“Falha” pode prejudicar exportação do hidrogénio de Sines. Governo envia carta a Bruxelas com solução
Portugal identificou uma "falha de mercado" na Estratégia da UE para o hidrogénio: sem apoios transfrontreiriços os projetos serão pequenos e para consumo interno. A exportação fica posta em causa.
O secretário de Estado da Energia, João Galamba, revelou que o Governo português identificou uma “falha de mercado” na Estratégia Europeia para o Hidrogénio Verde, o que pode prejudicar os planos nacionais de exportação deste gás renovável para o norte da Europa no futuro. Para evitar esse cenário, o ministro do Ambiente e da Ação Climática, Matos Fernandes, vai assinar uma carta que será enviada para Bruxelas ainda esta semana, expondo o problema e sugerindo uma solução.
A carta será endereçada ao Vice-Presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, e aos comissários europeus da Energia Kadri Simson, e do Mercado Interno, Thierry Breton. Na missiva, Portugal explica que a “falha de mercado” identificada na Estratégia Europeia para o Hidrogénio se prende com a ausência de apoios transfronteiriços. Ou seja, Bruxelas valoriza as parcerias entre Estados-membros para o hidrogénio e as respetivas cadeias de exportação e importação entre países do sul e do norte da Europa, reconhecendo ao mesmo tempo a necessidade de apoios públicos, mas prevê apenas esses apoios a nível nacional.
Problema? Se Portugal subsidiar com o seu dinheiro público a produção de hidrogénio em Sines e o gás renovável depois for exportado para a Holanda ou para outro país, quem importar esse hidrogénio sairá beneficiado. E Portugal prejudicado.
À Comissão Europeia o Governo vai propor agora que “sejam os países do norte da Europa a investir nos países do sul para produzirem hidrogénio verde, contabilizando esse mesmo investimento na sua quota de renováveis. E Portugal, que no passado teve um sobrecusto com as renováveis, tem agora uma vantagem maior ainda porque vão ser os outros países a investir na nossa descarbonização e não o contrário”, tinha já avançado Matos Fernandes em entrevista ao ECO/Capital Verde na conferência “Portugal na Vanguarda do Hidrogénio Verde na Europa”.
“Não há nenhum apoio de natureza transfronteiriça para subsidiar cadeias de exportação e importação de hidrogénio na Europa. É nisso que Portugal está a trabalhar e esta semana vamos enviar à Comissão Europeia uma carta com uma proposta”, revelou agora Galamba num webinar organizado pela APREN – Associação de Energias Renováveis e pela AP2H2 – Associação Portuguesa para a Promoção do Hidrogénio.
O ECO/Capital Verde sabe que este “problema” da falta de um mecanismo de apoio transfronteiriço está já em cima da mesa das negociações no projeto H2Sines, do consórcio EDP, Galp/REN/Martifer/Vestas, entre os produtores portugueses de hidrogénio verde, que querem estabelecer já um preço de venda mais caro, e os compradores do lado holandês, que por seu lado se batem por um preço de compra em euros por kg de hidrogénio mais barato. Quem paga a diferença?
“O preço a que os produtores quererão vender o hidrogénio não se enquadra com o preço a que os consumidores o quererão comprar. Por isso são necessários apoios públicos. Isso é reconhecido por todos, faz parte da Estratégia Europeia e da Estratégia Nacional. Mas há uma falha de mercado, porque todos os apoios são de natureza nacional. Ou seja, Portugal apoiará os seus projetos de produção, o seu consumo interno, viabilizando a relação entre produtores e consumidores nacionais, mas não subsidiará a exportação de hidrogénio nem o preço de venda para a Holanda, para a Alemanha ou para qualquer outro país europeu”, disse Galamba no encerramento do webinar da APREN, alertando para o risco de “subdimensionamento de todos os projetos de hidrogénio na Europa”.
“Serão apenas de consumo local e não de exportação, porque nenhum Estado quererá subsidiar a utilização de hidrogénio verde por outro país. Por exemplo, em Sines a dimensão de exportação depende da concretização de acordos internacionais de exportação. Há um conjunto de projetos em Portugal que precisam mesmo deste mecanismo transfronteiriço para arrancar. É da maior importância para o nosso país mas também pata toda a Europa, para criar complementaridade entre países do sul e os países do norte. A produção de hidrogénio existe em todo o lado, mas está mais concentrada a sul, por disponibilidade de recursos renováveis”, explicou ainda Galamba.
Na visão do secretário de Estado da Energia, a melhor solução era um mecanismo de leilões gerido pela Comissão Europeia no qual este sistema de apoio estaria disponibilizado para qualquer projeto e qualquer país, e aí venceriam os mais competititivos.
“Em 2030 prevemos que Portugal possa ter entre 2 a 2,5 GW de capacidade instalada de eletrolisadores”, disse ainda João Galamba. Bruxelas quer mais e já veio dizer que a ambição para Sines tem de ser muito maior, tendo mesmo chegado a pedir a Portugal para pensar num projeto de larga escala, na ordem dos 5 GW (em vez de 1 GW), sabe o ECO/Capital Verde.
Em relação ao aviso de 40 milhões de euros, no âmbito do POSEUR, que foi avançado pelo ministro do Ambiente e da Ação Climática Matos Fernandes, ao ECO/Capital Verde — que está a ser finalizado e que será aberto ainda neste mês de dezembro de apoio à produção de hidrogénio — o Governo vai privilegiar projetos integrados, com produção, transporte, distribuição e consumo. De acordo com Galamba, vai ser dada prioridade a projetos de autoconsumo, individual ou coletivo, ou comunidades de energia, que tenham como objeto o hidrogénio.
“No mercado português, as prioridades de utilização são a indústria e os transportes. Os projetos integrados vão ser uma prioridade. O responsável da Caetano Bus referiu que um dos grandes entraves à expansão dos autocarros a hidrogénio em Portugal é a ausência de postos de abastecimento, mas entendemos que não é assim que vamos lá, mas sim com a produção integrada com o abastecimento e o consumo. Só olhando para a cadeia completa. Têm de surgir os três projetos ao mesmo tempo”, rematou Galamba, anunciando ainda que “no aviso haverá uma majoração para os projetos que integrem as diferentes fases da cadeia de valor. É a melhor maneira de sair do papel e passar ao terreno”.
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