Empresários pedem estabilidade, condições de governabilidade e rejeitam novas eleições

“O que precisamos é que as instituições funcionem e que o foco do Executivo esteja na resolução dos problemas”, dizem os empresários que afastam a realização de novas eleições.

Estabilidade, condições de governabilidade e foco na resolução dos problemas do país. Os empresários ouvidos pelo ECO consideram que não faz sentido avançar para novas eleições, até porque o Executivo, que tem pouco mais de um ano, tem maioria absoluta. Mas há quem já esteja a adiar decisões de investimento à espera de uma definição mais clara destes “jogos florais”.

“Claro que sim. Não tenha dúvida.” É desta forma perentória que o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) responde à questão se há empresas a adiar as suas decisões de investimento perante a instabilidade política que Portugal atravessa. “Estamos num ciclo económico francamente difícil e a política deveria fazer parte da solução”, sublinha Armindo Monteiro. “A estabilidade política não é um bem absoluto, mas deveria ser usada para cumprir os desígnios e a ambição de que a economia precisa”, acrescentou o presidente da CIP.

Bernardo Trindade acrescenta que a maioria que os portugueses deram nas urnas ao Executivo foi precisamente pelo desejo de estabilidade. Mas “toda esta sucessão de acontecimentos causa instabilidade, é um fator de perturbação”, diz o presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP).

A opção do primeiro-ministro em não aceitar a demissão de João Galamba, exigida pelo Chefe de Estado, na sequência da polémica em torno da exoneração de Frederico Pinheiro, adjunto do gabinete do ministro as Infraestruturas, pôs em causa as relações entre Belém e São Bento. Marcelo Rebelo de Sousa deixou claro o mal-estar no comunicado que emitiu posteriormente no qual frisou discordar da decisão de António Costa.

Mas para os empresários ouvidos ECO, esta não é razão para dissolver o Parlamento e convocar eleições antecipadas. “O importante é conseguir condições de governabilidade”, diz Manuel Tarré.

Porque “não faz sentido eleições antecipadas, tendo em conta que o Executivo tem pouco mais de um ano”, acrescenta Miguel Pina Martins, recordando que “nem o líder da oposição pede eleições”. Luís Montenegro, em reação ao “teatro político”, disse que o PSD não pede eleições, mas não as recusa. “Estamos preparados para as vencer”, garante.

O que precisamos é que as instituições funcionem e que o foco do Executivo esteja na resolução dos problemas”, disse ainda o CEO e fundador da Science4You. Sobretudo de problemas estruturais, sublinha por sua vez César Araújo. O presidente da Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e Confeção (Anivec) e CEO da Calvelex considera que “os portugueses não merecem uma crise política”. “Com tanto em jogo, seria uma perda brutal para o país, que dificilmente recuperaria”, disse.

A única voz dissonante, entre os empresários ouvidos pelo ECO, é a de João Miranda. O antigo CEO da Frulact, que agora está dedicado à fruticultura e ao turismo, entre outras áreas de negócio, defende que mais vale partir para eleições antecipadas se o primeiro-ministro se mostrar incapaz de avançar para uma remodelação mais aprofundada tal como o Chefe de Estado tem vindo a pressionar.

“Esta é uma equação difícil de resolver”, reconhece. “Temos um Governo a quem demos uma maioria e o que temos visto são longos meses desastrosos, num momento crítico para o país com a necessidade de execução do Plano de Recuperação e Resiliência e de resposta aos problemas de competitividade que vão surgindo”, caracteriza. Por isso, defende que não se pode permitir a continuidade de uma situação que evidencia problema”. “Pior do que uma má decisão é não haver decisão”, concluiu.

Apesar de garantirem que, no seu caso individual, as decisões de investimento não são condicionadas pela instabilidade política, os empresários ouvidos reconhecem que “tudo o que se passa em Portugal tem impacto nos mercados externos, provocando desconfiança nos compradores”, como frisa César Araújo.

“Se os empresários portugueses já estão habituados a lidar com a imprevisibilidade – embora esta seja de outro nível –, os investidores estrangeiros questionam-se porque haveriam de investir num país com intranquilidade governativa, legislativa e com constantes alterações no enquadramento legal e laboral”, sublinha Armindo Monteiro. O presidente da CIP dá o exemplo da Lei da Habitação, que “não é uma lei cartaz, mas uma lei susto”, porque “assustou os investidores”. “Houve investimentos que afinal acabaram por não se realizar”, lamentou.

Assistimos a experimentalismos políticos num ambiente assético da folha de excel, sem qualquer aderência com a vida real”, acrescentou o novo patrão dos patrões.

Para Bernardo Trindade, a solução passa por aproximar a governação do que é defendido pela opinião pública e com a vida real das pessoas. “A minha responsabilidade não se compadece com irrealismos”, acrescenta o antigo secretário de Estado do Turismo e administrador da PortoBay.

O presidente da Gelpeixe recusa discutir os meandros da decisão do primeiro-ministro, que classifica de “muito hábil com as palavras”. Considera todo o episódio “uma vergonha” e que revela “falta de valores morais, de respeito, bom senso e preparação para lidar com os temas que têm em mãos”. Manuel Tarré considera que António Costa “tem um Governo desgastado”, mas “dificilmente consegue convencer pessoas com qualidade a entrar no Executivo”.

Questionados sobre as principais preocupações, os empresários são unânimes em apontar as incertezas decorrentes da guerra na Ucrânia, o aumento dos custos do financiamento com a subida das taxas de juro para travar a aceleração da inflação que acaba por comprometer o rendimento disponível das famílias, e consequentemente o consumo.

Mas depois há pontos mais específicos de acordo com os setores. Fortunato Frederico, fundador do grupo Kyaia, gostaria que as horas extra não fossem tributadas pelo Estado, porque isso aumentaria o rendimento dos trabalhadores, permitindo que tivessem mais rendimento disponível e aumentando a disponibilidade para fazer as horas necessárias para que as empresas possam entregar as suas encomendas a tempo.

Já Bernardo Trindade assume que a sua preocupação “é a ausência de resposta relativamente à localização do novo aeroporto”. “Portugal não se pode dar ao luxo de recusar slots por incapacidade de resposta perante a elevada procura”, acrescentou, recordando que o turismo tem um peso cada vez mais expressivo no PIB (20%) e que o país beneficia de uma avaliação muito positiva no estrangeiro.

Mas há também empresários que colocam a sua preocupação em questões estruturais como a pirâmide demográfica invertida, a constante dependência de fundos europeus ou o excesso de intervenção do Estado na economia e a mudança das regras do jogo a meio do mesmo.

Em jeito de conclusão, Armindo Monteiro frisa a preocupação dos empresários com os “jogos florais” do Executivo e o custo que têm para o país.

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