PS chumba propostas do PSD para o licenciamento
Socialistas arrancaram a maratona de votações ao Mais Habitação, na especialidade, a chumbar as propostas da oposição para o licenciamento. As restantes medidas apenas serão votadas na próxima semana.
Apesar de o PS e o Governo terem apelado aos partidos para um consenso e diálogo, os socialistas arrancaram a maratona de votações ao pacote Mais Habitação, em sede de especialidade, a chumbar as propostas de alteração apresentadas pela oposição.
Em causa estão as iniciativas de alteração à proposta de lei do Governo que acelera e simplifica os licenciamentos e que permite às autarquias reclassificar solos rústicos para urbanos, desde que os terrenos tenham como finalidade a construção de habitação pública ou a custos controlados, o chamado simplex do licenciamento.
Todas as propostas de alteração do PSD a esta proposta de lei – o primeiro tema do vasto leque de medidas e diplomas do pacote Mais Habitação que foi analisado pelos partidos – foram chumbadas pelo PS, contrariando o sentido de voto dos socialistas, que na generalidade tinham viabilizado as iniciativas dos social-democratas. A Iniciativa Liberal e o Chega concordaram com a maioria das propostas do PSD, sendo que o Bloco de Esquerda e o PCP só vão votar o diploma na votação final global de todo o pacote Mais Habitação, prevista para 19 de julho.
“Fomos surpreendidos e não percebemos porque [foram chumbadas] as nossas propostas, que foram viabilizadas na generalidade e tinham muitas medidas que se aproximam e têm pontos em comum com a proposta do PS”, lamenta ao ECO a deputada Márcia Passos, coordenadora social-democrata para a área da habitação.
Desta forma, em matéria de licenciamento e de reclassificação de solos, apenas seguem em frente no Parlamento as medidas anunciadas e aprovadas pelo Governo em reunião de conselho de ministros — e que mereceram, aliás, o “parecer desfavorável” da Associação Nacional de Municípios.
As restantes propostas do Mais Habitação, como o arrendamento coercivo, as regras para o alojamento local ou o fim dos vistos gold para investimentos em imobiliário, apenas vão ser votadas pelos partidos na próxima quinta-feira, em sede de especialidade.
Reclassificação de solos rústicos
Desde logo, tal como avançou o ECO, a proposta de lei do Governo vai permitir reclassificar edifícios afetos a comércio e serviços para habitação e reclassificar os solos rústicos para urbanos, para que sejam construídas casas do Estado ou a custos controlados, sendo que a propriedade dos terrenos reclassificados será exclusivamente do Estado. Uns dos critérios para a reclassificação dos terrenos é que fiquem situados na contiguidade de solo urbano.
O diploma estipula ainda que as Câmaras só possam recusar a reclassificação de solos rústicos para urbanos em casos fundamentados: “por motivo de ruído, estacionamento, sistema de mobilidade ou garantia de espaços verdes” ou se naqueles terrenos vierem a ser instalados “equipamentos públicos e de lazer”.
Licenciamento exigido apenas para construção de raiz
Além disso, do licenciamento passa a ser necessário apenas para obras de urbanização e loteamento. As obras que “aumentam o número de pisos (sem aumentar a cércea ou fachada) ou as obras de construção em área com operação de loteamento, plano de pormenor ou unidade de execução com desenho urbano” vão passar a estar isentas de licenciamento, sendo necessário apenas uma comunicação prévia.
Além disso, com a proposta do Governo “passa a existir um único momento de notificação ao requerente” e o Pedido de Informação Prévia (PIP), que hoje tem a validade de um ano, passa a ter a duração de dois anos e “desonera, regra geral, o requerente de controlo prévio”. E o não cumprimento dos prazos legais “implica o deferimento tácito da decisão”, lê-se no documento apresentado pelo Governo.
Outra das medidas inscritas no documento prevê que os projetos de construção considerados como Potencial Interesse Nacional (PIN) com um investimento acima de 25 milhões ou financiados por fundos europeus e PRR, podem decorrer “enquanto o parecer não é emitido”. Será ainda criada uma plataforma única de procedimentos urbanísticos para receber, via eletrónica, todos os processos de licenciamento, sem necessidade de deslocações e com zero papel.
No parecer da ANMP, as propostas do Governo estão “alheadas da realidade e, pior, comprometedoras dos avanços conseguidos nos últimos 30 anos em matéria de urbanismo e planeamento”. Isto porque, resultam em “mera facilitação” e “desresponsabilização”, com a eliminação de “importantes competências municipais de controlo urbanístico” e um “retrocesso no que respeita ao controlo da qualidade e segurança do edificado”, com “custos económicos e sociais avultados, de muito difícil, senão impossível, reparação”.
Fim da proibição de cozinhas abertas e bidés
A proposta do Executivo vai ainda revogar as normas procedimentais “redundantes” do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), em vigor desde 1951, de forma a eliminar “exigências excessivas”. É o caso do fim da proibição de construir cozinhas abertas ou as imposições que estão previstas para as casas de banho, onde é obrigatória a instalação de bidés e banheiras.
Por fim, até ao final da legislatura, o Governo quer criar uma plataforma única de licenciamento, desmaterializada, com a obrigatoriedade do BIM (Modelagem de Informação da Construção), “de forma faseada para projetos de maior dimensão”, explicou no briefing do Conselho de Ministros o secretário de Estado da Digitalização e da Modernização Administrativa, Mário Campolargo.
Alteração ao cálculo do apoio às rendas
Além destas medidas, o pacote Mais Habitação inclui outros diplomas que já estão em vigor sem que tenham passado pelo Parlamento. É o caso do apoio extraordinário às rendas para habitação própria e permanente, que está em vigor desde o início deste mês e que o Governo quer agora alterar, através de um despacho do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Félix ou por via de uma proposta de alteração entregue à última hora no Parlamento pelos socialistas.
De acordo com o diploma aprovado por Belém e já em vigor, este subsídio de renda tem um prazo de cinco anos com um valor que flutua entre 20 e 200 euros para ajudar as famílias com taxas de esforço superiores a 35%, e será atribuído aos contratos celebrados até 15 de março de 2023, registados na Autoridade Tributária e Aduaneira. Seriam abrangidas as famílias com rendimentos coletáveis anuais até 38.632 euros (6.º escalão do IRS).
No entanto, para evitar uma despesa de mil milhões de euros no Orçamento do Estado, que previa um custo estimado de 240 milhões com a medida, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Félix, emitiu um despacho interno à AT, a que o Dinheiro Vivo teve acesso, para que em vez do “total do rendimento para determinação da taxa”, que aparece na linha 9 das notas de liquidação do IRS, o apoio às rendas seja calculado tendo em conta o “rendimento bruto”.
Considerando-se um rendimento anual maior para o cálculo da taxa de esforço com rendas de habitação, é pago às famílias um valor menor de apoio extraordinário face ao inicialmente previsto na lei em vigor.
Para sustentar o despacho do governante, o PS, por via do Parlamento, entregou uma norma de alteração à lei mantendo a versão do cálculo de Nuno Félix.
Para já, o Presidente da República recusa comentar a proposta de alteração ao diploma que recebeu a luz verde de Belém, dizendo apenas que aguarda a nova versão da lei para analisar o diploma. “Devo dizer que ainda não conheço o projeto de lei do PS. Vou esperar para ver exatamente o que é que pretende: se é completar a lei anterior, se é alterar a lei anterior, se é corrigir alguns aspetos da aplicação administrativa. Vamos esperar para ver”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa, à saída de uma conferência na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
A oposição já contestou este recuo do Governo, com o presidente do PSD, Luís Montenegro, a apelar mesmo ao Presidente da República para que vete a futura lei que resultar das propostas de alteração do PS no Parlamento.
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