“Capitalização pública estava disponível e nenhum pedido foi apresentado”, diz Maria Luís Albuquerque sobre a resolução do BES
Ex-ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque garante que não foi feito qualquer pedido de capitalização pública do BES em 2014. Lembra que a linha da troika tinha 6,4 mil milhões de euros.
A recapitalização pública do Banco Espírito Santo (BES) era uma possibilidade prevista na lei e havia uma linha disponível para que fosse feito, mas nenhum pedido foi apresentado. A garantia é dada pela ex-ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, numa audição parlamentar esta quinta-feira no âmbito do inquérito ao Novo Banco.
“A linha de capitalização pública estava disponível e nenhum pedido foi apresentado“, diz Maria Luís Albuquerque. Questionada sobre se a recapitalização pública foi discutida, respondeu: “Não foi. Havia essa possibilidade prevista na legislação, mas nunca foi discutida com o Governo”. A linha da troika tinha 6,4 mil milhões de euros.
A social-democrata era a ministra das Finanças em funções quando, no fim de julho de 2014, as dificuldades do BES tornavam inevitável a rutura. Nos dias que se seguiram à apresentação de resultados, Governo, Banco de Portugal e a gestão do banco tiveram vários encontros em que Maria Luís Albuquerque relata ter informado Vítor Bento (que liderou o BES e mais tarde o Novo Banco após a saída de Ricardo Salgado) sobre a legislação disponível.
“Os moldes em que Vítor Bento estaria a pensar numa recapitalização pública já não era a legislação em vigor“, explica, relatando que uma opção como a do Banif, por exemplo, já não existia devido à mudança na lei bancária europeia. A recapitalização ou a resolução teriam as mesmas consequências para acionistas ou credores subordinados.
Por outro lado, para os contribuintes, a nacionalização “teria multiplicado os custos não sei quantas vezes” e teria de estar sujeito às regras de auxílios de Estado. “A ideia de que era possível pôr-se dinheiro público para que ficasse lá muitos anos à espera que ganhasse valor era uma ideia romântica. Não era possível“. Explicou que foi feita uma estimativa aos custos da liquidação face ao impacto da resolução, não tendo sido calculada qualquer outra opção.
Finanças não validaram valor da resolução
Ao longo desse fim de semana, há uma série de reuniões e o Banco de Portugal viria a comunicar ao Governo que seria aplicada a medida de resolução. “Nessa altura não me ocorreu perguntar-lhe qual o valor necessário“, diz. “Nunca poderia dizer que sim ou não ao valor apurado”, garante. “Nunca estabeleci um teto ao valor, nem tinha condições para o fazer. Não estabeleci nenhum patamar máximo, a única coisa que me lembro de dizer é que era muito dinheiro“.
Após uma estimativa que apontava para um intervalo entre 5 e 5,5 mil milhões de euros, o valor da resolução foi colocado nos 4,9 mil milhões de euros. “Achei que era muito dinheiro”, aponta, mas rejeita que o Governo tenha tido qualquer influência na decisão relativa ao montante. Sobre a possibilidade de não ter havido “vontade política” para um valor mais alto, diz: “a interpretação política que foi feita a mim não me responsabiliza”.
"Nunca estabeleci um teto ao valor, nem tinha condições para o fazer. Não estabeleci nenhum patamar máximo, a única coisa que me lembro de dizer é que era muito dinheiro.”
Não só não discutiu o valor como não participou na divisão entre ativos bons e maus, que sublinha ser responsabilidade do Banco de Portugal e rejeita que o Governo devesse ter controlado de forma mais próxima as contas. “Eu não discuti o valor porque o Ministério das Finanças não participa na separação dos ativos e dos passivos. Não tem qualquer possibilidade de participar nessa separação ou nessas contas”.
“Quando se faz uma resolução num fim de semana, não há tempo para fazer avaliações de ativos“, refere. A ex-ministra diz ainda nunca ter sido contactada sobre insuficiências na situação de capital, sublinhando que o balanço de abertura só foi fechado em dezembro pelo que o Novo Banco não chegou a incumprir com os rácios em capital. “Não fui contactada em agosto ou posteriormente sobre essa a matéria”.
Nesta segunda fase de inquérito, que se segue à fase de resolução, os deputados procuram apurar o que falhou na primeira tentativa de venda do banco, em 2015, ou seja, um ano depois da resolução (sendo que o prazo de venda era de dois anos). Chegou a haver sete bancos na corrida, mas a crise nos mercados asiáticos e as preocupações com a Grécia nesse verão levou o negócio a cair, segundo Maria Luís Albuquerque.
“Lamentavelmente não aconteceu”, diz, garantindo que nunca teve acesso às propostas e respetivas condições. “O que o Banco de Portugal me comunicou é que face ao grande interesse e à diminuição das incertezas externas e internas, haveria condições para relançar o processo de forma bem-sucedida. Esperava sinceramente que, no início desse processo de venda, fosse possível fazê-lo”.
O prolongamento do prazo de venda nunca foi pedido pelo Governo pois “um banco de transição deve ser vendido o mais rápido possível”, de acordo com a ex-governante. “Não tem acionista, tem muitas restrições à sua atividade. É, em termos práticos, um banco sem dono, que não tem um acionista que defina uma estratégia”.
(Notícia atualizada às 13h30)
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
“Capitalização pública estava disponível e nenhum pedido foi apresentado”, diz Maria Luís Albuquerque sobre a resolução do BES
{{ noCommentsLabel }}