Com a fatura de energia a aquecer, como estão as empresas a reduzir consumos?
Com os custos de energia a subir, as empresas estão atentas à subida da fatura e, algumas, preparam planos de contingência. Regressar a 100% de teletrabalho não parece estar em cima da mesa.
Planos de contingência para responder a eventuais interrupções do gás natural, envolver os trabalhadores em ações que visem reduzir o consumo energético, aposta em parques fotovoltaicos e edifícios mais verdes e a manutenção de modelos híbridos de trabalho são algumas medidas que as empresas estão apostadas para reduzir a sua fatura energética. O regresso ou adoção do teletrabalho – como recomenda o Governo no Plano de Poupança de Energia 2022-2023 – não parece estar em cima da mesa.
Pouco mais de um ano após regressar ao escritório em modelo híbrido, na Vodafone o teletrabalho a 100% não está (para já) a ser equacionado. “Esta recomendação de teletrabalho (do Governo), se houver uma obrigação de fazer como na época da pandemia mesmo, claro que seguiremos, mas é muito saudável para as equipas uma parte do tempo ser presencial”, adianta Luísa Pestana, administradora da Vodafone Portugal com o pelouro dos recursos humanos, infraestruturas, operações de clientes e responsabilidade social.
“O nosso modelo é muito leve, muito flexível e exige, nesta fase, um mínimo de presenças no escritório: dá uma indicação de, em média, oito ou dez dias por mês no escritório, ou seja, em média, duas vezes por semana. Tudo tem a ver um pouco com a dinâmica de trabalho de cada uma das equipas. Cada chefia, com a sua equipa, é que determina qual é o modelo a cada momento, e que até pode variar”, precisa Luísa Pestana, à Pessoas.
O tema energia está na lista de preocupações da operadora ou não fosse esse um dos principais custos operacionais da companhia de telecomunicações. “Os custos de energia nas telecomunicações é um dos custos principais da nossa operação. À medida que adicionamos tecnologias na nossa rede, é mais consumos e, por isso, tem um impacto grande nos custos de uma operadora. Essencialmente um custo grande é o dos ares condicionados para a refrigeração dos equipamentos. Esse é que é o grande bolo, não é tanto os escritórios”, refere.
Esta recomendação de teletrabalho (do Governo), se houver uma obrigação de fazer como na época da pandemia mesmo, claro que seguiremos, mas é muito saudável para as equipas uma parte do tempo ser presencial.
Na companhia estão a ser estudadas “medidas adicionais” de poupança e eficiência energética. “Está a ser construído um plano com iniciativas para serem estudados os seus impactos, quais os riscos associados, que está ainda a ser elaborado e a ser discutido. É uma preocupação os custos de energia, o impacto que têm na rentabilidade das operadoras é significativo”, refere a administradora que tem igualmente sob a sua alçada a área de infraestruturas. Um plano que deverá estar pronto “nos próximos meses”. “Neste momento, estamos a iniciar o ciclo de planeamento para o próximo ano e a fazer as nossas discussões internas, por isso, acho que janeiro”, adianta.
Mas, apesar de os escritórios não representar o grosso da fatura energética, também aí a operadora tem vindo a fazer trabalho na melhoria de eficiência energética, numa altura em que, com o modelo híbrido a ocupação de escritório não está aos níveis pré-Covid.
“Nos escritórios, fomos fazendo ao longo dos últimos anos – também fruto da pandemia – alterações nos espaços, nos check points dos ares condicionados, porque durante muito tempo tivemos escritórios vazios. Hoje ocupamos menos espaço de escritório do que há três anos, porque as equipas não estão em permanência no meu escritório. Pensar na eficiência do espaço é algo que está no top of mind, mas tem que ser feito de forma gradual”, considera a administradora da Vodafone.
Na dona do Meo – onde o regresso ao escritório há mais de um ano também foi feito em regime híbrido –, o tema da redução de custos energéticos está igualmente na agenda. “O contexto geoeconómico e geopolítico, em que estamos inseridos, torna necessária uma reflexão urgente e cautelosa”, começa por comentar fonte oficial da Altice Portugal.
“O cenário de inflação e o aumento generalizado de preços, com destaque para os custos de energia e matérias-primas, tem afetado fortemente todas as empresas e o setor das telecomunicações em particular, na medida em que uma contração económica entra em contraciclo com uma nova fase de investimentos em infraestruturas – incluindo obrigações de cobertura da rede 5G a nível nacional e a constante exigência de reforço de capacidade instalada, decorrente da cada vez maior utilização e tráfego –, neste momento exclusivamente a cargo das empresas operadoras”, adianta.
“O desafio passa, assim, pela resiliência estratégica, financeira e operacional e por repensar medidas do quadro regulatório a nível global, que permitam manter a competitividade das organizações e da economia”, conclui.
Apesar de a subida de preços ter colocado na ordem do dia o tema da energia, as medidas de redução da fatura não são de hoje. “A produção de energia responsável, uma maior autonomia e descarbonização do consumo energético e a escolha de um comercializador que assegure 100% da energia verde nos seus edifícios de norte a sul do país são algumas das medidas que a Altice Portugal tem vindo a implementar ao longo dos últimos anos”, refere fonte oficial da operadora.
Implementação de soluções de aquecimento, ventilação, ar condicionado e iluminação mais eficientes; remoção de equipamento de rede obsoleto; dotação dos sites da rede móvel de infraestruturas energéticas com maior eficiência, permitindo desativar equipamentos de ar condicionado são algumas das medidas listadas pela empresa. E com resultados: “permitiram reduzir a intensidade energética, que foi de 119 GJ/PB, menos 37% que em 2020.”
Edifícios ‘verdes’
“Os edifícios da Altice são também orientados para uma gestão eficiente de energia. O Data Center da Covilhã destaca-se nesta vertente sendo alimentado 100% por energia proveniente de fontes renováveis através de um parque fotovoltaico instalado no local. O rácio de Eficiência de Utilização Energética (PUE) é de 1.25, considerado muito eficiente, com uma certificação pelo Uptime Institute como Tier III e Leed Platinum (Leadership in Energy and Environmental Design)”, refere fonte oficial da companhia.
Com o inverno à porta a Airbus Global Business Services (GBS) está a fazer o seu trabalho de casa. “Estamos a preparar planos e cenários que poderão permitir à Airbus operar com menos energia neste inverno, à medida que se mitiga o impacto nos nossos clientes, colaboradores e nas operações da empresa a nível mundial”, adianta Charles Huguet, managing director da Airbus GBS, à Pessoas.
“Estes planos estão a ser elaborados enquanto falamos. Serão discutidos com as autoridades governamentais e parceiros sociais nos países onde operamos, por forma a garantir que são compatíveis com os planos e necessidades nacionais. Estas medidas virão como adicionais às que já lançámos para reduzir o nosso impacto ecológico e uso de energia nos nossos espaços industriais”, reforça o gestor.
Estamos a preparar planos e cenários que poderão permitir à Airbus operar com menos energia neste inverno, à medida que se mitiga o impacto nos nossos clientes, colaboradores e nas operações da empresa a nível mundial.
O hub de serviços da Airbus abriu em setembro um escritório satélite em Coimbra e, em Lisboa, prepara-se para mudar para um novo “edifício sustentável com a certificação LEED Gold, o que significa um baixo consumo de energia, com características como gestão de luminosidade com detetores automáticos ou um sistema de ar condicionado sustentável”, descreve Huguet. “Estamos focados em ter medidas sustentáveis similares no nosso escritório em Coimbra”, garante.
Na Olympus Portugal a subida dos preços de energia “até ao momento” tem tido um “impacto reduzido” na atividade da empresa que, em setembro inaugurou novas instalações em Coimbra, onde investiram mais de 30 milhões de euros. O motivo é simples: “Estabelecemos condições de fornecimento a preços mais competitivos antes desta escalada de preços”, adianta Joaquim Nunes, general manager Olympus Portugal.
Mas não só. “A empresa está a investir dois milhões de euros em painéis fotovoltaicos como solução de produção de energia para o autoconsumo e toda a unidade foi construída de forma a obter um edifício com um bom desempenho energético, monitorizado através de sistemas automáticos de controlo”, diz.
“A equipa de engenharia, em conjunto com outros departamentos, está a desenvolver processos de otimização da atividade com impacto direto na redução do custo da fatura de energia“, diz, estando a empresa ainda a promover “ações de sensibilização para o envolvimento de todos os colaboradores em iniciativas para a redução do consumo energético.”
Investir na energia solar
O caminho da transição energética “já começou há muito tempo” na Tabaqueira, garante o diretor geral da companhia, Marcelo Nico, à Pessoas.
Desde a privatização, em 1997, que a Philip Morris International (PMI) já investiu cerca de 390 milhões de euros na operação portuguesa, com vista à modernização industrial, com enfoque na melhoria da produtividade e na eficiência energética.
De 2010 a 2021, fruto dos investimentos realizados, o consumo de energia da fábrica da Tabaqueira sofreu uma redução de 44% e de água em 42%, tendo sido valorizados energeticamente mais de 99% dos resíduos gerados pela sua atividade.
Atualmente, “100% da energia elétrica consumida pela unidade fabril têm origem em fontes renováveis”, tendo permitido à empresa, nos últimos 11 anos, reduzir a pegada carbónica em 74% e alcançar a certificação PAS 2060 de neutralidade carbónica. “Nos últimos quatro anos, conseguimos reduzir em cerca de 20% o rácio de consumo energético por unidade de produção”, adianta Marcelo Nico.
Em setembro, a companhia inaugurou um parque fotovoltaico. “Este parque tem perto de 2.600 painéis fotovoltaicos, que ocupam uma área de 5.525m2, e uma capacidade produtiva que garante a integração de quase 10% de energia elétrica para autoconsumo da fábrica e contribui para a redução de emissões de CO2 em mais de 800 toneladas por ano. Este investimento integra o Programa Energético e Ambiental da Tabaqueira, lançado em 2020 e no qual já investimos cerca de sete milhões de euros”, adianta o diretor geral.
No ano passado, a companhia levou a cabo um processo de otimização do processamento primário do tabaco, através do redimensionamento da linha de produção e implementação de novas tecnologias, que levou à diminuição dos seus consumos energéticos, e à redução das suas emissões de CO2 em mais de 400 toneladas.
Já, em 2020, a sede da Tabaqueira, em Albarraque, foi remodelada para “melhor acomodar o crescente número de trabalhadores”, tendo sido feito investimentos “na melhoria da eficiência energética do edifício”. Paralelamente, “instalámos 40 pontos de carregamento elétrico para que possamos cumprir o nosso objetivo de transitar toda a frota automóvel para veículos híbridos ou elétricos, até 2024”, enumera o diretor geral da companhia.
Desenvolvemos também planos de contingência para assegurar a capacidade de resposta em situações de eventual disrupção na distribuição de gás natural.
Até 2025, o Grupo PMI “compromete-se a alcançar a neutralidade carbónica nas suas operações diretas, incluindo em Portugal, e até 2040, em toda a cadeia de valor do grupo.”
Apesar disso, a empresa não está alheia ao atual contexto de crise energética. “Desenvolvemos também planos de contingência para assegurar a capacidade de resposta em situações de eventual disrupção na distribuição de gás natural”, diz.
Modelo híbrido reduz 20% quilómetros percorridos em deslocações
Mudanças que passaram, igualmente, pela organização do trabalho. “Mais recentemente, adotámos o modelo híbrido de trabalho, através da implementação do programa Smart Work, que permite que todos os trabalhadores, cujas funções assim o permitam, optem voluntariamente pelo trabalho remoto três dias por semana (sendo que a empresa compensa os trabalhadores pelos possíveis aumentos do consumo de energia nas suas casas)”, destaca Marcelo Nico.
“Este modelo de trabalho evita, naturalmente, um elevado número de deslocações e consequentes emissões de CO2, tendo a implementação deste programa levado a uma redução superior a 20% no número de quilómetros percorridos, quando comparamos este ano com 2019″, precisa.
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