilização dos fundos europeus. Da direita à esquerda, passando pela própria Comissão Europeia, todos têm sublinhado a importância de “assegurar que o dinheiro do orçamento europeu e da Próxima Geração UE está protegido contra qualquer tipo de fraude, corrupção e conflitos de interesse”, nas palavras de Ursula von der Leyen.
O retrato mais recente foi feito pela própria Polícia Judiciária no qual revelava que, nos últimos anos, o conjunto de fraudes detetadas com fundos comunitários rondaria os 2,3 mil milhões de euros, sendo que indústria e formação profissional seriam responsáveis pela maior quota deste montante. Por outro lado, o Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF), que deteta o uso fraudulento dos fundos europeus, concluiu, o ano passado, dois inquéritos relativos a Portugal e, em ambos os casos, emitiu recomendações que, no entanto, não são conhecidas.
Estes são apenas dois exemplos dos resultados obtidos pelos controlos já existentes na aplicação dos fundos e que envolvem cerca de dez entidades: autoridades de gestão dos programas operacionais, a Agência para o Desenvolvimento e Coesão (AD&C), a Inspeção Geral de Finanças, a Polícia judiciária, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal, o Tribunal de Contas nacional e Europeu, a própria Comissão Europeia e o Organismo Europeu de Luta Antifraude. Além disso, são encomendadas auditorias ex-ante e ex-post a auditoras independentes.
Ainda assim, o líder do PSD, por exemplo, quer mais e fez propostas concretas nesse sentido. “Temos de cuidar de conseguir que os fundos sejam aplicados sem corrupção, porque sabemos que quando temos muito dinheiro para gastar em muito pouco tempo estamos a correr um risco tremendo em matéria de corrupção”, afirmou Rio durante a apresentação do “Programa Estratégico dos Fundos Europeus para a Década”. Um programa onde sugere a criação de uma entidade própria na dependência do primeiro-ministro para coordenar os fundos europeus e o programa de recuperação.
“Se é um observatório para esse efeito, se é uma lei penal agravada, se é um departamento especial da Procuradoria-Geral da República, se é tudo isto ao mesmo tempo ou alguma coisa melhor não sei, mas temos de ter essa estratégia”, que evite a corrupção na aplicação dos fundos.
Para já no terreno existem as regras definidas pela própria Comissão Europeia. “Os regulamentos da União Europeia que estabelecem, designadamente as normas comuns aplicáveis aos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI), bem como os que se destinam a garantir a boa execução do orçamento da União, preveem um conjunto de mecanismos destinados a garantir uma correta aplicação dos apoios, consagrando, juntamente com a legislação nacional de cada Estado-membro, um conjunto de organismos e de mecanismos e procedimentos que visam garantir que os mesmos são aplicados segundo as regras com base nas quais foram concedidos”, explicou ao ECO fonte oficial da Agência para o Desenvolvimento e Coesão.
Balizados por estas regras são feitas verificações de acompanhamento asseguradas pelas autoridades de gestão dos diversos programas operacionais, são feitas auditorias pela própria Agência de Coesão. Por outro lado, a Inspeção Geral de Finanças também supervisiona a aplicação dos fundos e leva a cabo as suas próprias auditorias. Realizam-se ainda missões da Comissão Europeia e do Tribunal de Contas Europeu, para além da intervenção do Tribunal de Contas Nacional.
“Encontram-se ainda implementados pela AD&C mecanismos/procedimentos de controlo, um sistema de idoneidade, fiabilidade e dívidas das entidades apoiadas, bem como circuitos de análise e tratamento de denúncias sobre alegadas utilizações ilícitas dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI)”, refere a mesma fonte oficial da Agência.
Depois, a estes mecanismos acresce “a colaboração que vem sendo mantida com a Polícia Judiciária e o Ministério Público”, através da partilha de informação relevante referente a operações, mas também da afetação de técnicos para a participação direta em processos que se encontrem em investigação, na qualidade de especialistas e/ou de peritos.
Foi no âmbito desta colaboração que, em novembro de 2019, foi celebrado entre AD&C e o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) um protocolo de colaboração com o objetivo de melhorar a articulação entre os serviços, designadamente no âmbito da troca de informação relevante relacionada com operações apoiadas pelos FEEI e entidades candidatas ou beneficiárias que sejam objeto de processos de natureza criminal.
“Este protocolo visa, por um lado, identificar o tipo e a natureza da informação referente às operações apoiadas pelos FEEI e as entidades candidatas ou beneficiárias que se afigurem pertinentes para o exercício das funções de investigação criminal do DCIAP, como permitir à Agência um acompanhamento mais próximo do andamento dos processos em investigação, com vista à mobilização, em tempo útil e articulada com os interesses da investigação, dos procedimentos administrativos destinados a garantir a boa execução dos apoios”, explica a mesma fonte oficial que garante que “a identificação e correção de eventuais atuações passíveis de consubstanciarem a prática dos crimes de fraude na obtenção de subsídio e de desvio de subsídio, envolvendo a utilização de apoios dos FEEI, sempre foi identificada” pela Agência como “uma área prioritária”.
E se inicialmente a agência funcionava com base em “circuitos informais de partilha de informação relevante”, com a assinatura deste protocolo em 2019 foi possível sistematizar e centralizar a informação ao nível dos órgãos de investigação e dotar as autoridades administrativas responsáveis pela gestão dos apoios de informação relevante e atempada de modo a que possam reagir administrativamente contra as situações irregulares.
“Desde a sua criação, em 2014, que esta Agência tem vindo a implementar e a desenvolver um conjunto de procedimentos de acompanhamento e controlo na aplicação dos Fundos, no sentido de detetar e antecipar eventuais utilizações irregulares e/ou ilícitas, sempre numa perspetiva de melhoria continua e em estreita colaboração com os órgãos de investigação criminal”, garante fonte oficial da Agência.
O nível de controlo dos fundos europeus levou ainda a Comissão Europeia a estabelecer um contrato de confiança com a IGF em 2007, que foi renovado em 2012 e 2014. Só a Suécia beneficiou de um contrato semelhante.
Mas há sempre espaço para fazer mais e, por isso, a Procuradoria-Geral da República (PGR) criou, no final de agosto, um grupo de reflexão (think tank), para combater e prevenir fraudes com fundos europeus. Ao longo de dois anos, magistrados do Ministério Público, representantes da PGR, da OLAF, do Tribunal de Contas, do Banco de Portugal, da PJ, da Inspeção-Geral de Finanças, da AD&C entre outros, vão tentar identificar “áreas de elevado risco de comportamentos fraudulentos”, “linhas orientadoras de prevenção de fraude na gestão e controlo de fundos europeus” e “metodologias de ação ajustadas a comportamentos fraudulentos”.
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