Mais de 70% dos portugueses estão disponíveis para requalificação profissional. “Esta é a maior alavanca para criarmos soluções”
Segundo o "Workforce Protection", a vontade dos profissionais portugueses de aprenderem novas skills é maior do que na maioria dos países. Mas é preciso que empregadores e Governo trabalhem juntos.
Com a pandemia mundial a impulsionar a digitalização do mercado laboral, a necessidade de requalificação profissional é ainda maior. E, pelo menos os profissionais portugueses, estão dispostos a aprender novas skills que lhes permitam ter acesso a um conjunto maior de oportunidades no futuro do trabalho. Mais de 70% afirma que estaria disposto a fazer uma requalificação profissional, de acordo com o estudo global Workforce Protection, elaborado pelo grupo Zurich em conjunto com a Universidade de Oxford, e divulgado esta terça-feira.
A percentagem apurada em Portugal (72%) está significativamente acima da média da amostra, que se situa nos 63%. Segundo a Zurich, os trabalhadores portugueses em funções criativas baseadas no conhecimento são os mais empreendedores neste aspeto (74%), enquanto os trabalhadores que desempenham tarefas manuais rotineiras estão um pouco menos dispostos (69%) a abdicar do seu tempo livre para adquirir novas competências profissionais. A solução passa por sensibilizar, antes mesmo de criar regras, bem como por trabalhar em conjunto.
“Mais do que disponíveis para fazer esta requalificação, a generalidade dos portugueses ativos consideram-na necessária. E a pandemia também ajudou a clarificar isso mesmo”, começa por dizer Nuno Oliveira, diretor de recursos humanos da Zurich Portugal, em conversa com a Pessoas. “Esta é a maior alavanca que podemos ter para darmos resposta e criarmos soluções que vão ao encontro das necessidades”, acrescenta.
No entanto, para o responsável de RH da companhia de seguros e também porta-voz do estudo em causa, trabalhar em conjunto é fundamental para o sucesso de qualquer iniciativa de requalificação. “As pessoas, entidades públicas ou privadas, podem definir planos de atuação, mas, se o fizerem de forma concertada e em conjunto, vão seguramente ser muito melhor sucedidas“, considera.
“Esta pandemia está a reforçar que, do ponto de vista privado, se tomem medidas que preparem melhor as empresas — que são as pessoas — para aquilo que é de facto necessário, em articulação com a vertente pública, com o Governo e com todas as estruturas existentes. Só assim será possível termos uma perspetiva mais agregada de toda a situação, só se ‘dividirmos o mal pelas aldeias’, no sentido de aumentar a probabilidade de que as coisas funcionem”, continua.
Trata-se, portanto, de um triângulo, em que no topo estão as pessoas (que já demonstraram estar disponíveis para a requalificação), e nos outros vértices estão as empresas, que têm os mecanismos, processos, estruturas e know–how, e o Governo e entidades públicas, que têm a robustez que pode ajudar a alcançar o tal know-how e expertise das empresas. Esta é a opinião de Nuno Oliveira, que frisa que tanto os governos como os empregadores poderão desempenhar um papel fundamental na informação aos trabalhadores sobre os riscos para os seus atuais empregos e as oportunidades disponíveis.
"Requalificação não passa, necessariamente, por deixarmos de fazer aquilo que estamos a fazer hoje ou aquilo que muitos de nós já fazemos há algum tempo, passa acima de tudo por fazermos aquilo que até aqui temos vindo a fazer de uma determinada forma, de uma maneira completamente diferente.”
O primeiro passo é “reconhecer que todos nós vamos precisar da requalificação”, o que não implica, obrigatoriamente, uma reconversão profissional. “Requalificação não passa, necessariamente, por deixarmos de fazer aquilo que estamos a fazer hoje ou aquilo que muitos de nós já fazemos há algum tempo, passa acima de tudo por fazermos aquilo que até aqui temos vindo a fazer de uma determinada forma, de uma maneira completamente diferente”, explica.
Menos regras, mais flexibilização
Nuno Oliveira recorda também que, num cenário de requalificação, mais do que a seleção de talento, é preciso investir na sensibilização. “O talento, muitas vezes, está lá. As empresas é que não estão suficientemente disponíveis e sensíveis para criarem as oportunidades necessárias para que esse talento se manifesta” e esse, na sua opinião, é um fator diferenciador que leva à requalificação. “O estudo mostra que existe a predisposição, já existem as condições porque temos as estruturas e o know-how, há que criar as soluções”, refere.
Na prática, essas soluções, tal como todo o futuro do trabalho, passam pela flexibilização. Menos regras, mais personalização e flexibilidade. “Quando começámos a trabalhar nas nossas políticas de flex work, fizemos a validação do ponto de vista jurídico. Um feedback que nos foi dado pelos nossos colegas e parceiros da área jurídica foi que nós estávamos a querer definir demasiadas regras e, simultaneamente, o nome da política era flex work. Isto não deixa de ser contraditório. Se queremos adotar políticas flexíveis, mas, simultaneamente, queremos definir todo o tipo de regras e mais algumas, o espírito inicial que era o da flexibilidade deixa de existir”, recorda.
Por isso mesmo, a Zurich está focada em adotar um modelo híbrido em todo o sentido, cujas políticas se adaptam às características e necessidades de cada um. Tal traduzir-se-á nos horários e modelos de trabalho, mas também na questão da requalificação. Por isso mesmo, o responsável de RH admite não ser muito adepto de modelos como o da semana de trabalho dividida em horas ou dias de produção e de aprendizagem. “Não estamos tão crentes de que a solução passará por definir regras claras e concretas, passa sim por criarmos a tal sensibilidade”, afirma Nuno Oliveira.
Proteção social como facilitador da transição entre carreiras
Outras das principais conclusões do estudo “Workforce Protection” está relacionada com a proteção social. “Investigações sobre recessões passadas sugerem que aqueles que perdem os seus empregos terão um salário 12% mais baixo quando acabarem com encontrar um novo trabalho. O subsídio de desemprego é muito importante para facilitar a mudança entre emprego (…) permite que as pessoas disponham de tempo para fazer uma melhor correspondência entre as suas competências e os empregos disponíveis”, pode ler-se no estudo realizado pelo grupo Zurich em conjunto com a Universidade de Oxford.
Sem esse subsídio, defende o estudo, as pessoas são “forçadas” a aceitar o primeiro emprego disponível, prejudicando esse match entre as valências e a oferta. Neste sentido, a proteção social deverá facilitar a transição entre carreiras, apoiando sempre a formação contínua, quer a tempo parcial, quer a tempo inteiro.
Nuno Oliveira concorda com os argumentos do estudo, vê a proteção social como algo “absolutamente fundamental”. “Aliás, uma das formas de tornarmos a nossa economia sustentável é, claramente, diminuirmos os índices de pobreza”, destaca, sendo esta também uma das conclusões da investigação.
“Por um lado devemos ajudar as pessoas a identificar quais são os maiores riscos para, depois, em conjunto, definirmos e desenharmos as soluções, por outro lado, se identificarmos os riscos sem a segunda parte, temos um problema”, diz. “Temos de olhar para esta vertente da proteção social como uma preocupação de todos”, remata o responsável pela gestão de pessoas da empresa.
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