Inquérito ao Novo Banco: O “mistério” das dívidas ao BES que aumentaram 600 milhões em seis meses
Mariana Mortágua lançou o "mistério" ao ex-vice-governador do Banco de Portugal: porque é que a exposição do Novo Banco aumentou 600 milhões em seis meses, em 2014, entre as avaliações da PwC e da EY?
Os termos foram colocados desta forma pela deputada Mariana Mortágua. “Talvez me ajude a desvendar um mistério”, disse a deputada do Bloco ao ex-vice-governador do Banco de Portugal, Pedro Duarte Neves, em mais uma audição da comissão de inquérito ao Novo Banco que está a ter a lugar na Assembleia da República. “Temos o relatório da PwC que analisou as grandes exposições de crédito do BES e do Novo Banco a 3 de agosto de 2014. E temos um relatório da EY que analisou essas mesmas exposições a 31 de dezembro de 2014. Gostaria de saber, por exemplo, porque é que no relatório da PwC a exposição da Martifer era de 281 milhões de euros, mas a EY, seis meses depois, diz que a exposição é de 556 milhões”, questionou Mariana Mortágua.
“O mesmo acontece noutros casos: por exemplo, a exposição de José Berardo a 3 de agosto era de 282 milhões e 31 de dezembro era de 308 milhões, a exposição de José Guilherme a 3 de agosto era de 137 milhões, a 31 de dezembro era 262 milhões. A exposição da Promovalor, em agosto, era de 304 milhões, em dezembro era de 487 milhões”, prosseguiu a deputada.
“Não sei”, respondeu Pedro Duarte Neves. “Por que é que há esse salto, não lhe sei responder“, acrescentou.
Mariana Mortágua questionava o ex-responsável do Banco de Portugal sobre se os ativos que foram transferidos para o Novo Banco na sequência da resolução do BES tinham sido corretamente avaliados. Neste período, o banco veio a precisar de registar imparidades de 600 milhões de euros por causa de perdas com empréstimos problemáticos, notou a deputada. Muitos destes créditos foram posteriormente incluídos no perímetro do acordo de capital contingente e deram origem a perdas que tiveram de ser cobertas pelo Fundo de Resolução nos últimos anos. Perguntas da deputada: Houve erros no balanço inicial do Novo Banco e a capitalização de 4,9 mil milhões foi subavaliada?
“O exercício da PwC foi um exercício completamente independente, foi desenvolvido pelos auditores, levou a um balanço aprovado pelo conselho de administração do Novo Banco e basicamente levou a uma confirmação das necessidades de capital calculada no dia 3 de agosto”, respondeu Pedro Duarte Neves, lembrando que o conceito de imparidades é um “conceito dinâmico” e que evolui com o tempo e consoante o contexto de capacidade de pagamento dos devedores.
Duarte Neves recordou que o supervisor tinha acabado de fazer um exame transversal aos créditos dos bancos no âmbito do ETRIC 2. “O que foi feito, e que foi inovador, foi fazer uma avaliação da capacidade de financiamento das empresas, olhando para o seu modelo de negócio”, explicou. “Nessa altura houve uma avaliação exigente [dos créditos] e houve um reforço de imparidades. E não foi tão longe da resolução quanto isso“, sublinhou o antigo vice-governador do Banco de Portugal.
Ao longo da sua intervenção, Duarte Neves fez questão se dizer que as decisões foram tomadas com a informação disponível e que o mesmo se passou com a avaliação dos créditos. “A carteira de crédito foi avaliada de acordo com uma avaliação prudente dos ativos”, chegou a assegurar.
Pedro Duarte Neves confirmou ainda que o Banco de Portugal defendeu que o Novo Banco fosse capitalizado em cerca de 5,5 mil milhões euros numa reunião no Ministério das Finanças na manhã do dia 3 de agosto de 2014, o dia da resolução do BES. Nessa reunião participaram vários intervenientes, incluindo um representante da DG Comp. “O número [da capitalização do Novo Banco] não ficou fechado nessa reunião. A questão [dos 5,5 mil milhões] tinha a ver com a margem de buffer de capital. Há regras de numa situação destas usar os fundos mínimos que são precisos e foi nessa base que se convergiu para os 4,9 mil milhões”, explicou Duarte Neves.
Com esta capitalização, o banco abriu o balanço em agosto de 2014 com um rácio de capital de 9,2%. “Os 5,5 mil milhões davam margem maior, mas não eram estritamente necessários”, frisou o ex-vice-governador.
“Nota não me foi submetida”
Pedro Duarte Neves foi ainda confrontado com uma nota interna produzida em 2011 pelos técnicos do Banco de Portugal em que surgiam alertas sobre a complexidade do GES que dificultava a sua fiscalização. Costa Pinto, citando o relatório que avaliou a atuação do supervisor no BES, disse que esse documento foi ignorado. “Defendo a nota como se a tivesse feito, mas a informação de que a recebi não é correta”, precisou o antigo vice-governador.
“A hierarquia [o diretor do departamento, na altura Vasco Pereira] validou essa nota, mas não me foi submetida. Tive conhecimento posterior dessa informação, possivelmente depois de 2014″, concretizou Duarte Neves, assegurando que essa nota não teve teve impacto na atuação do Banco de Portugal do BES.
Face a esta informação, o PSD, pela voz da deputada Sofia Matos, informou que vai apresentar um requerimento para chamar Vasco Pereira a depor. Os sociais-democratas anunciaram também que vão apresentar um pedido para ter a ata da reunião com a DG-Comp sobre a recapitalização do Novo Banco.
Duarte Neves rejeitou ainda polémica com o regresso de Luís Costa Ferreira e Pedro Machado ao Banco de Portugal, depois de uma passagem pela auditora PwC. “Têm características perto de ser únicas, com bagagem profissional excelente. Eles regressarem é uma mais-valia para o Banco de Portugal”, afirmou
(Notícia atualizada às 20h01)
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