Exclusivo Governo acaba com “manifestações de interesse” para aceder a autorização de residência
O Governo aprova esta segunda-feira novas regras para imigrantes no país. Cai a "manifestação de interesse" e passa a ser exigido contrato de trabalho a apresentar nos consulados do país de origem.
O Governo vai apresentar esta segunda-feira à tarde o plano para as migrações, depois da aprovação em Conselho de Ministros, e uma das medidas que deverá ser anunciada é o fim da chamada “manifestação de interesse”, um mecanismo obtido junto da Agência para a Inclusão das Migrações e Asilo (AIMA) que, pelo tempo que demora a ter resposta, acaba por ser uma fórmula de legalização automática de imigrantes desde que completem pelo menos 12 meses de descontos para a Segurança Social. O plano deverá ter mais de três dezenas de medidas e incluirá também, neste contexto, a exigência de um contrato de trabalho para os imigrantes que a partir de agora entrem no país, mas esse contrato terá de ser apresentado nos consulados portugueses dos países de origem.
Oficialmente, o Governo não faz comentários e remete anúncios para depois do Conselho de Ministros. A secretaria-geral da Presidência de Conselho de Ministros (PCM) convidou na semana passada mais de 100 entidades e personalidades para a apresentação do “plano de medidas para as migrações” na tarde desta segunda-feira, na Nova SBE, em Carcavelos. Depois de mais uma semana de notícias sobre o avolumar do número de processos pendentes na AIMA, que já ultrapassará o meio milhão, e da possibilidade de saída de mais de 100 funcionários da agência que substituiu o SEF, o Governo vai aprovar o plano no conselho de ministros extraordinário na segunda-feira de manhã e apresentá-lo da parte da tarde. E neste fim de semana, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, já sinalizou o caminho que o Governo quer seguir. Em entrevista ao DN/TSF, afirmou que Portugal precisa “de uma imigração melhor, regulada e, portanto, sim, existirão acertos de regras. Por outro lado, uma política de atração de imigrantes especialmente focado nos qualificados e, por último, uma melhoria do todo o processo de acolhimento e integração para ser mais humano, mais célere e mais eficaz. Atuaremos com este equilíbrio“.
O plano do Governo segmenta na prática a estratégia em duas linhas de ação: Recuperar as pendências de processos que estão na AIMA e mudar as regras para o futuro, para os novos imigrantes. Há a convicção de que os migrantes que estão em Portugal têm de ter um processo de regularização extraordinário, até para evitar que acabem no Tribunal administrativo do Círculo de Lisboa, como alertava, no ECO, a juíza-conselheira Dulce Neto, que preside ao Supremo Tribunal Administrativo. “A situação é francamente a de um erro político profundo do governo anterior, que tem consequências nos fluxos migratórios e criou um limbo indigno em que vivem milhares de pessoas hoje em Portugal. A referência a existirem mais de 400.000 pendências, processos que não estão decididos, pessoas que não têm a sua situação regularizada relativamente à residência por falta de resposta do Estado, por causa dessas regras e por causa do colapso institucional, é muito preocupante. É uma situação indigna e, obviamente, exige do governo respostas novas. Isto tem e vai ser resolvido“, disse o ministro da Presidência na mesma entrevista.
Uma das possibilidades em cima da mesa é aceitar a legalização de todos os imigrantes que estejam em Portugal com contrato de trabalho, mesmo que a sua entrada em território nacional não tenha sido legal. Atualmente, um imigrante pode entrar em Portugal de forma ilegal, por exemplo a partir de outro país europeu, pedir o comprovativo de ‘manifestação de interesse’ junto da AIMA, que mesmo sem contrato confere um guia provisório à espera de decisão final. E se o imigrante tiver pelo menos 12 meses de descontos, passa diretamente à situação de legal. Como referiu Leitão Amaro na entrevista de fim de semana, há uma média de 5000 pedidos por semana e uma capacidade de resposta que poderá andar neste momento abaixo dos 2000.
O que diz a lei?
No artigo 88º relativo Autorização de residência para exercício de atividade profissional subordinada:
Para além dos requisitos gerais estabelecidos no artigo 77º, só é concedida autorização de residência para exercício de atividade profissional subordinada a nacionais de Estados terceiros que tenham contrato de trabalho celebrado nos termos da lei e estejam inscritos na segurança social.
2 — Mediante manifestação de interesse apresentada através do sítio do SEF da AIMA, I. P., na Internet ou diretamente numa das suas delegações regionais, é dispensado o requisito previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 77.º, desde que o cidadão estrangeiro, além das demais condições gerais previstas naquela disposição, preencha as seguintes condições:
a) Possua um contrato de trabalho ou promessa de contrato de trabalho ou tenha uma relação laboral comprovada por sindicato, por representante de comunidades migrantes com assento no Conselho para as Migrações ou pela Autoridade para as Condições do Trabalho;
b) Tenha entrado legalmente em território nacional;
c) Esteja inscrito na segurança social, salvo os casos em que o documento apresentado nos termos da alínea a) seja uma promessa de contrato de trabalho.*
António Leitão Amaro fez questão de detalhar, nesta entrevista, as diferentes condições em que estão os migrantes com processos pendentes na agência das migrações, a entidade que sucedeu ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). “Estamos a falar de todo o ciclo de processos pendentes, que inclui as manifestações de interesse para a primeira autorização de residência, pedidos de reagrupamento familiar, pedidos de vistos, renovação de vistos ou das autorizações de residência, processos dos vistos dos cidadãos da CPLP (Comunidade dos Países e Língua Oficial Portuguesa). As situações dos requerentes de asilo que poderão ficar sob proteção internacional são grupos diferentes“.
Neste sentido, o Governo prepara-se para aprovar uma norma que legaliza todos os imigrantes que tenham contrato de trabalho, mesmo que não tenham os 12 meses de descontos para a Segurança Social. É uma medida que tem preocupações humanitárias e de inclusão, mas também de ordem económica. A AIMA não tem dados finos sobre o número de trabalhadores com contrato de trabalho inferior a 12 meses e a sua expulsão do país poderia ter um efeito económico grave na atividade de milhares de empresas e de setores que têm um peso relevante de imigrantes.
Na entrevista ao DN/TSF, Leitão Amaro fez questão de baixar as expectativas sobre o prazo para ter resultados deste plano. “Este problema não se resolve com uma decisão legislativa sequer. Nem com uma varinha mágica. A regularização de mais de 400.000 pendências vai demorar tempo. O que é que eu tenho a certeza? Uma convicção forte, pelo menos. Que se nada fizermos, se esta situação de grande complexidade nas migrações e na imigração se mantiver, estamos a criar um combustível para a polarização e a radicalização do discurso“.
As migrações, recorde-se, foram um dos temas a marcar a campanha eleitoral destas eleições europeias, que se realizam a 9 de junho, e os partidos estão entre a liberalização total, na extrema-esquerda, e o fecho do acesso ao país, na extrema-direita.
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