Galamba, o adjunto, as notas e o silêncio de Costa
Um ministro a responder a um adjunto que tinha exonerado dois dias antes. João Galamba e Frederico Pinho trocam acusações por causa de notas de reuniões secretas. E Costa continua em silêncio
A TAP, definitivamente, tem veneno para os governantes que lhe tocam. Depois da demissão de Pedro Nuno Santos e do secretário de Estado Hugo Mendes, da pressão política sobre Fernando Medina, é agora o ministro das Infraestruturas sob fogo cruzado e ainda sem se perceber se vai resistir a uma história com um fim, no mínimo, rocambolesco e que envolve demissões, agressões, o SIS e trocas de comunicados. O ministro está agora, mais do que nunca, nas mãos do primeiro-ministro António Costa, que continua em silêncio.
A história começa, verdadeiramente, no dia 16 de janeiro, quando João Galamba tem uma reunião com a CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, só agora conhecida, e que decorre no dia anterior à reunião do deputado socialista Carlos Pereira com a gestora francesa e adjuntos do ministério das Infraestruturas para prepararem a audição parlamentar do dia seguinte. Foram os documentos enviados para a Comissão Parlamentar de Inquérito sob segredo e que acabaram a ser revelados pela CNN e SIC Notícias, com a confirmação de que o adjunto Frederico Pinheiro tinha perguntado a João Galamba se a gestora francesa poderia participar na reunião com o deputado socialista, coisa que o ministro aprovou. E soube-se depois que o adjunto tinha escrito as perguntas e respostas para a audição parlamentar (que antecedeu o início da Comissão Parlamentar de Inquérito) para Christine Ourmières-Widener prestar contas sobre o despedimento da então administradora Alexandra Reis.
O que se seguiu foi, no mínimo, alucinante, e nunca visto (talvez apenas no verão quente de 75). O ministério divulga na sexta feira de manhã que o adjunto Frederico Pinheiro — antigo jornalista e militante bloquista que já estava com Pedro Nuno Santos — tinha sido exonerado na quarta-feira. Estranho, porque a explicação para a demissão assentou na existência de falhas graves do adjunto. Mas faltava saber que falhas. A alegada invasão do Ministério por parte de Frederico Pinheiro já depois de ter sido exonerado, justificado pelo próprio para levantar bens pessoais e um computador, alegadas agressões entre membros do gabinete, a chamada da PSP e do próprio SIS para recuperar o referido computador são episódios graves que têm um quadro de fundo. O adjunto demitido afirma que o ministro queria mentir à Comissão de Inquérito sobre a existência de notas escritas por si das reuniões e que foram pedidas pela comissão de inquérito, o ministro garante que o adjunto estava a esconder as notas e recusava-se a entregá-las. Tudo conhecido em trocas de comunicados ao longo da tarde de sexta-feira.
No comunicado de Frederico Pinheiro, o ex-adjunto revela que João Galamba reuniu com a ex-CEO da TAP um dia antes da reunião com o PS e que foi o próprio ministro a informar Christine Ourmières-Widener que no dia seguinte, a 17 de janeiro, o PS iria realizar “uma reunião preparatória da audição parlamentar entre o GPPS e o Ministério das Infraestruturas”. Nessa reunião estavam ainda presentes o ex-adjunto e Manuela Simões, diretora do departamento jurídico da TAP.
Frederico, Parece que agora há notas da reunião que quando reunimos não tinhas. Manda as notas para mim e para a Cátia com a máxima urgência sff. Obrigada.
O adjunto exonerado “indica ter tomado notas da reunião, que registou no computador” que “partilhou oralmente” e que apontavam que “naquela reunião de 17 de Janeiro tinham sido articuladas perguntas a serem efetuadas pelo GPPS e tinham sido referidas as respostas e a estratégia comunicacional da CEO da TAP”.
Nessa altura, terá sido indicado que, “em caso de requerimento pela Comissão Parlamentar de Inquérito, as notas não seriam partilhadas por serem um documento informal”, escreve agora o ex-adjunto que sublinha que o comunicado divulgado pelo Ministério das Infraestruturas, com data de 6 de Abril, “não teve a concordância” de Frederico Pinheiro.
A resposta de Galamba é exatamente a oposta. O ministro das Infraestruturas “nega categoricamente qualquer acusação de que, por qualquer forma, tenha procurado condicionar ou omitir informação prestada” à comissão parlamentar de inquérito. “Pelo contrário: toda a documentação solicitada pela CPI foi integralmente facultada”, acrescenta o governante. E devolve a acusação. A exoneração do adjunto “decorre do facto de o então adjunto ter repetidamente negado a existência de notas de reunião que eram solicitadas pela CPI, o que poderia ter levado a uma resposta errada à CPI por parte do gabinete” ministerial.
Olá João e Eugénia, boa tarde. Só vi agora o telemóvel. As notas que eu referi ontem à Cátia [adjunta do gabinete que estava a preparar respostas formais à CPI], são as mesmas que referi e li na nossa reunião no gabinete da Eugénia.
O folhetim não termina aqui. O ECO teve acesso a duas mensagens enviadas por João Galamba que, aparentemente, provam a tese do ministro. “Frederico, Parece que agora há notas da reunião que quando reunimos não tinhas. Manda as notas para mim e para a Cátia com a máxima urgência sff. Obrigada”, escreveu Galamba. Mas a CNN revelou agora as respostas a esta mensagem. “Olá João e Eugénia, boa tarde. Só vi agora o telemóvel. As notas que eu referi ontem à Cátia [adjunta do gabinete que estava a preparar respostas formais à CPI], são as mesmas que referi e li na nossa reunião no gabinete da Eugénia”, começa por escrever na mensagem. “Na altura considerámos todos que, sendo algo informal, não seria de relevar. No entanto, depois disso, seguiu um comunicado de imprensa a indicar o meu nome como tendo estado presente na reunião. Como referi então, tal decisão criou a possibilidade de eu ser chamado à CPI [Comissão Parlamentar de Inquérito]. Se tal acontecer, eu terei de referir que tenho essas notas. Dito isto, creio que a decisão de não revelar a existência dessas notas deve ser revista”, pode ler-se na mesma mensagem.
Tudo somado, há factos, como as reuniões prévias à audição parlamentar da CEO e que serviram para preparar a gestora e combinar perguntas e respostas, há notas dessas reuniões, há uma exoneração, uma dúvida — quem queria esconder essas notas e a quem isso interessava — e um silêncio ensurdecedor, o de António Costa, perante o caos político em que está instalado o Governo por causa da TAP.
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