Salário mínimo pagará sempre IRS se não deduzir despesas
Trabalhadores ou pensionistas a ganhar o salário mínimo nacional em 2024 serão tributados em 250 euros, mesmo que o Governo suba o mínimo de existência para aquele nível de rendimento.
Afinal, quem ganhar o ordenado mínimo, em 2024, arrisca mesmo pagar 250 euros de IRS, mesmo que o Governo suba o mínimo de existência – isto é, o patamar até ao qual os rendimentos estão isentos – para o salário mínimo nacional (SMN) do próximo ano, de 810 euros. Este cenário aplica-se a um trabalhador dependente solteiro sem filhos que ganhe o SMN e não consiga deduzir despesas gerais e familiares no valor de 250 euros, revelou ao ECO o fiscalista Luís Leon, da consultora Ilya.
O primeiro-ministro, António Costa, revelou na terça-feira passada, no Parlamento, que, “com grande probabilidade”, o Governo vai “atualizar o mínimo de existência em conformidade com a atualização do salário mínimo”. Declarações que tentaram apaziguar a polémica instalada depois de o Ministério das Finanças ter reiterado que, de facto, o SMN iria passar a ser tributado, em 2024, ainda que, com as deduções de despesa à coleta, “a larguíssima maioria não suportará qualquer imposto”, afirmou ao ECO.
Em causa, está a reforma do mínimo de existência aprovada no Orçamento de Estado para este ano mas que só entra em vigor em 2024. Até agora, este valor, que era assegurado aos contribuintes após a aplicação das taxas do imposto, estava indexado ao salário mínimo, que este ano está nos 760 euros. A partir de janeiro, acaba esta ligação, e aquele referencial passa a ser igual ao maior valor entre 10.640 euros, montante que corresponde a 14 vezes o ordenado mínimo atual, e 1,5 vezes 14 vezes o Indexante dos Apoios Sociais (IAS), que está nos 480,43 euros, o que totaliza 10.089,03 euros.
António Costa ao afirmar que a intenção do Executivo é, contudo, atualizar aquele referencial em função do salário mínimo poderá indicar que a ideia é subir o valor fixo de 10.640 euros para 11.340 euros, o que corresponde a 14 vezes 810 euros, o montante do SMN. Esta quarta-feira, o chefe do Governo reiterou que “não faz sentido” que quem receba o salário mínimo nacional passe a pagar IRS em 2024. Mas a atualização do referencial de isenção não desfaz a reforma do mínimo de existência.
Até 2023, aquele referencial era igual ao salário mínimo. A partir do próximo ano, e mesmo que o limiar seja do mesmo valor da retribuição mínima, a isenção será menor, pela aplicação de uma fórmula mais complexa, explicou ao ECO o fiscalista Luís Leon.
"Só há imposto zero desde que o trabalhador deduza encargos gerais e familiares no valor de 250 euros, caso contrário terá de pagar.”
Ou seja, o salário mínimo só estaria completamente livre de IRS caso o Governo mantivesse o regime em vigor, que indexa o mínimo de existência ao SMN sem qualquer outro tipo de regras ou fórmulas associadas.
No entanto, e tendo em conta o aumento acentuado do salário mínimo que, no final da legislatura, em 2026, vai chegar aos 900 euros mensais brutos, o Executivo começou a fazer as contas ao impacto orçamental da manutenção de tal sistema.
Nos corredores do anterior ministro das Finanças, João Leão, que liderou esta reformulação do mínimo de existência, chegou a falar-se num rombo de 300 milhões de euros por ano, sabe o ECO. Perante esta pesada conta, o Executivo decidiu mexer no mínimo de existência.
O atual Ministério das Finanças, de Fernando Medina, considera que é preferível que todos paguem, ainda que pouco, de forma a poder aliviar um pouco mais o IRS noutros escalões, até porque apenas 42% das declarações entregues em Portugal pagam imposto, segundo os dados mais recentes da Autoridade Tributária referentes de 2021.
Governação de Costa já arrecadou 100,8 mil milhões de euros em IRS
Nos seis anos e meio de governação socialista de António Costa, os cofres do Estado já arrecadaram mais de 100,8 mil milhões de euros em IRS, entre 2016 e junho de 2023, segundo as sínteses da execução orçamental publicadas pela Direção-Geral do Orçamento.
Analisando a evolução anual da receita, verifica-se que, em 2022, as Finanças atingiram um recorde de 15,8 mil milhões de euros em IRS, muito impulsionado pela inflação e pelo crescimento dos salários. No primeiro semestre deste ano, o Estado amealhou 6,4 mil milhões de euros, uma subida de 14,8% face à execução homóloga de 2022, quando a receita deste imposto estava nos 5,6 mil milhões de euros.
Instituições internacionais como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) ou a Direção-Geral de Impostos e União Aduaneira da Comissão Europeia (CE) já alertaram para a pesada carga fiscal sobre os rendimentos, em Portugal. No último relatório anual “Taxing Wages”, publicado em abril pela OCDE, Portugal surge como o 9.º país, do grupo das chamadas economias avançadas, com os impostos mais elevados sobre o trabalho.
O estudo soma, porém, IRS e descontos para a Segurança Social para avaliar a situação nacional. Este indicador mostra que o peso de impostos e contribuições sobre a retribuição de um trabalhador solteiro e sem filhos a ganhar um salário médio subiu de 41,8% para 41,9%, num agravamento de 0,06 pontos percentuais.
O Governo avançou que, este ano, a redução do imposto custou 782 milhões de euros. Para o próximo Orçamento do Estado, Medina já prometeu aliviar o IRS em 524 milhões, através da redução das taxas de IRS, mas não só. O ministro admite reforçar o IRS Jovem e aumentar a dedução das rendas para habitação própria e permanente, que, neste momento, tem um teto de 502 euros. Até 2027, o Governo compromete-se a reduzir a carga fiscal com IRS em mais de dois mil milhões de euros, segundo o Programa de Estabilidade 2023-2027.
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