Bruxelas vai votar pacote de medidas ambientais com metas reforçadas
O pacote de medidas ambientais que visa acelerar a descarbonização e reduzir as emissões em 55% até 2030 vai estar em debate esta terça-feira no Parlamento Europeu, e serão votadas no dia seguinte.
O pacote mais ambicioso de medidas que visam acelerar a descarbonização e transição energética no bloco europeu vai estar em debate esta terça-feira no Parlamento Europeu.
As propostas – que variam desde o imposto sobre as emissões de carbono ao impulso sobre as energias renováveis – prometem um debate de algumas horas e centenas de emendas. Caso sejam aprovadas, as medidas terão impacto no dia-a-dia dos europeus e das empresas, desde a como consomem, se deslocam e até ao recurso de materiais mais poluentes como o cimento, fertilizantes ou metal.
“O Fit for 55 vai alinhar as nossas leis com a nossa ambição. Vamos fortalecer o Sistema de Comércio de Licenças de Emissão da União Europeia, atualizar a Diretiva de Tributação de Energia e propor novos padrões de CO2 [dióxido de carbono] para carros, novos padrões de eficiência energética para edifícios, novas metas para energias renováveis e novas formas de apoiar as energias limpas e infraestrutura para transporte limpo”, explicou o Vice-Presidente da Comissão Europeia e o chefe do Pacto Ecológico Europeu (Green New Deal), Frans Timmermans, em maio.
O que está incluído no pacote?
As medidas apresentadas, no ano passado, pelo Conselho Europeu, debatidas esta terça-feira e votadas esta quarta-feira pelos eurodeputados, incluem um conjunto de propostas legislativas e iniciativas políticas desde o ambiente à energia ou transportes, tal como adianta o documento de Bruxelas.
Emissões e transportes
Em cima da mesa estará o Sistema de Comércio de Licenças de Emissão da União Europeia (ETS, em inglês ou CELE em português), que propõe um conjunto abrangente de alterações ao atual programa de emissões poluentes. A sugestão deverá resultar numa redução global das emissões em 61% até 2030, comparativamente a 2005, nos setores responsáveis por cerca de 45% das emissões de gases com efeito estufa (GEE) na União Europeia. São eles os responsáveis pela queima de combustíveis, a refinação de óleos minerais, a metalurgia, a produção de clínquer, cal e vidro, a cerâmica, a pasta e papel, os químicos e a aviação. A proposta a ser debatida prevê que também passem a ser abrangidos os transportes aéreos, marítimos e terrestres e ainda os alojamentos.
Ainda no âmbito dos transportes, destaque para a iniciativa de Combustíveis Sustentáveis para a Aviação (CORSIA, em inglês), que quer passar a incluir os biocombustíveis avançados e eletrocombustíveis no mix energético deste setor, promovendo a sua exploração.
Já para os transportes marítimos, os eurodeputados irão discutir a proposta relativa à utilização de combustíveis renováveis e hipocarbónicos de forma a acelerar a redução de combustíveis fósseis que continuam a prevalecer no setor. Com esta medida, antecipa-se uma redução de 75% da intensidade das emissões de gases com efeito de estufa proveniente da energia utilizada a bordo dos navios, promovendo a utilização de combustíveis mais ecológicos.
Outra das medidas mais sonantes, é a proposta relativa às emissões de dióxido de carbono (CO2) dos automóveis de passageiros e dos veículos comerciais ligeiros. A proposta introduz metas de redução ambiciosas a nível europeu e fixa uma nova meta de 100% para 2035. Na prática, tal implica que, a partir de 2035, deixará de ser possível colocar no mercado na União Europeia (UE) automóveis ou veículos comerciais ligeiros com motor de combustão interna.
Já o Mecanismo de Ajuste de Carbono Fronteiriço, (CBAM, em inglês) pretende, entre outros objetivos, estabelecer um imposto sobre o carbono nos produtos importados, a fim de proteger as empresas europeias que têm de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa até 2030. O mecanismo deverá abranger o aço, o cimento, fertilizantes, alumínio e eletricidade.
Energia e gestão de solos
O pacote inclui também uma nova meta de redução das emissões dos Estados-membros, ou o Regulamento Partilha de Esforços, para setores não abrangidos pelo CELE, nem pelo Regulamento Relativo ao Uso do solo. Assim, a proposta eleva a meta de redução das emissões da UE, nesses setores, de 29% para 40%, até 2030, em comparação com 2005, e atualiza os objetivos nacionais em conformidade.
Ainda no âmbito da gestão dos solos, os eurodeputados vão discutir novas medidas de gestão de emissões e remoção de gases resultantes do uso do solo e da floresta, entre elas, uma meta de remoções líquidas de gases com efeito de estufa de, pelo menos, 310 milhões de toneladas de equivalente CO2 até 2030, que é repartida entre os estados-membros a título vinculativo.
E, como a energia não podia faltar ao debate, o Fit for 55 propõe também aumentar a atual meta a nível da União Europeia de 32% de energia de fontes renováveis no mix energético total para, pelo menos, 40 % até 2030. Além disso, propõe também a introdução ou o reforço de objetivos para aqueles setores que até à data registaram progressos mais lentos na integração das energias renováveis, nomeadamente nos domínios dos transportes, dos edifícios e da indústria.
Também a nível da energia, os eurodeputados vão avaliar a proposta de revisão da atual Diretiva Eficiência Energética do executivo comunitário, e que defende o aumento da meta de eficiência energética da UE de 32,5% para 36% em relação ao consumo final de energia e para 39 % em relação ao consumo de energia primária.
Destaque ainda para o Fundo Social para a Ação Climática, o qual visa apoiar os cidadãos da União Europeia mais afetados ou em risco de pobreza energética ou de mobilidade. O fundo concederá um financiamento de 72.200 milhões de euros durante 7 anos, para a renovação de habitações e edifícios que utilizem mais energias renováveis e sejam mais eficientes do ponto de vista energético.
“Vão haver muitas dificuldades em alcançar as metas”
Ainda que muitos considerem o pacote ambicioso e levante algumas preocupações a nível das exigências que uma transição energética implica, para a associação ambiental Zero é importante destacar um aspeto: os objetivos são insuficientes.
“O nível de ambição advogado não representa uma proporção justa daquilo que deveriam ser os esforços da União Europeia no sentido de cumprir o Acordo de Paris e limitar o aumento global da temperatura a 1,5°C até ao final do século”, explica ao ECO/Capital Verde o dirigente da organização, Francisco Ferreira que, apesar das críticas, reconhece o valor de algumas propostas.
“O CELE para edifícios e transportes é um dos dossiers mais contenciosos, já que tem uma vertente de justiça social subjacente que poderá, dependendo da direção dos votos, ser progressiva ou regressiva”, explica. “É essencial garantir que os custos não sejam passados para os consumidores e que não sejam as famílias mais necessitadas a pagar o preço da poluição das grandes companhias petrolífera”, continua.
Já para o Vogal da direção nacional da Quercus não existem dúvidas: as metas propostas e debatidas, se aprovadas, não vão ser facilmente implementadas. E parte disso deve-se ao conflito militar na Ucrânia.
“Sem querer ser pessimista, creio que vão haver muitas dificuldades em alcançar as metas para 2030, precisamente se não conseguirmos, muito rapidamente, encontrar uma solução para a guerra que existe neste momento”, considerou ao ECO/Capital Verde Carlos Moura, acrescentando que o conflito “não será vantajoso, de maneira nenhuma, para os objetivos de controlar as emissões em 55% até 2030”.
Uma das medidas que abarca mais dificuldades são aquelas que criam obstáculos na relação entre a Rússia e a União Europeia, nomeadamente, aquela que visa aplicar imposto sobre as importações de materiais mais poluentes, uma vez que Moscovo é um dos principais fornecedores.
“Para haver um acordo nesse valor teria que haver uma cooperação mais profunda entre os vários países, nomeadamente, os produtores”, explicou o responsável, repetindo que a atual conjuntura vai dificultar qualquer tipo de avanço nesse sentido.
Para o responsável, as propostas “não são propriamente novidades” e são dificuldades que já tinham sido identificadas mas que “foram arrastadas no tempo sem que fossem tomadas medidas. Temo que qualquer medida tomada já seja um pouco tardia”, frisou.
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