Inspetores da PJ em greve contra pagamento “indigno” das horas extra
É mais uma paralisação no setor da justiça. Os inspetores da Polícia Judiciária começaram este sábado um protesto e vão fazer greve ao trabalho suplementar por tempo indeterminado.
Mais uma greve marcada para o setor da justiça. A partir deste sábado, dia 1 de abril, os inspetores da Polícia Judiciária (PJ) vão começar o seu protesto e fazer greve ao trabalho suplementar por tempo indeterminado. Esta greve vai afetar o trabalho das unidades de prevenção e todo o trabalho prestado fora do horário normal, ou seja, entre as 12h30 e as 14h00 e entre as 17h30 e as 9h00.
Os profissionais da PJ queixam-se da falta de regulamentação do estatuto profissional das carreiras especiais, que está em atrasado desde julho de 2020, a falta de recursos humanos e materiais e a não atualização pela tutela do referencial dos valores dos suplementos de piquete e prevenção.
A Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da Polícia Judiciária (ASFIC/PJ) explicou que, em algumas situações, um inspetor recebe num serviço de piquete ao fim de semana um valor abaixo da remuneração mínima garantida, ou seja, num “valor ilíquido e indigno de 3,61 euros” por hora de trabalho.
Entre as reivindicações, a ASFIC/PJ sublinha a recusa de autorização da passagem à disponibilidade quando um trabalhador atinja os 55 anos de idade e os 36 anos de serviço, e critica a ausência de avanço efetivo nas negociações com o Ministério da Justiça e com a Direção Nacional da PJ.
A PJ é um organismo que está integrado no Ministério da Justiça e apoia as autoridades judiciárias no combate à criminalidade. Ou seja, este órgão deteta e investiga crimes, identifica os seus autores e recolhe provas que confirmem os crimes. Na sua missão, a PJ utiliza um conjunto de conhecimentos técnicos e científicos especializados.
A lista de crimes investigados pela PJ contempla os crimes de terrorismo e o seu financiamento, branqueamento de capitais, corrupção, cibercrime, tráficos e as falsificações, crime organizado, homicídio e crimes sexuais.
Mais 1.100 funcionários até 2026
Segundo os últimos dados da Direção-Geral da Política de Justiça do Ministério da Justiça, em 2021 existiam menos de 1.000 profissionais na Polícia Judiciária, em concreto 929. Um número mais elevado do que os anos anteriores mas ainda assim inferior ao registado na década de 90 e inícios dos anos 2000. Desde 1993 que o número mais elevado de profissionais foi de 1.084 em 2000.
Em agosto de 2022, o diretor nacional da PJ, Luís Neves, avançou que querem alcançar um quadro de 1.800 inspetores nos próximos dois anos, no âmbito de um plano de reforço negociado com o Governo.
“A proposta que a PJ tem é daqui a um par de anos podermos chegar aos 1.800 inspetores e estamos muito legitimamente expectantes, positivamente expectantes, que esse plano há de ir ao encontro desse nosso desejo”, disse o diretor da PJ.
Um mês depois, em setembro de 2022, o primeiro-ministro António Costa anunciou que até 2026 vão entrar na PJ mais 1.100 funcionários. O objetivo é reforçar as carreiras especial de segurança, de inspeção e investigação criminal, de especialista de polícia científica.
Segundo o primeiro-ministro, até 2026, na carreira de inspeção e investigação criminal entrarão mais 750 efetivos, na carreira de especialista de polícia científica serão mais 250 efetivos e na carreira especial de segurança mais 100 efetivos.
“É fundamental continuar a investir na segurança interna e, designadamente, na Polícia Judiciária“, disse na altura António Costa, acrescentando que “este investimento são ferramentas legislativas, são melhorias de instalações, são melhores meios para perícias, para o laboratório e nos sistemas de investigação”.
Em outubro de 2022, quando foi apresentada a proposta de Orçamento de Estado para 2023, Catarina Sarmento e Castro, ministra da Justiça, salientou que o mesmo era “reforçado” e que permitia um “forte” investimento na PJ.
Catarina Sarmento e Castro referiu também que “tudo fará” para prover as necessidades dos organismos que todos os dias fazem chegar a Justiça, através de vários rostos e de várias valências, aos cidadãos.
SEF quer igualdade salarial com PJ
Foi em novembro de 2021 que foi aprovada na Assembleia da República a reestruturação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). Assim, os trabalhadores do SEF foram transferidos para a Polícia Judiciária, para o Instituto de Registos e Notariado e para a futura Agência Portuguesa para as Migrações e Asilo. Com estas mudanças, novas reivindicações surgiram.
O sindicato dos inspetores do SEF considerou a passagem destes profissionais para a PJ deve respeitar o princípio “trabalho igual, salário igual”. “Não faz nenhum sentido que, quando os atuais inspetores do SEF integrarem a carreira especial de investigação criminal da PJ, passe a haver inspetores com menos anos na carreira a ganhar mais do que outros que têm mais anos de serviço”, disse o presidente do Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização do SEF (SCIF/SEF) Acácio Pereira.
O Governo já publicou o projeto de decreto-lei que regula a transferência dos trabalhadores do SEF e o sindicato dos inspetores considera que este diploma não garante o princípio “trabalho igual, salário igual”, sendo uma “linha vermelha” que tem de ser respeitada e da qual o sindicato “fará ponto de honra nas negociações com Governo” que vão decorrer a partir de agora.
A carreira de investigação e fiscalização do SEF integra atualmente cerca de 900 inspetores em efetividade de funções e perto de uma centena em situação de disponibilidade (aposentação). Os trabalhadores das carreiras gerais e de informática deverão ser distribuídos entre o IRN e a APMA.
A reestruturação do SEF vai permitir que os inspetores permaneçam até dois anos nos postos de fronteira aérea e marítima, os quais vão passar para a responsabilidade da PSP e GNR. O Ministério da Administração Interna (MAI) já explicou que os inspetores do SEF, apesar de serem transferidos para a PJ, vão continuar a desempenhar funções nos postos de fronteira aérea e marítima ao abrigo de um regime de afetação funcional transitório.
Segundo o MAI, estes inspetores vão continuar a dar formação aos elementos da GNR e da PSP em controlo de fronteiras e terão direito à remuneração de origem e à contagem do tempo de serviço prestado nesse regime de afetação.
Onda de greves afeta Justiça
Para além da greve dos inspetores da PJ que se inicia este sábado, o setor da justiça tem sido fortemente afetado por outras duas greves: do Sindicato dos Oficiais de Justiça (SOJ) e o Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ).
Os funcionários judiciais estão a reivindicar o pagamento do suplemento remuneratório em 14 meses, tal como chegou a constar em dois Orçamentos do Estado, e a questão da regular progressão na carreira, com acesso às categorias superiores, mesmo que de uma forma faseada.
A greve dos funcionários judiciais já provocou o adiamento de mais de 21 mil diligências (21.370) e julgamentos e serviços do Ministério Público desde o seu início em 15 de fevereiro, estando previsto decorrer até 16 de abril. Segundo um levantamento da agência Lusa junto das 23 comarcas existentes em Portugal, é na comarca do Porto em que a greve mais teve impacto com 4.184 diligências adiadas entre 15 de fevereiro e 17 de março, cerca de 20% do total nacional.
Já os oficiais de justiça, em greve desde 15 de fevereiro, lutam pela “dramática” falta de funcionários, pelo congelamento injustificado de promoções, exigindo do Governo o cumprimento dos compromissos assumidos, bem como os determinados em Lei do Orçamento de Estado.
Entre os pontos está a inclusão no vencimento do suplemento de recuperação processual, com efeitos a 1 de janeiro de 2021, ou seja, o pagamento do valor mensal nas 14 prestações anuais; a abertura de procedimento para promoção e acesso a todas as categorias cujos lugares se encontrem vagos: escrivão e técnico de justiça adjunto, escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça; e a abertura de ingresso para a carreira de Oficial de Justiça.
Cerca de 15 mil audiências e diligências foram adiadas devido à greve do Sindicato dos Funcionários Judiciais.
Em declarações, a ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, apelou ao fim das greves no setor. Admitiu um impacto “inegável” da greve no funcionamento dos tribunais e acusou o sindicato de manter a paralisação “por teimosia” e de estar a “arrasar a Justiça”.
“Temos dois sindicatos diferentes: o SOJ, que está a fazer uma greve clássica, e depois uma diferente forma de luta do SFJ, que, essa sim, tem, de facto, causado esta perturbação na justiça”, reconheceu.
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