Um pacto para a corrupção que será ambicioso, célere e “idealmente” consensual. O que o Governo quer para a Justiça

A regulamentação do lobbying é uma das prioridades, bem como o enriquecimento ilícito. Uso de inteligência artificial para identificar padrões decisórios suspeitos é outra das medidas.

Nas quase 200 páginas das linhas gerais do XXIV Governo Constitucional de Luís Montenegro, o Executivo tem “uma agenda ambiciosa, célere e idealmente consensual” de medidas anticorrupção. Para isso, a ministra da Justiça, Rita Júdice, terá que criar um diálogo para um pacto nesta matéria, contando com a colaboração de todos os agentes políticos. Expectavelmente, a regulamentação do lobbying é uma das prioridades, bem como a já antiga questão de criminalizar o enriquecimento ilícito. O Executivo pretende também criar um Registo de Transparência, acrescentar a função de um provedor do utente em serviços públicos, agravar as sanções do Regime Geral de Prevenção da Corrupção – apesar de não concretizar de que forma. No que toca ao exercício de funções políticas, o Governo promete alargar o período em que ex-governantes possam voltar ao privado em empresas da área que tutelaram, agravar a pena acessória de proibição do exercício de função pública.

No campo do processo penal, a AD está a pensar a aplicação da suspensão provisória do processo a quem contribuir para a verdade nos processos de corrupção e fixar em 72 horas o prazo máximo para decisão de medidas de coação desde a detenção de um arguido, permitindo ainda que possa ser ouvido por mais do que um juiz de instrução.

Estas são algumas das medidas do Governo:

  • Regulamentar o lobbying, criando um registo obrigatório e público de lobistas e de entidades representadas;
  • Criação de um Registo de Transparência, isto é, uma base de dados que inclua todos os representantes (individuais ou coletivos) de interesses legítimos que pretendam contactar entidades e decisores públicos, incluindo órgãos de soberania, administração pública e reguladores;
  • A criação de um Código de Conduta do Registo de Transparência;
  • A adoção de uma Agenda Pública, que regista e divulga as interações formais ou informais entre os titulares, dirigentes ou representantes das instituições públicas e os representantes de interesses legítimos;
  • A criação de “períodos de cooling off para que quem tenha desempenhado cargos políticos, públicos ou funções em entidades públicas não possa dedicar-se ao exercício da atividade de representante de interesses;
  • Reforma institucional de entidades como o Mecanismo Nacional Anti-Corrupção (MENAC), a Entidade da Transparência e a Entidade das Contas e Financiamento Político.
  • Implementação da Pegada Legislativa do Governo, através da publicação na internet das várias etapas de cada processo legislativo.
  • Instituir o Scoring de Ética e Integridade (SEI) para as entidades públicas, que meça o nível de cumprimento das obrigações previstas no Regime Geral de Prevenção da Corrupção.
  • Alargamento do período de nojo para o exercício de funções em entidades privadas relacionadas com a sua área de atuação (dos ex-políticos).
  • Valorizar como critério de ponderação nos concursos públicos que as entidades privadas concorrentes disponham de certificação dos seus mecanismos de prevenção de corrupção;
  • Criar um provedor do utente em serviços públicos com atendimento ao cidadão e competências para receber denúncias.
  • Alargar normas de prevenção, como códigos de conduta, aos partidos políticos.
  • Adotar programas de inteligência artificial para identificar padrões decisórios suspeitos.
  • Publicação online das decisões judiciais, de todos os tribunais, incluindo os de primeira instância;
  • Criminalizar o enriquecimento ilícito, em respeito pelos preceitos constitucionais, e estabelecendo penas adequadas e proporcionais.
  • Ponderar, como alternativa à criminalização do enriquecimento ilícito, a criação de mecanismos legais, tais como a “Ação Cível para Extinção de Domínio” ou “os unexplained wealth orders“, que consagrem um mecanismo legal que permita ao Estado português recuperar bens adquiridos por particulares através de atividades ilícitas;
  • Reforçar os recursos humanos e tecnológicos disponíveis para a investigação e ação penal relativamente à corrupção e outros crimes no exercício de cargos públicos;
  • Agravar o regime sancionatório previsto no Regime Geral de Prevenção da Corrupção equiparando-o à legislação de prevenção do branqueamento;
  • Agravar a pena acessória de proibição do exercício de função pública;
  • Alargar e robustecer as medidas de direito premial do Código Penal, com vista a favorecer a descoberta da verdade e a obtenção de prova em processos-crime, designadamente prevendo a possibilidade de redução de pena;
  • Ponderar a adaptação dos institutos da suspensão provisória do processo e da atenuação especial da pena para que possam também ser aplicados como medidas de direito premial a quem tenha contribuído decisivamente para a descoberta da verdade;
  • Fixar no Código de Processo Penal o limite máximo de 72 horas para decisão jurisdicional após detenção, permitindo que o primeiro interrogatório judicial seja realizado por mais do que um juiz.

 

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