Mais de três mil advogados brasileiros vão poder exercer em Portugal
Conselho Geral deliberou que os que já estavam cá a exercer, se mantêm. E os que estavam em processo de inscrição, podem fazê-lo até dia 31 de julho.
O Conselho Geral dos Advogados recuou no limite de data da proibição para advogados brasileiros se inscreverem na Ordem dos Advogados (OA) a partir de 5 de julho. Assim, os que estavam com inscrição já a decorrer mas ainda não concluída, podem fazê-lo até dia 31 de julho. Bem como os que já estavam a exercer em Portugal (mais de três mil advogados) podem continuar a fazê-lo, visto que esta deliberação não tem efeitos retroativos.
A mudança de data limite de inscrição mudou depois de vários advogados brasileiros se terem queixado ao Conselho Regional de Lisboa. No seguimento desta deliberação, os serviços do Conselho Regional de Lisboa (CRL) da OA recusaram o recebimento de todos os pedidos de inscrição de advogados brasileiros que se apresentaram na sede do Conselho Regional de Lisboa.
“Nesse mesmo dia (5 de julho), perante as queixas apresentadas pelos advogados brasileiros, e a fim de evitar incorretas e indesejadas interpretações, entendeu o conselheiro do Conselho Geral, com o pelouro da área, proceder ao envio de dois emails, esclarecendo que os pedidos de inscrição dos advogados brasileiros rececionados naquele dia, deveriam ser rececionados e aceites pelos serviços do CR Lisboa, para posterior agendamento, bem como, todos os agendamentos de pedidos de inscrição, até à data registados na respetiva plataforma, devendo todos eles, sem exceção, ser concretizados até à data limite de 31 de Julho de 2023″, segundo comunicado do Conselho Regional de Lisboa, liderado por João Massano.
Assim sendo, o CRL aceitou todos os pedidos de inscrição, apresentados até ao passado dia 5 de Julho de 2023, todos eles objeto de agendamento anterior.
No dia 3 de julho, o Conselho Geral da Ordem dos Advogados (OA) – liderado pela bastonária Fernanda de Almeida Pinheiro – deliberou, por unanimidade, cessar o regime de reciprocidade atualmente em vigor com a Ordem dos Advogados do Brasil. “Esta tomada de posição não afeta os processos de inscrição de advogados que se encontrem em curso e entra em vigor a partir desta quarta-feira, dia 5 de julho”, segundo comunicado da OA desse dia. Entre os motivos apontados está a diferença na prática jurídica em Portugal e no Brasil e as queixas recebidas.
“Sem embargo do espírito de cooperação e amizade que pontifica as relações entre as duas ordens profissionais, perante a gravidade das questões identificadas e amplamente conhecidas, bem como a especial repercussão social que delas decorre, designadamente, no que se refere à garantia de uma efetiva proteção dos interesses legítimos dos cidadãos de ambos os países, deliberou o Conselho Geral da OA, reunido em sessão plenária do dia 3 de julho de 2023, por unanimidade dos presentes, fazer cessar o regime de reciprocidade de inscrição de advogados atualmente em vigor”, lê-se no site oficial.
O regime de reciprocidade permitia a inscrição na Ordem dos Advogados em Portugal de um advogado brasileiro sem que este tenha de realizar um estágio ou a prova de agregação, e vice-versa.
Atualmente, cerca de 10% dos advogados registados em Portugal são brasileiros. Dados avançados em dezembro de 2022 pela OA mostram que, dos cerca de 34 mil profissionais inscritos na instituição, 3.173 são brasileiros. Desses, quase 60% estão concentrados na região de Lisboa. Um aumento de quase 482%, já que em 2017 eram apenas 536 os advogados brasileiros em Portugal. Em 2019, estavam inscritos 2.270 brasileiros no total.
O acordo que existia até então entre a Ordem dos Advogados do Brasil e a Ordem dos Advogados portugueses favorecia a migração destes profissionais para Portugal, relativamente a outros. A reciprocidade entre Portugal e Brasil passou a constar no estatuto da Ordem dos Advogados Portugueses em dezembro de 2015. Atualmente, existem quase dois mil advogados nascidos em Portugal e que estão a exercer a profissão na Justiça brasileira
“Embora possa ter existido uma matriz de base comum aos ordenamentos jurídicos de ambos os países, constata-se que em Portugal têm sido adotadas opções legislativas muito distintas das que são implementadas no Brasil, até por força da aplicabilidade e transposição para o direito interno português do direito da União Europeia, o que, inevitavelmente, tem contribuído para que ambos os ordenamentos jurídicos se afastem e tenham evoluído em sentidos totalmente diferentes”, referem em comunicado.
Assim, a Ordem dos Advogados portuguesa considerou que as normas jurídicas atualmente em vigor em alguns ramos do Direito num e noutro ordenamento jurídico “já não são sequer equiparáveis”.
A OA sublinha ainda que existem “sérias” e “notórias” dificuldades na adaptação dos advogados brasileiros ao regime jurídico português, à legislação substantiva e processual e às plataformas jurídicas em uso corrente, “o que faz perigar os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos portugueses e, de forma recíproca os dos cidadãos brasileiros”.
“Cumpre ainda salientar que foram recentemente transmitidas à Ordem dos Advogados portuguesa inúmeras queixas relativas à utilização indevida do regime de reciprocidade em vigor, o qual só deverá produzir efeitos no âmbito da inscrição como advogado nas respetivas ordens profissionais e não para a obtenção de registo ou inscrição junto de outras Ordens de Advogados ou Associações Profissionais Equiparadas de outros Estados membros da União Europeia, que não são, nem nunca foram, parte deste acordo”, acrescentaram.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) reagiu e mostrou-se “surpreendida” com a decisão. Em declarações ao jornal “O Globo”, a OAB aponta “discriminação” e “mentalidade colonial” e admite que vai lutar pelos direitos dos brasileiros.
“Estava em curso um processo de diálogo iniciado há vários meses com o objetivo de aperfeiçoar o acordo. A OAB, durante toda a negociação, opôs-se a qualquer mudança que validasse textos imbuídos de discriminação e preconceito contra advogadas e advogados brasileiros. A mentalidade colonial já foi derrotada e só encontra lugar nos livros de história, não mais no dia-a-dia das duas nações”, referiu a OAB.
As conversações entre as instituições decorreram entre o mês fevereiro e o mês de junho de 2023. Apesar de admitir que têm mantido um diálogo aberto com a Ordem brasileira, a Ordem dos Advogados portugueses diz que, segundo informação que foi remetida através de um email no dia 28 de junho de 2023, a OAB afirmou “não dispor de condições para poder proceder às alterações do atual regime de reciprocidade (e que mereceram o acordo de ambas as instituições no passado dia 23 de maio de 2023), nem no imediato, nem dentro de um prazo considerado por este como razoável”.
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