Empresas criticam complexidade e custos elevados no reporte ESG
As exigências de reporte que as empresas enfrentam são cada vez maiores, à medida que vão sendo incluídas matérias de sustentabilidade. Equipas dedicadas implicam custos elevados.
As empresas estão a braços com regras de reporte de sustentabilidade cada vez mais exigentes. O ECO/Capital Verde perguntou a várias empresas portuguesas as implicações das regras mais recentes e a avaliação é unânime: acrescentam complexidade e pressupõem custos “elevados”, sobretudo pela contratação de equipas especializadas.
“O quadro europeu de reporte tem vindo a tornar-se cada vez mais complexo e desafiador para as empresas”, acusa a AEM – Associação de Empresas Emitentes de Valores Cotados em Mercado, que fala em “definições pouco claras, lapsos sistemáticos de articulação entre diplomas, interpretações divergentes, e uma implementação apressada e mal preparada”. Esta entidade acredita mesmo que a regulação tem um “efeito pernicioso de obstáculo à solução dos problemas ambientais reais” e que não configura uma “abordagem realista das necessidades dos mercados”.
Recentemente, a European Round Table for Industry (ERT), que junta os diretores financeiros de mais de 30 empresas, queixou-se de que implementar as novas exigências de reporte europeias era “uma tarefa impossível”, em declarações ao Financial Times. Lançou mesmo um estudo em que concluía que as exigências “são ainda demasiado extensas, granularizadas e complexas, e portanto representam uma sobrecarga significativa” para as empresas, especialmente considerando “o curto período de implementação”. “As conclusões do estudo da ERT são preocupantes e merecem uma reflexão profunda das instituições europeias e nacionais”, considera a Sonae.
Para a Altice, as exigências europeias requerem “muito esforço de adaptação”, e a complexidade na implementação varia consoante o tipo de indústria. A Super Bock refere-se às mesmas exigências como “grandes e transformadoras”, e refere que a preocupação reside na “incerteza ainda existente” e na “necessidade de adquirir conhecimento técnico rápido para iniciar o estudo e planeamento” que permita cumprir com as obrigações.
A proliferação de regulamentação europeia em matéria de ESG, mesmo se bem intencionada e em alguns casos relevante, é excessiva.
A diretora de Comunicação e Responsabilidade Corporativa da Jerónimo Martins, Sara Miranda, defende que “a proliferação de regulamentação europeia em matéria de ESG, mesmo se bem intencionada e em alguns casos relevante, é excessiva”, especialmente tendo em conta “a sua simultaneidade, a exigência dos prazos para implementação e alguma falta de clareza sobre o âmbito pretendido para o reporte e as metodologias a seguir”.
Sara Miranda realça uma das novas obrigações previstas na diretiva europeia de Reporte Corporativo de Sustentabilidade (CSRD, na sigla em inglês): a divulgação de informação relacionada com as cadeias de abastecimento e a respetiva verificação externa dos indicadores. A Jerónimo Martins acredita que isto “irá conduzir a um aumento do escrutínio a fornecedores de pequena e média dimensão que, em muitos casos, não estão ainda preparados para reportar esta informação”.
Por seu lado, a EDP “está confiante de que vai conseguir cumprir estas novas exigências nos prazos necessários”, mas não deixa de reconhecer que as exigências de reporte europeias pressupõem “um grande esforço de conhecimento dos vários indicadores” e refere que “o desconhecimento das especificidades do padrão europeu obrigatório setorial que está ainda em preparação constitui-se como um desafio adicional”.
Para o BCP, as exigências de reporte não são “tarefa impossível”, mas “requerem planeamento, alocação de recursos e atuações efetivas”. Olhando ao caso dos bancos em particular, a instituição assinala que “existe um desafio adicional”, de considerar o “muito elevado número de clientes” na estimativa da pegada carbónica, e afirma ser difícil obter dados dos diversos stakeholders. “O Millennium BCP está a trabalhar de forma muito intensa de forma a conseguir cumprir os prazos legais fixados”, diz.
O BPI sublinha que “as obrigações de reporte são exigentes”, mas “o grau de exigência não será igual para todas as empresas”, já que empresas de maior dimensão e instituições financeiras “obedecem a um calendário mais apertado e o grau de detalhe é igualmente superior”. Existe, portanto, um “processo de aprendizagem” uma vez que “muitos dos indicadores e métricas (…) não estão disponíveis” e “não estão totalmente uniformizados”.
Os CTT pontuam: “A nova regulamentação de reporte ESG é exigente para todas as empresas. Acreditamos, contudo, que este novo sistema contribuirá para uma maior transparência das empresas e uma maior uniformização das exigências do ESG”.
Investimento elevado. Reporte ESG pede novas capacidades
“Os valores dos investimentos necessários para responder às novas exigências de reporte são elevados, variando em função do processo de preparação e evolução que cada empresa tem vindo a realizar nos últimos anos”, indica a AEM, a qual considera, simultaneamente, que “em qualquer caso, os valores em causa são sempre demasiado elevados”. Isto porque a associação acredita que o reporte, tal como está pensado, não serve adequadamente os destinatários (os investidores) e, por outro lado, o esforço burocrático “retira a atenção dos temas verdadeiramente urgentes da inovação e da resposta à transição ambiental”.
Os próximos meses e anos serão de profunda reconfiguração. Todos terão de aprender uma nova linguagem para fazer negócios.
O grupo Super Bock diz ser “inevitável” um esforço adicional de investimento, de forma a cumprir com as novas obrigações. Fonte oficial do BCP afirma que o valor do investimento “é ainda difícil de estimar”, mas “seguramente é elevado e será crescente ao longo dos próximos anos”. No entanto, o banco considera-o “indispensável”.
Mas que tipo de investimentos são necessários? O BPI fala num “investimento muito significativo” em “aquisição de novas tecnologias, na contratação de consultores e auditores especializados e de equipas específicas para estes projetos”. O BCP indica que “o tema ESG é complexo e transversal, o que implica que sejam convocados recursos muito diversos, que incluem também serviços de consultores especializados”.
Além disto, as empresas e instituições financeiras terão de investir em formação no tema, afirma Rodrigo Tavares, professor catedrático convidado na Nova School of Business and Economics. O mesmo coloca a hipótese de “emergir uma revolução no ofício do contabilista” porque, em muitos casos, serão estes profissionais que assumirão a responsabilidade de reportar dados em sustentabilidade, além dos financeiros. “Os próximos meses e anos serão de profunda reconfiguração. Todos terão de aprender uma nova linguagem para fazer negócios”, defende.
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