Exclusivo Presidente da Agência Nacional de Inovação demite-se por falta de apoio político
Joana Mendonça, que assumiu o cargo em maio de 2021, está de saída da Agência Nacional de Inovação, em rutura com os ministérios da Ciência e da Economia. Leia a carta de renúncia na íntegra.
Há mais uma demissão de um alto dirigente do Estado que tem funções de gestão na aplicação do PRR e dos fundos comunitários: A presidente da Agência Nacional de Inovação (ANI) apresentou a sua demissão esta segunda-feira. Joana Mendonça assumiu a liderança da ANI em maio de 2021, para um mandato de três anos, mas acaba por sair ao fim de pouco mais de ano e meio em funções, com uma carta de renúncia em que assume não ter o apoio exigido dos ministérios da Ciência, tutelado por Elvira Fortunato, e da Economia, de António Costa Silva.
“Não tenho até ao momento, e passado mais de um mês, resposta ao meu pedido de aprovação da proposta para o Plano de Atividades em Orçamento da ANI para 2023, já devidamente aprovado em Assembleia Geral e com o devido parecer favorável do Conselho Consultivo da ANI e sem o qual a ANI não pode desenvolver as suas atividades de forma regular. Em particular, a solicitação de uma reunião de trabalho com a Sra. Ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior [Elvira Fortunato] não teve qualquer resposta até ao momento“, escreve Joana Mendonça na carta a que o ECO teve acesso. Naquele conselho geral estão nomes como os de Guy Villax e Isabel Furtado, entre outros.
Joana Mendonça recorda que, aquando das mudanças de tutela, pôs o seu cargo à disposição dos decisores políticos, mas foi-lhe reafirmada a confiança para se manter em funções. “As razões que me levam a considerar não estarem reunidas as condições para o exercício do cargo prendem-se com uma crescente dificuldade de receber orientações da tutela, designadamente em matérias de crucial importância para a Agência”, detalha a professora do Técnico.
São várias as criticas de Joana Mendonça nesta carta de renúncia aos ministérios que tutelam a ANI e aos ministros a quem envia o pedido formal de demissão, que pede para ser efetivado até 31 de março. A presidente demissionária da ANI aponta pontos particularmente sensíveis:
- “Acompanhamento das “Agendas Mobilizadoras para a Inovação”, PRR: Como é do conhecimento de V. Exas, formulei e enviei uma proposta sobre o modelo de acompanhamento das “agendas mobilizadoras para a Inovação”, em curso no âmbito do PRR, ao qual nunca obtive qualquer resposta, não sabendo até hoje se existe já um modelo de acompanhamento e qual será o papel da ANI nesse processo”.
- “Acompanhamento da “Missão Interface”, PRR: Enviei várias propostas de dinamização das ações em curso no âmbito da “Missão interface” do PRR, designadamente de acompanhamento e promoção das atividades dos Laboratórios Colaborativos (“Colab”) e dos Centros Tecnologia e Inovação (“CTI”), às quais nunca obtive resposta”.
- “PT 2030: Não tenho até ao momento qualquer indicação nem orientação de V. Exas quanto ao papel da ANI na execução e implementação do Programa PT2030, nem sobre os instrumentos que irão ser desenvolvidos”.
- “SIFIDE: Não tive qualquer contacto com os gabinetes de V. Exas no âmbito das alterações propostas à lei do SIFIDE e atual discussão no parlamento, apesar de todo o trabalho e acompanhamento que a ANI tem concretizado desde a criação do ANI, como principal agente promotor do sistema de incentivos fiscais à atividade de i&D empresarial”.
A propósito deste último ponto, refira-se que a Inspeção Geral de Finanças (IGF) foi particularmente severa com o desempenho da ANI. “O controlo realizado pela ANI evidencia várias insuficiências”, lê-se na auditoria da IGF ao sistema de incentivos fiscais em investigação e desenvolvimento empresarial (Sifide). A IGF aponta uma “ausência de estratégia de análise de risco, inexistência de procedimentos de controlo da execução dos projetos de I&D, não realização de auditorias tecnológicas desde 2015, desatualização do manual de aprovação de candidaturas, ausência de manual relativo ao processo de reconhecimento da idoneidade para a prática de atividades de I&D e insuficiente fundamentação da elegibilidade das despesas”.
Na carta de renúncia, Joana Mendonça assinala o que considera serem os pontos positivos de funcionamento da ANI desde que assumiu funções, nomeadamente o “cumprimento da meta PT2020 e por dois anos consecutivos, com introdução de processos de simplificação e desenvolvimento de novos sistemas informáticos” e o “aumento significativo da relação e colaboração com stakeholders externos, nomeadamente, associações como a Cotec, que se refletiu materialmente em projetos de colaboração, realização de ações em diversas regiões, e visitas a empresas e instituições”.
Professora Associada de Gestão e Inovação do Instituto Superior Técnico, Joana Mendonça foi a primeira mulher presidente da ANI, organismo que faz a ligação entre empresas, a academia e centros tecnológicos.
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