Quem é Rui Oliveira Neves, o sócio da Morais Leitão detido?
Rui Oliveira Neves, sócio da Morais Leitão, foi um dos arguidos detidos na investigação que levou à demissão de António Costa. Esta não é a primeira vez que o advogado é implicado em casos judiciais.
O dia 4 de novembro, terça-feira, ficou marcado pela demissão inesperada do Chefe do Executivo, António Costa, depois de ao longo da manhã terem sido divulgadas as suspeitas e detenções de Diogo Lacerda Machado, amigo de Costa, e do chefe de gabinete do PM, Vítor Escária.
Mas mais três arguidos foram também detidos: o presidente da câmara de Sines, o socialista Nuno Mascarenhas, o presidente executivo da Start Campus, Afonso Salema e um administrador da mesma empresa, o advogado Rui de Oliveira Neves. O advogado é sócio da Morais Leitão, para onde regressou em 2021, depois de vários anos na Galp, onde foi responsável pela pasta dos Assuntos Jurídicos e Governance.
O advogado esteve ainda envolvido no chamado processo Galpgate. Um processo que acabou por ser suspenso, em 2020, pelo juiz de instrução criminal, com a Justiça a propôr às empresas e governantes envolvidos a possibilidade de não irem a julgamento em troca do pagamento de multas. A Galp Energia foi a mais penalizada, com duas subsidiárias condenadas ao pagamento de 50 mil euros, enquanto os restantes 15 arguidos pagaram quantias entre os 600 e os dez mil euros. A Rui de Oliveira Neves foram pedidos cinco mil euros. O valor total ultrapassou os 125 mil euros, que foram diretamente para os cofres do Estado.
Entre os acusados no processo Galpgate — que consistia no pagamento de viagens a governantes para assistir aos jogos do Euro2016 –, estavam dois ex-secretários de Estado, Fernando Rocha Andrade e Jorge Oliveira, Vítor Escária, e Carlos Costa Pina, administrador da Galp e ex-secretário de Estado do Tesouro do Governo de José Sócrates.
Rui Oliveira Neves foi acusado da alegada prática de um crime de recebimento indevido de vantagem e em regime de co-autoria com José Sequeira Nunes (chefe de gabinete da presidência e de comunicação do Grupo Galp) por ter convidado o então secretário de Estado da Energia para assistir a jogos do Euro 2016. Jorge Seguro Sanches recusou o convite mas do ponto da vista da lei, o crime consuma-se com a realização do convite.
Em novembro de 2021, e depois de mais de oito anos na gestão na GALP, Oliveira Neves regressou à Morais Leitão. O advogado passou a integrar o departamento de Corporate e M&A, onde lidera a área transversal de transformação de negócio (business transformation).
Com o desenrolar dos acontecimentos, o ECO pediu à Morais Leitão uma reação que respondeu, através da fonte oficial: “aguardamos tranquilamente pelo decorrer do processo, colaborando com as autoridades. E foi isso que fizemos durante as buscas, apoiando em tudo”. O advogado responsável pela defesa de Oliveira Neves é o sócio da Morais Leitão, Tiago Félix da Costa.
E em que medida o advogado pode estar implicado nesta teia de alegado tráfico de influência, prevaricação e corrupção (ativa e passiva)?
Diz o mandado de detenção, a que o ECO teve acesso, que os suspeitos Afonso Salema, Rui Oliveira Neves e Diogo Lacerda de Machado “mantiveram contactos com grande frequência com João Galamba, secretário de Estado da Energia até Janeiro de 2022 e ministro das Infraestruturas atualmente, e com Nuno Lacasta, presidente do Conselho Diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente e ainda Duarte Cordeiro, ministro do Ambiente à data, “tendo logrado obter o favor destes em matérias relacionadas com a Start Campus, das quais se destaca a dispensa de aprovação da APA quanto à primeira fase do projeto (NEST) e a emissão da declaração de Impacte Ambiental favorável com condições na segunda fase do projeto (REST)”.
João Galamba e Nuno Lacasta são ambos arguidos mas não foram detidos. Já Duarte Cordeiro não é sequer arguido.
Estão ainda indiciados pelos contactos que mantiveram com o autarca de Sines, Nuno Mascarenhas, ainda no decorrer deste ano de 2023, tendo acordado com o suspeito que este “daria andamento ao projeto com celeridade ou mesmo um andamento favorável em matérias de urbanismo envolvendo a Start Campus, dando em troca vantagens indevidas”.
O dossier do data center da Start Campus inclui suspeitas da prática dos crimes de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político, prevaricação, recebimento indevido de vantagem, prevaricação e tráfico de influência.
O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) denuncia ainda encontros marcados no escritório da Start Campus, em Lisboa ou ainda almoços e jantares privados com um valor elevado. Ou um “valor não despiciendo”, como refere o MP no mandado. Refeições essas pagas pelos donos da Start Campus – Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, para o ministro das Infraestruturas, João Galamba, o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta.
Lacerda Machado usaria a amizade e proximidade com Costa para pressionar outros membros do Governo, com a ajuda de Escária, bem como entidades como o ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas).
Nestes autos das buscas, o DCIAP diz ainda que Galamba terá levado ao Conselho de Ministros pareceres feitos por advogados pagos pela Start Campus, suspeitos de influenciar o conteúdo normativo de atos do Governo, já enquanto Galamba era Secretário de Estado da Energia ou enquanto Ministro das Infra-estruturas.
Ligação aos CMEC
Tal como Observador explicava, numa peça publicada em 2019, a 4 de Abril de 2007 os advogados Rui de Oliveira Neves e Ricardo Andrade Amaro, ambos sócios da Morais Leitão, estiveram numa reunião com João Manso Neto e uma comitiva de cinco diretores da EDP, à data. Numa altura em que se concretizava a legislação para a liberalização do mercado de eletricidade em julho de 2007 e a criação do MIBEL — Mercado Ibérico de Eletricidade.
Daquela reunião saíram decisões fundamentais de regulação da EDP em Portugal. Foi a EDP a elaborar boa parte dos drafts das leis, decretos-lei e portarias sobre a sua atividade, matéria da exclusiva competência do Governo. De seguida, esses textos foram enviados para o Ministério da Economia liderado por Manuel Pinho. Quem redigiu, na prática, esses diplomas foram Rui de Oliveira Neves (contratado pela elétrica) e alguns dos diretores da EDP. Grande parte das versões finais dos diplomas foram escritos pelos Morais Leitão e aprovados pelo Governo de Sócrates.
Perfil de Rui Oliveira Neves
Rui de Oliveira Neves regressou à Morais Leitão como sócio em 2021, com “responsabilidade pela transformação do negócio para disponibilizar, de forma transversal, uma oferta renovada de serviços jurídicos com uma abordagem estratégica e de gestão de risco focada na assessoria de transações, projetos e matérias regulatórias. Acrescenta ainda uma forte ênfase na sustentabilidade, coordenando a área de Sustentabilidade da Sociedade para responder às matérias de ESG e dos direitos humanos”, segundo diz o site do escritório.
Entre 2013 e 2021, foi Diretor de Assuntos Jurídicos e Governance, Secretário-Geral e desempenhou funções de gestão na Galp. Anteriormente, tinha desenvolvido a sua carreira na Morais Leitão durante 14 anos.
Na área de M&A, foi responsável pela condução jurídica de várias transações na Península Ibérica, em diversos setores, nomeadamente, na energia, nas telecomunicações e nos transportes, destacando-se as aquisições de alguns portefólios de ativos renováveis nos Estados Unidos e em Espanha. No mercado de capitais fez a assessoria no IPO de uma das maiores empresas de energias renováveis a nível mundial, na reprivatização da maior empresa de serviços públicos portuguesa, na reprivatização do TSO nacional, em diversas OPAs e em outros processos de IPO e reprivatizações.
O site diz ainda que é um dos advogados ativos na área do direito da energia, com um percurso transversal a todas as áreas do setor, “sendo de salientar a experiência internacional quer ao nível regulatório quer transacional, desde a fileira do petróleo e gás natural, nas vertentes de upstream, midstream e downstream, até à produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e gás natural, assim como nas energias renováveis e novas soluções energéticas, nomeadamente hidrogénio, gases renováveis e baterias”,
É docente convidado da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e da Faculdade de Direito da Universidade Católica.
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