Comprar casa em Lisboa exige entrada de 50% do valor da escritura
Se há um ano bastava avançar com 20% do capital para comprar casa na capital, hoje esse esforço mais do que duplicou, sendo necessário dar como entrada, em média, 186 mil euros.
A subida das taxas de juro e as medidas macroprudenciais do Banco de Portugal para a concessão de crédito à habitação estão a provocar um esforço financeiro brutal no orçamento das famílias que hoje querem comprar casa na capital.
De acordo com dados do Confidencial Imobiliário, uma casa com 90 metros quadrados na capital (área média dos imóveis em Lisboa, segundo o Censos 2021) custava, em média, 375.480 euros no ano passado (cerca de 4.172 euros por metro quadrado).
Se há um ano uma família que ganhasse 2.514 euros líquidos por mês* podia financiar-se até 80% do valor do imóvel junto da banca (rácio de financiamento máximo que os bancos estão a praticar) para comprar uma casa em Lisboa, ficando a pagar uma prestação de 730 euros – considerando um empréstimo a 40 anos indexado à Euribor a 12 meses com um spread de 1,14% (spread médio dos novos créditos à habitação) – hoje só consegue que a banca lhe financie até 50%.
Significa que hoje, para comprar a mesma casa em Lisboa, teria agora de avançar com um sinal de 186 mil euros, cerca de 2,5 vezes mais que os 75 mil euros exigidos em fevereiro de 2022, e desde que não tivesse mais nenhum crédito bancário e o banco estivesse disposto a conceder o crédito com uma taxa de esforço de 42%.
Isto acontece não porque a banca esteja a dificultar o acesso ao crédito à habitação, mas como consequência da subida das taxas de juro e da aplicação das regras definidas pelo Banco de Portugal na concessão de créditos bancários a partir de 1 de julho de 2018 que, entre outras situações, exige que:
- O rácio entre o montante das prestações mensais de todos os empréstimos e o rendimento líquido dos mutuários do crédito (DSTI – debt service-to-income) não ultrapasse os 50%;
- Para efeitos do cálculo DSTI seja considerado um agravamento de três pontos percentuais ao indexante de referência dos empréstimos a mais de dez anos.
Considerando que a taxa Euribor a 12 meses média em janeiro foi de 3,446%, o “teste de stress” que a banca sujeitará a carteira das famílias que pretendam comprar hoje casa nova recorrendo a um crédito à habitação à taxa variável é, na verdade, de 6,446% – acrescida do spread contratado. Essa realidade reduz em muito a capacidade de endividamento das famílias.
“Como a DSTI tem como base o stress da taxa em três pontos percentuais, neste momento é mais difícil aceder a crédito, pois estamos a stressar a mais de 6%“, refere Hugo Pinheiro, CEO da Credível, uma empresa de intermediação de crédito que trabalha com uma dúzia de bancos.
A solução é procurar casas mais pequenas ou sair de Lisboa
Os dados do Banco de Portugal revelam que o crédito à habitação abrandou no segundo semestre do ano passado, mas registou um crescimento de 3,6% face a 2021, mostrando que os bancos continuam a financiar as famílias para comprar casa.
“Não é a oferta dos bancos que está mais restritiva do que no passado”, refere Dina Raimundo, diretora-geral da empresa de intermediação de crédito Twinkloo, sublinhando até que alguns bancos têm vindo a rever em baixa os spreads praticados. “O que assistimos é a uma redução do lado da procura porque, para além da inflação, as famílias têm hoje uma capacidade de endividamento mais baixa do que acontecia há um ano”, conclui.
Isto leva a que muitas famílias desistam de comprar casa ou se vejam obrigadas a procurar por imóveis mais pequenos ou em localidades onde o preço do metro quadrado é mais baixo, por forma a encaixarem a sua capacidade financeira nas normas instituídas pelo Banco de Portugal.
“Os critérios têm de ser cumpridos e a avaliação da taxa de esforço é determinante, até para que possamos evitar problemas futuros”, salienta Cláudio Santos, CCO da empresa de intermediação de crédito Doutor Finanças.
Em Lisboa, o travão colocado pelo Banco de Portugal na concessão de crédito bancário é de tal ordem relevante que, caso não houvesse barreiras à concessão de crédito para a compra de casa, o orçamento de muitas famílias era praticamente consumido pela prestação da casa:
- Atualmente, um crédito à habitação máximo de 300 mil euros necessário para a aquisição de uma habitação média em Lisboa traduz-se numa prestação de 1.367 euros. Considerando os rendimentos médios de um agregado familiar residente na capital (os mais elevados do país), a prestação do crédito à habitação consumiria de 67% dos rendimentos, duas vezes mais que a taxa máxima recomendada, e um DSTI de 79%.
* Rendimento médio mensal líquido de um agregado familiar a viver em Lisboa em 2022. Este valor tem em conta o Rendimento bruto declarado médio por agregado fiscal em 2020 em Lisboa atualizado com os aumentos salariais líquidos em 2021 e 2022.
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